Suzana Kahn, O Globo
Após a ratificação do Acordo de Paris, celebrado por muitos,
ocorre até sexta-feira, em Marrakech, a 22ª Conferência das Partes sobre
Mudança do Clima (COP22), que discute a implementação do referido acordo e o
plano de ação dos países signatários. Apesar da incerteza gerada com a eleição
de Donald Trump, as delegações continuam negociando as regras que nortearão o
Acordo, baseando-se na suposição de que não há espaço para retrocesso.
O Brasil apresentou suas metas de redução de emissão de
gases de efeito estufa, que possivelmente cumprirá com facilidade. No entanto,
o que se almeja não é simplesmente a redução das emissões, pois uma recessão é
capaz de dar conta de nosso compromisso, mas, sim, o desenvolvimento
sustentável do país.
Uma das formas é através de inovação da indústria,
aumentando seu valor agregado, gerando empregos qualificados e expandindo a
receita, devido à maior independência tecnológica. É importante destacar que a
inovação deve ser entendida como um processo com três fases fundamentais.
A primeira está associada ao avanço do conhecimento
científico e a segunda, à transformação da ciência, fase de laboratórios,
protótipos, experimentos, ainda na órbita dos institutos de pesquisa e
universidades. A última fase é a de produção de algo inovador, incluindo
projeto básico de engenharia, testes de verificação e validação, design,
licenciamento e colocação no mercado. É exatamente aí que o Brasil estaciona.
Há uma grande distância entre inovação na indústria e
conhecimento científico. Nossas universidades e centros de pesquisa têm toda a
capacidade de chegar à segunda etapa do processo. Dessa forma, o primeiro passo
para desenharmos o plano de ação do cumprimento do Acordo de Paris é criarmos
um canal entre os “produtores de ciência” e aqueles que devem “consumi-la”.
Apenas para ilustrar este ponto, tomemos a energia eólica,
que aumenta sua participação em todo o mundo, inclusive no Brasil. Isso ocorre
por causa do desenvolvimento tecnológico, ganho de escala e valorização das
renováveis em substituição aos combustíveis fósseis. O Brasil atraiu inúmeras
indústrias de aerogeradores, mas que são, em geral, montadoras com produção
local apenas de algumas partes predominantemente pesadas ou de grande volume,
como pás e torres. Com isso, essas indústrias atendem a critérios de índice de
nacionalização baseados em peso, mas não em valor. As demais partes, com maior
valor tecnológico agregado, ainda são importadas, criando forte dependência
tecnológica.
Vale lembrar que uma das metas do Brasil no Acordo de Paris
é o aumento da participação de renováveis em nossa matriz energética, o que
sinaliza o crescente mercado nacional para essa indústria. Inúmeros eixos de
desenvolvimento de uma indústria inovadora são possíveis e estratégicos para o
país, independente de nossas metas de redução de emissão.
Como na COP22 se inicia o processo para desenhar um plano de
desenvolvimento de longo prazo para o país, é oportuno que haja uma sincronia de
políticas nacionais visando à construção de uma ponte entre as competências das
universidades e dos empreendedores, pequenos ou grandes. Só assim, para além de
Marrakech, por volta de 2030, poderemos ser um país com menor emissão de
carbono, desenvolvido e com indústria inovadora.
Além das metas, almeja-se o crescimento sustentável do país.
Suzana Kahn é presidente do Comitê Coefficient do Painel
Brasileiro de Mudanças Climáticas
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