Editorial, O Globo
A prisão do ex-ministro Paulo Bernardo — do Planejamento,
com Lula; das Comunicações, no governo Dilma — faz um sugestivo contraponto à movimentação
entre políticos, visível ou subterrânea, para conter a Operação Lava-Jato, já
convertida em símbolo do combate à corrupção.
Marido da senadora do PT do Paraná Gleisi Hoffmann, também
investigada, Bernardo caiu na malha da Operação Custo Brasil, executada a
partir do Ministério Público Federal de São Paulo. Ele é acusado de ter
recebido pelo menos R$ 7 milhões de uma empresa contratada de forma fraudulenta
pela pasta do Planejamento, quando ele era ministro.
Passou para as Comunicações e, segundo o MP, continuou a
receber propinas. A empresa Consist foi contratada para gerenciar empréstimos
consignados obtidos por servidores federais, cobrando-lhes um sobrepreço na
tarifa de serviço, para financiar o esquema de propinas. Entre 2010 e 2015, foram
R$ 100 milhões — na prática, expropriados de servidores públicos, uma das bases
eleitorais do próprio PT.
O nome da operação, Custo Brasil, foi inspirado na ideia do
peso que a corrupção representa para o país. Gleisi Hoffmann não compareceu
ontem à sessão da comissão do impeachment no Senado, onde é aguerrida defensora
da presidente afastada Dilma. Ela tem motivos para se preocupar.
Também a Custo Brasil teve aceito pela Justiça o pedido de
prisão preventiva de Guilherme Gonçalves, advogado de campanhas eleitorais de
Gleisi. A senadora já entrara na mira da Lava-Jato, depois que o ex-diretor da
Petrobras Paulo Roberto Costa a delatou como beneficiária do petrolão. Tudo
isso é um alento para quem se preocupa com os riscos de abafamento da Lava-Jato
e outras ações anticorrupção.
A Custo Brasil é resultado de um fatiamento da Lava-Jato,
quando se pensou que retirar processos de Curitiba, da jurisdição do juiz
Sérgio Moro e de procuradores que atuam por lá, iria enfraquecer as
investigações. Pelo visto, não deu certo neste caso de Paulo Bernardo e que
pode chegar a Gleisi. É auspicioso saber que há juízes e promotores fora de
Curitiba.
O clima de conspirata contra a Lava-Jato, captado pelo
gravador do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em conversas com o alto
co- mando peemedebista — Renan Calheiros, José Sarney, Romero Jucá —, poderia
existir também no Planalto de Michel Temer. O presidente repete que apoia a
Lava-Jato, o que é sempre positivo.
Mas não ecoaram bem os votos do ministro-chefe da Casa
Civil, Eliseu Padilha, para que a Operação tenha a “sensibilidade” de saber o
momento de encaminhar uma “definição final”. Mas como? Cabe a tautologia: deve
finalizar quando acabar a investigação, por falta do que investigar. É
inadmissível que qualquer operação contra o crime tenha prazo de validade.
O procurador Deltan Dallagnol, da Lava-Jato, esteve
quarta-feira na Câmara e lá comparou a corrupção a um serial killer que mata
disfarçado de “buracos de estrada, de falta de medicamentos, crimes de rua e de
pobreza”. A imagem é adequada. E é porque os bilhões desviados no petrolão, ou
qualquer outra tra- moia maquinada em Brasília, fazem falta em despesas
públicas essenciais para a população que reprimir essa roubalheira não pode
estar subordinado a conveniências políticas.
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