Na noite de 11 de maio, o senador Fernando Collor (PTC-AL)
silenciou o plenário ao discursar. Todos queriam saber se o primeiro presidente
da República a sofrer processo de impeachment declararia voto pelo afastamento
ou não da então presidente Dilma Rousseff (PT). Em um discurso duro, em que se
pintou como vítima de um complô e um golpe parlamentar em 1992, Collor defendeu
a saída da petista do Palácio do Planalto. “Chegamos ao ápice de todas as
crises, chegamos às ruínas de um governo, às ruínas de um país”, discursou.
Dilma foi afastada no dia seguinte. Em 31 de agosto, no julgamento final, ele
votou pelo impeachment da presidente, de quem fora aliado no Congresso. O voto
dele nas duas sessões chamou a atenção pelo encontro de dois fatos históricos,
mas também pela sua simples presença no Senado.
O senador foi o mais ausente do plenário entre todos os seus
colegas em 2016. Apenas Jader Barbalho (PMDB-PA), que enfrentou complicações de
saúde, compareceu menos. Denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro ao
Supremo Tribunal Federal (STF) na Operação Lava Jato, Collor faltou uma a cada
três sessões convocadas para votações de projetos, medidas provisórias ou
propostas de emenda constitucional. Das 91 reuniões de que deveria participar
até o início de dezembro, faltou a 30. Dessas, 25 foram justificadas por ele,
todas para realizar alguma atividade parlamentar, mostra levantamento da
Revista Congresso em Foco.
A Constituição prevê a perda do mandato do deputado ou
senador que faltar a mais de um terço das sessões ordinárias ao longo do ano
sem se justificar. Collor estaria sujeito a essa punição se suas faltas não
tivessem sido abonadas. O problema é que, além da possibilidade de ter a falta
perdoada por problemas de saúde ou pela necessidade de representar o
Parlamento, o congressista também pode justificar que realizou atividade
parlamentar no estado, sem detalhar o que fez.
Sem controle
Esse tipo de explicação é a mais comum entre as usadas pelos
senadores para escapar do desconto no salário, previsto para quem faltar sem
justificar. Na prática, a atividade parlamentar pode ser qualquer coisa que o
congressista fizer em Brasília, no seu estado ou no exterior. Até a ausência
para pedir votos a aliados políticos durante a campanha eleitoral, como a que
houve em 2016, pode ser abonada. A Mesa Diretora do Senado perdoa as faltas
mesmo quando a desculpa do senador não especifica o local ou a agenda a ser
tratada.
Questionado pela reportagem, o gabinete de Collor não soube
detalhar quais foram os compromissos aos quais ele precisou comparecer para não
estar presente em plenário.
No Senado, é possível anular a ausência e evitar o corte no
salário apenas com uma declaração do parlamentar. A Secretaria-Geral da Mesa
explica que o senador nem precisa apresentar comprovante sobre o tipo de
atividade de que participou. O congressista só é obrigado a apresentar
relatório de suas atividades fora do Legislativo quando a missão política
implicar custo.
Depois de Collor, o senador que mais apresentou esse tipo de
justificativa foi Zezé Perrella (PTB-MG). O petebista faltou a 25 sessões (23%)
das 91 realizadas entre o início de fevereiro e 8 de dezembro, data em que o
levantamento foi concluído. Ele atribuiu 23 dessas ausências ao exercício de
atividades parlamentares. Só uma foi justificada por problema de saúde, e outra
ficou sem justificativa.
Este é o segundo ano consecutivo em que o senador aparece no
ranking dos mais ausentes. Em 2015, Perrella faltou a 48 sessões deliberativas,
mais de um terço do total das reuniões realizadas. Em quase todas as vezes, deu
a desculpa genérica e teve as faltas abonadas, com exceção de dois dias em que
ele alegou “motivos particulares”. Na época, a assessoria dele atribuiu parte
de suas faltas à necessidade de visitar sua base eleitoral. Perrella assumiu o
mandato em 2011 como suplente do então titular e ex-presidente Itamar Franco,
morto naquele ano. Excluídos os casos de problemas de saúde, Perrella foi o
terceiro senador que mais se ausentou das sessões reservadas a votação.
Entre ele e Collor, aparece Omar Aziz (PSD-AM), que acumulou
27 faltas (25%) entre o começo de fevereiro e o de dezembro. Depois disso, o
Senado realizou mais duas sessões, mas os dados não foram contabilizados pelo
levantamento porque não estavam disponíveis até a conclusão desta reportagem. O
ex-governador do Amazonas pediu apenas uma licença-saúde e deixou de justificar
cinco faltas. Ao todo, 13 de suas ausências foram atribuídas a atividade
parlamentar.
As preocupações do ex-presidente
O elevado número de faltas está longe de ser a maior
preocupação de Fernando Collor. Ele foi o primeiro senador a ser denunciado
pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF),
acusado de receber R$ 30 milhões em propina do esquema de corrupção na
Petrobras, entre 2010 e 2014.
Na denúncia, ainda não examinada pelos ministros, pesam 30
acusações de corrupção passiva, 376 de lavagem de dinheiro e 48 de peculato (apropriação
indevida por parte de agente público) contra o senador. Além de pedir a
condenação e o mandato de Collor, a PGR cobra a devolução de R$ 154,7 milhões
do ex-presidente e de aliados dele acusados de participar de desvios na BR
Distribuidora.
O senador é alvo de cinco inquéritos no âmbito da Lava Jato.
As investigações foram abertas para apurar as relações dele com o doleiro
Alberto Youssef. Policiais federais apreenderam no escritório de Youssef oito
comprovantes de depósitos bancários, que somam R$ 50 mil, a Collor.
Em delação premiada, o empresário Ricardo Pessoa, da UTC,
afirmou que repassou R$ 26 milhões a pessoas ligadas ao senador como comissão
por um contrato fechado com a subsidiária da Petrobras. Collor nega
envolvimento com as denúncias e atribui as investigações a perseguição do
Ministério Público Federal. Os investigadores acusam o ex-presidente de lavar
dinheiro com uma frota de carros de luxo, que inclui, entre outros, uma
Lamborghini e uma Ferrari.
Na reportagem publicada na revista, você pode ver a íntegra
do levantamento da assiduidade entre todos os senadores, em 2016, feito com
exclusividade pela Revista Congresso em Foco.
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