O vice-governador Francisco Dornelles, 81, ex-ministro,
ex-senador, ex-deputado e presidente de honra do PP, assume interinamente o
governo do Estado do Rio de Janeiro nesta segunda-feira, 28, com a má notícia
de que os recursos para pagamento dos servidores, aposentados e pensionistas
não estão garantidos.
Uma das alternativas em discussão é o parcelamento dos
salários. Alguns secretários defendem que o governo dê prioridade ao pagamento
de servidores de áreas essenciais como segurança, saúde e educação. Integrantes
do governo dizem, no entanto, que todos os esforços ainda serão feitos para
honrar os pagamentos de abril.
A folha de pagamento do Estado é de cerca de R$ 1,5 bilhão,
para 468,5 mil servidores (220,3 mil ativos, 153,4 mil inativos e 94,8 mil
pensionistas). Em março, o pagamento, previsto para o dia 9, foi feito apenas
no dia 11. Desde que assumiu, Pezão adiou a data do pagamento do segundo para o
sétimo e agora para o décimo dia útil de cada mês. Em dezembro de 2015, o
governo dividiu em cinco vezes a segunda parcela do 13º salário. Por causa da
crise econômica, governos como os do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais
parcelaram salários de funcionários públicos.
Dornelles ocupará o governo por pelo menos 30 dias, durante
licença do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), que completa 61 anos nesta
terça-feira, 29, para tratamento de um câncer no sistema linfático.
Especialista em contas públicas, ex-secretário da Receita
Federal e ex-ministro da Fazenda, Dornelles encontrará o Estado em momento dos
mais delicados. O governo enfrenta não só uma grave crise econômica, com queda
de R$ 3,2 bilhões na arrecadação de royalties do petróleo, rombo previdenciário
de R$ 12 bilhões e corte de gastos em áreas cruciais como segurança pública,
mas também política, com grande tensão na relação do Executivo com os deputados
estaduais.
Diferentemente do ano passado, quando Pezão conseguiu a
aprovação de vários projetos de lei para enfrentar a crise, como autorizações
para empréstimos e aumento de tributos, em 2016 os parlamentares, muitos deles
aliados do governador, rejeitaram as propostas de ajuste fiscal que afetam
servidores públicos e interferem no Orçamento do Legislativo e do Judiciário.
Também resistem em autorizar o financiamento de R$ 1 bilhão do BNDES para a
linha 4 do metrô.
Dias antes de Pezão ser internado, Dornelles foi
hospitalizado. A assessoria do Palácio Guanabara informou que Dornelles
internou-se para exames de rotina, está bem de saúde e tem trabalhado
normalmente. O bom trânsito do vice-governador com políticos da situação e da
oposição tem sido lembrado pelos parlamentares como um ponto positivo.
"Dornelles tem respeito e subordinação ao governador, mas não ficará de
braços cruzados esperando o fim da licença. Ele pode aperfeiçoar propostas que
estão no Legislativo. Dornelles tem interlocução com o setor bancário e pode
trabalhar em consensos de maior amplitude", disse o deputado federal Júlio
Lopes (PP-RJ), companheiro de partido do vice-governador.
Uma das críticas dos aliados a Pezão tem sido o fato de não
ter aproveitado a experiência técnica e política do vice. Dornelles costuma
dizer que os vices devem aparecer o menos possível e entrar em ação apenas
quando acionado pelos titulares.
Outra reclamação é que Pezão confiou na proximidade com a
presidente Dilma Rousseff, de quem é um dos principais aliados, para enfrentar
a crise do Estado. No entanto, a situação financeira do Rio se agravou, os
pleitos do Estado na União caminham devagar e a presidente tenta escapar do
impeachment e não consegue.
Na última quinta-feira, quando participou da entrevista em
que seus médicos anunciaram o diagnóstico e o tratamento da doença, Pezão
comemorou as novas regras de pagamento das dívidas de Estados e municípios, que
serão votadas pelo Congresso nos próximos dias.
O presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani,
também presidente do PMDB-RJ, foi um dos porta-vozes da insatisfação dos
aliados com Pezão. Há um mês, criticou o governo estadual, que considerou
"fraco, sem unidade, sem direção". No entanto, desde que Pezão
adoeceu, em 12 de março, o clima é de trégua.
Um dos sintomas de que a crise não arrefece foi que, este
mês, o governo não transferiu para a Assembleia, o Ministério Público Estadual
e o Tribunal de Contas do Estado o chamado duodécimo, repasse feito até o dia
20 de cada mês para gastos administrativos e de custeio. Os presidentes das
instituições decidiram não recorrer imediatamente à Justiça. Ouviram do
secretário de Fazenda, Júlio Bueno, que o Estado vai se esforçar para pagar os
duodécimos esta semana, mas os recursos também não estão garantidos ainda.
"Dei uma endurecida para alertar o governador sobre
erros políticos desnecessários que estavam sendo cometidos. Não podemos aceitar
a falta de rigor nas mensagens enviadas ao Legislativo nem a tentativa de
aprovar projetos pela imprensa. Mas o governo ainda tem muita densidade na
Assembleia. O ambiente é delicado porque a relação com os servidores e os
sindicatos está tensa e isso mexe com o humor dos deputados. Mas o governador
Pezão neste momento tem toda nossa solidariedade", disse Picciani.
No secretariado de Pezão, há grande apreensão com os cortes
no Orçamento. Em audiência pública na Assembleia, o secretário de Segurança,
José Mariano Beltrame, disse que os investimentos no combate à violência são
"praticamente zero". Policiais perderam o Regime Adicional de Serviço
(RAS), benefício para quem fazia hora extra, e a instalação da Unidade de
Polícia Pacificadora (UPP) no Complexo da Maré (zona norte) foi adiada. A
Segurança perdeu R$ 2 bilhões dos R$ 11,6 bilhões previstos para 2016. Em
fevereiro, os números oficiais indicaram aumento de 27,9% dos roubos em relação
ao mesmo período do ano passado e de 23% dos homicídios.
O deputado oposicionista Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB)
elogia o bom trânsito de Dornelles com os políticos, mas cobra medidas
objetivas. Ele propõe que o governo aproveite a exigência legal de saída dos
secretários que serão candidatos nas eleições deste ano, na primeira semana de
abril, para anunciar o fim de secretarias e o enxugamento da máquina estadual.
Também propõe corte de 15% de 9.200 cargos comissionados ocupados por não
servidores (chamados extra-quadros) no Executivo.
"Dornelles é um homem muito experiente, tem bom diálogo
com os deputados. O ambiente de relacionamento é bom, mas o mérito (dos
projetos enviados pelo Executivo) é que tem que ser discutido", afirmou.
A expectativa é que Pezão retome as atividades no início de
maio e concilie o tratamento quimioterápico com as atividades no Palácio
Guanabara, sede administrativa do governo fluminense. Nos três dias
consecutivos de quimioterapia, o governador deverá se ausentar do palácio. Nos
18 dias seguintes, espera despachar normalmente. O tratamento deve durar pelo
menos seis meses.
Do Estadão Conteúdo, via UOL
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