Por Guilherme Fiuza, da Época
O Brasil sentiu falta do pronunciamento de Dilma Rousseff no
Dia Internacional da Mulher. Essa era uma das poucas garantias de um governo
que chama sua chefe de presidenta, ou sua presidente de chefa. Agora a
brincadeira acabou. O homem que inventou essa mulher entrou na mira da polícia.
O homem que escrevia o que ela falava foi preso. O mito da mãe coragem foi
construído com dinheiro roubado do contribuinte, apontou a Lava Jato. Sobrou um
fantoche que não fala, uma mulher que tem medo de panela.
Por incrível que pareça, Dilma só não foi mandada embora
para casa ainda por ser uma mulher ungida por um pobre. A Lava Jato está
investigando o enriquecimento desse pobre, mas isso não parece suficiente para
desmontar o presépio. Não é política, é religião. Mesmo que esse pobre
milionário possa ter roubado o povo, boa parte dos fiéis permanece saudando-o
com seus cânticos melancólicos – e eventualmente alugados. Toda igreja monta
sua base financeira, mas essa tesouraria não tem paralelo: seus cofres contêm o
dinheiro de uma nação. Não é fácil desmontar um presépio de pobres coitados que
têm um cheque especial do tamanho da Petrobras.
Por um capricho do destino, a tesouraria da igreja petista
foi parar na cadeia. Primeiro, João Vaccari, o rei mago dos pixulecos, e,
quando parecia que seria só botar novos picaretas no lugar dos presos – como na
queda de Delúbio, Valério e grande elenco mensaleiro –, os financiadores do
credo começaram a cair também. Com a condenação de Marcelo Odebrecht a 19 anos
de prisão, dá para sentenciar: a mulher sapiens está só.
Pendurada na fachada do presépio apodrecido, virtualmente
abandonada até pelo PMDB, a presidente da República se agarra a uma única e
última mão: a do Supremo Tribunal Federal.
Cruel ironia: no momento em que Sergio Moro e a força-tarefa
da Lava Jato – a Operação Mãos Limpas brasileira – elevam a Justiça ao papel de
resistência quase solitária ao massacre populista, a mais alta Corte dessa
Justiça permanece como o bastião de resistência do populismo. Até a Câmara dos
Deputados, que não é flor que se cheire e está sob a presidência de um réu,
permanece permeável ao ir e vir da democracia. Essa instituição legislativa
desacreditada e carcomida deu andamento a um sólido pedido de impeachment
apresentado por respeitáveis juristas – e impecavelmente fundamentado para
apontar os crimes de responsabilidade de Dilma Rousseff nas pedaladas fiscais e
no escândalo do petrolão.
Onde esse pedido republicano e democrático atola? No Supremo
Tribunal Federal.
É de lá que vêm as manobras para barrar a investigação
formal e direta da presidente que foge das panelas, e foi de lá que vieram as
manobras para atropelar o funcionamento democrático da depauperada Câmara dos
Deputados na partida do processo de impeachment. A técnica, quem diria, virou
travesti da política.
Os crimes de responsabilidade cometidos pela presidente são
flagrantes, basta ler a Constituição. Mas, assim como o PT inventou a
contabilidade criativa, o STF inventou a leitura criativa da Constituição. Nos
três meses desde que o pedido de impeachment foi aceito pela Câmara, as
evidências da Lava Jato praticamente dobraram – especialmente quanto à
negligência da presidente da República na responsabilização de seus subalternos
claramente envolvidos no esquema de corrupção. Isso é crime. Mas as revelações
de Delcídio do Amaral não deixam dúvidas: Dilma e seu estado-maior (do qual
Delcídio fazia parte) trabalhavam para usar os Tribunais Superiores na
obstrução das investigações do petrolão.
Quando o filho de Nestor Cerveró gravou o líder do governo
afirmando que conversaria com os ministros do Supremo sobre a liberação do
criminoso, suas excelências mandaram prender o senador com brados em defesa da
justiça contra o crime, “não passarão” etc. Em seguida, livres da berlinda,
meteram o bisturi no Poder Legislativo travando o rito do impeachment.
Até prova em contrário, o Congresso Nacional é mais
confiável que o Supremo Tribunal Federal – justamente por ser muito menos
qualificado. Ou seja: uma tragédia. Mas quem pode tirar o país da tragédia
maior são os parlamentares – se as ruas mandarem. Treze de março, Dia
Internacional da Mulher Sapiens.
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