O conjunto de delações de Sérgio Machado e filhos fecha o
quebra-cabeça da corrupção na Petrobras. O resultado final nos faz lembrar uma
imagem muito comum nos açougues. No caso, a anatomia do boi com as divisões e
subdivisões de cada corte. O boi é a Petrobras (nesse caso, a imagem da vaca
leiteira é até mais contundente). Uma vaca só com partes nobres. Carnes de
primeira.
Cada pedaço da Petrobras tinha um dono. Podia ser um
partido. Podia ser um político ou um grupo deles. É claro que havia um comando
superior que metodicamente providenciou a divisão do filé, da maminha, da
alcatra, da picanha. Só carne sem osso.
A BR Distribuidora foi entregue a Fernando Collor de Mello,
um político da bancada do “eu sozinho”. A Transpetro coube ao PMDB.
Notadamente, à bancada do partido no Senado. São duas subsidiárias da
Petrobras. Tão grandes que mesmo que fossem independentes da empresa mãe ainda
se situariam na lista de maiores do Brasil.
O negócio principal da Petrobras é a extração e o refino de
petróleo. São negócios globais. Ao longo dos anos, a estatal se tornou uma
referência no mundo em extração de petróleo em alto mar. Na área de refino e
extração, os custos são de bilhões. As compras são de bilhões.
As obras são de bilhões.
Por isso, a presidência e as diretorias da empresa eram as
carnes mais nobres dessa vaca de tetas generosas. O PT, é claro, deu as cartas
nessa estrutura e chamou o venerável PP para uma lucrativa parceria. A
estruturação não era engessada. Cada mandatário de um pedaço tinha que
colaborar e ser solidário com os outros mandatários. Era como um condomínio da
corrupção. É por isso que a lista de beneficiários de Machado é abrangente.
Machado é uma ave rara nessa divisão. Foi o único político
nomeado para cargo de comando na Petrobras. Com exceção da presidência, os
outros cargos estratégicos ficaram com funcionários de carreira da estatal.
Gente com bom currículo técnico. Porém, carreiristas que só chegaram lá por que
aceitaram a lamentável função de açougueiros da estatal.
Eram eles diretores operacionais que mantinham sob seu
controle gerentes também operacionais. Suas tarefas eram cumprir ordens. Se o
comando definia que era preciso fazer uma refinaria, mesmo que desnecessária,
eles providenciavam. Quando era preciso comprar uma, mesmo que ferro velho,
eles tocavam o negócio.
As decisões bilionárias respondiam a uma lógica que mistura
política com ambições de enriquecimento pessoal. Não foi à toa que um gerente
sozinho teve que devolver 100 milhões de dólares. Não é à toa que Sérgio
Machado acolheu uma multa de R$ 71 milhões e mais a devolução do que for
encontrado em contas no exterior.
As investigações da Lava Jato estão chegando à reta final. A
radiografia da corrupção está sendo meticulosamente detalhada pela Operação. A
questão que vai permanecer para ser respondida é a seguinte: que tempos foram
esses que criaram um clima e condições tão propícias para a corrupção vicejar
em níveis tão assombrosos?
Certamente, os estudiosos vão se debruçar sobre a questão,
mas há pistas. Duas certezas perambulavam na mente dos operadores e políticos.
Uma: o esquema não seria descoberto. Outra: se descoberto, permaneceria impune.
Foi tudo ao contrário. Portanto, um marco na história e na cultura política e
empresarial do Brasil.
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