Alberto Dines, Observatório da Imprensa
A eleição de um bispo da Igreja Universal para a prefeitura
do Rio pode virar o Brasil de cabeça para baixo em poucos anos e consagrar
Marcelo Crivella presidente em 2018. Nada menos que isso é o projeto evangélico
que teve como máxima eleitoral “quero cuidar de você” e esse “você” é o Brasil
inteiro, a terra toda.
Não duvidem do poder e do controle do Conselho de Pastores
que vai acompanhar de perto o legado dos candidatos evangélicos nesta eleição ,
22 deputados federais, 105 prefeitos, 1,6 mil vereadores. Luta para aumentar a
bancada da Câmara de 22 para 40 e de 40 para 150. Vai garfar com seu populismo
os órfãos de um PT arrasado e com sua oratória de pastor, catequizar a população
desiludida.
Não minimizem a ambição dos evangélicos em nenhum setor,
incluindo a economia. Eles têm espírito empreendedor, criam seu pequeno
negócio, acreditam na autoajuda. São unidos em nome de Deus. Marcos Pereira,
presidente do PRB de Crivella, admitiu que o partido vai disputar tudo,
inclusive a Presidência da República. Em vídeos, Crivella prega a unificação
das Igrejas evangélicas , que somem juntas 42 milhões de fiéis.
A religião , a do medo, sataniza homossexuais, retira a
conquista das mulheres de serem donas do próprio corpo quando condena o aborto,
dá um passo atrás na não descriminalização das drogas e acaba com a livre
discussão ideológica nas escolas. E Crivella não se considera conservador e sim
um preservador dos valores tradicionais da “civilização cristã ocidental “.
Governo austero, sim. O Rio capitulou, seu símbolo máximo, Helô Pinheiro, a
Garota de Ipanema cantada por Vinicius e Tom , votou em Crivella.
A religião é individual , uma questão de fé na busca do
absoluto. O coletivo vale enquanto massa ideológica mas de uma forma bem
diferente do coletivo que é,ou seria ,o objetivo da política.
A IURD (Igreja Universal do Reino de Deus) é um fenômeno de
poder sobre as massas com seis mil templos, 23 concessões de TV, 20
retransmissoras, 76 rádios no país. Onde havia um cinema de bairro, hoje há um
templo da IURD. O interesse de Deus, que foi citado sete vezes por Crivela no
seu discurso de vitória, é o projeto evangélico de teocratizar a nação inteira.
A conquista das almas inclusive para financiar campanhas. Os fiéis doarão com
prazer e com vistas ao reino dos céus.
A desagregação partidária
A presença neopentecostal foi favorecida pela pulverização
dos 35 partidos, a divisão das esquerdas, da centro-direita, pela desilusão com
a política tradicional, pelos escândalos de corrupção e pelo fim da ilusão das
classes C e D de ascender à classe média. Não que os evangélicos sejam
incorruptíveis. Desde 1987, eles recebem empréstimos a fundo perdido para as
Igrejas, estavam presentes nos escândalos dos Anões do Orçamento e na Operação
Sanguessuga, do superfaturamento na aquisição de ambulâncias..
Em dois anos esse projeto vai ser levado com afinco e pode
ser beneficiado pelas delações da Odebrecht e Eduardo Cunha na Lava Jato,
espirrando lama em velhos caciques políticos. O juiz Sérgio Moro pode colocar
Lula no xadrez, e até Temer é capaz de sair de cena já que foi chamado como
testemunha de defesa do maquiavélico Eduardo Cunha. A briga no PSDB vai ser de
cães raivosos num partido que vai governar 1/3 do país. O partido vitorioso
nessas eleições municipais pode se esfacelar na disputa interna entre Aécio,
Alckmin e Serra .
Dos 25 partidos que ocuparam o vácuo do PT devem sair vários
pré-candidatos presidenciais. Ciro Gomes, do PDT, ex governador do Ceará, é um
deles. Dos outros, pode não sair novamente nenhum estadista, nenhum líder
carismático que mereça uma ida às urnas dando mais fôlego às abstenções e
inflando as pretensões de Edir Macedo.
Se o desencanto da população se acentuar como neste domingo
, o não voto superando os votos dos prefeitos eleitos, quem vai lucrar será o
projeto evangélico com seus fiéis fidelíssimos.
O Brasil não será o paraíso na terra e queira Deus que não
terá o destino dos 918 seguidores acéfalos da seita pentecostal de Jim Jones na
floresta amazônica da Guiana que preferiram o suicídio em massa aos horrores
presenciados neste reino. Não que os horrores brasileiros não convidem a um escape.
Mas cuidado, Brasil, o Rio será a grande vitrine, o grande teste para a
laicização, balão de ensaio para 2018.
Alberto Dines é jornalista, escritor e cofundador do
Observatório da Imprensa
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