Editorial O Estado de S.Paulo
Numa coisa o prefeito Fernando Haddad mantém inabalável
coerência: a improvisação e a falta de planejamento sempre foram e continuam
sendo uma constante do seu governo, mesmo neste final melancólico. Uma das
provas disso é o vaivém das medidas adotadas com relação ao Uber, outros
aplicativos de transporte semelhantes e o serviço de táxi. A última delas muda
regras que ele próprio estabeleceu – sem ter tido o cuidado de então avaliar
devidamente as suas consequências –, com o objetivo de evitar que, com base
nelas, o Uber domine esse mercado.
A Prefeitura vai mudar a taxa cobrada de todos os
aplicativos, hoje de R$ 0,10 por quilômetro percorrido por seus carros, mas de
tal forma que as viagens feitas pelo Uber fiquem mais caras do que as de seus
concorrentes – o Cabify, o 99Pop e o Easy Go. Após os carros circularem um
total de 7.500 quilômetros, haverá uma sobretaxa de 10%, chegando a R$ 0,11.
Foram criadas também outras cinco faixas que podem levar a tarifa até um máximo
de R$ 0,30. Tudo isso de uma maneira que, na prática, o aumento afete apenas o
Uber.
O que se pretende com essa mudança é tornar os outros
aplicativos mais atraentes e impedir que o Uber – que já tem a maior parte dos
veículos que atuam nesse sistema – controle o mercado. “O consumidor pode achar
que tem vantagem com a cobrança mais barata”, disse Haddad referindo-se
certamente ao Uber, “mas essa vantagem é temporária. Se uma empresa tem um porcentual
exagerado do mercado, ela pode criar um monopólio.” Entre os problemas que uma
posição dominante do Uber criaria, operando com tarifa muito barata, estaria,
segundo o prefeito, uma competição desleal com os taxistas.
O que Haddad diz agora para justificar a medida anunciada é
verdade. Mas por que ele não percebeu isso antes? Pela simples e boa razão de
que as medidas tomadas por ele, em relação tanto ao Uber como aos táxis, não
foram precedidas por estudos técnicos destinados a medir seus impactos. Por
isso, foram logo substituídas por outras ou não tiveram parâmetros que
orientassem sua reavaliação a tempo.
Além da bisonha regulamentação do Uber, as medidas tomadas
por Haddad em relação aos táxis trazem a marca da improvisação, que ameaça
desorganizar esse serviço. Restringiu, sob o argumento de que eles reduziam a
velocidade dos ônibus, e depois – sem explicar por que o argumento deixara de
valer – liberou a circulação de táxis pelos corredores e faixas exclusivas,
como compensação pela regulamentação do Uber.
Criou o táxi preto, de melhor padrão, sorteando 5 mil
alvarás e exigindo dos que a ele aderiram investimentos que seriam compensados
por sua tarifa mais elevada. Menos de um ano depois, igualou as tarifas dos
vários tipos de táxi – comum, comum-rádio, especial, preto e luxo – à da
categoria mais popular, do táxi comum, alegando que isso facilitaria a
concorrência com o Uber. A medida descontentou a todos, a começar pelos que
tiveram de investir para satisfazer as exigências das categorias mais elevadas
e por isso ficaram em dificuldade para pagar a conta. E tanto não melhorou as
condições de concorrência com o Uber, que para isso a Prefeitura aumenta agora
a tarifa desse serviço.
O Uber se apressou a dizer, a respeito do aumento da tarifa,
que “é importante lembrar que limites arbitrários criam sistemas ineficientes,
fazendo com que os preços subam para o consumidor”, deixando entender que vai
tentar resistir à mudança, contando com a simpatia de seus clientes, o que é
uma atitude legítima da parte de qualquer empresa.
O resultado de tudo isso é que, com sua improvisação e suas
trapalhadas, Haddad desorganizou o serviço de transporte individual de
passageiros e desagradou a todos. Ao Uber, que trouxe inegáveis vantagens de
conforto e preço e por isso é hoje uma realidade da qual não se pode fugir; aos
outros aplicativos, que têm dificuldades de enfrentá-lo; e aos táxis, serviço
mais antigo, confiável e que tem ainda importante papel a desempenhar.
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