terça-feira, 17 de janeiro de 2017

COLLOR, O GAZETEIRO

Na noite de 11 de maio, o senador Fernando Collor (PTC-AL) silenciou o plenário ao discursar. Todos queriam saber se o primeiro presidente da República a sofrer processo de impeachment declararia voto pelo afastamento ou não da então presidente Dilma Rousseff (PT). Em um discurso duro, em que se pintou como vítima de um complô e um golpe parlamentar em 1992, Collor defendeu a saída da petista do Palácio do Planalto. “Chegamos ao ápice de todas as crises, chegamos às ruínas de um governo, às ruínas de um país”, discursou. Dilma foi afastada no dia seguinte. Em 31 de agosto, no julgamento final, ele votou pelo impeachment da presidente, de quem fora aliado no Congresso. O voto dele nas duas sessões chamou a atenção pelo encontro de dois fatos históricos, mas também pela sua simples presença no Senado.
O senador foi o mais ausente do plenário entre todos os seus colegas em 2016. Apenas Jader Barbalho (PMDB-PA), que enfrentou complicações de saúde, compareceu menos. Denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro ao Supremo Tribunal Federal (STF) na Operação Lava Jato, Collor faltou uma a cada três sessões convocadas para votações de projetos, medidas provisórias ou propostas de emenda constitucional. Das 91 reuniões de que deveria participar até o início de dezembro, faltou a 30. Dessas, 25 foram justificadas por ele, todas para realizar alguma atividade parlamentar, mostra levantamento da Revista Congresso em Foco.
A Constituição prevê a perda do mandato do deputado ou senador que faltar a mais de um terço das sessões ordinárias ao longo do ano sem se justificar. Collor estaria sujeito a essa punição se suas faltas não tivessem sido abonadas. O problema é que, além da possibilidade de ter a falta perdoada por problemas de saúde ou pela necessidade de representar o Parlamento, o congressista também pode justificar que realizou atividade parlamentar no estado, sem detalhar o que fez.
Sem controle
Esse tipo de explicação é a mais comum entre as usadas pelos senadores para escapar do desconto no salário, previsto para quem faltar sem justificar. Na prática, a atividade parlamentar pode ser qualquer coisa que o congressista fizer em Brasília, no seu estado ou no exterior. Até a ausência para pedir votos a aliados políticos durante a campanha eleitoral, como a que houve em 2016, pode ser abonada. A Mesa Diretora do Senado perdoa as faltas mesmo quando a desculpa do senador não especifica o local ou a agenda a ser tratada.
Questionado pela reportagem, o gabinete de Collor não soube detalhar quais foram os compromissos aos quais ele precisou comparecer para não estar presente em plenário.
No Senado, é possível anular a ausência e evitar o corte no salário apenas com uma declaração do parlamentar. A Secretaria-Geral da Mesa explica que o senador nem precisa apresentar comprovante sobre o tipo de atividade de que participou. O congressista só é obrigado a apresentar relatório de suas atividades fora do Legislativo quando a missão política implicar custo.
Depois de Collor, o senador que mais apresentou esse tipo de justificativa foi Zezé Perrella (PTB-MG). O petebista faltou a 25 sessões (23%) das 91 realizadas entre o início de fevereiro e 8 de dezembro, data em que o levantamento foi concluído. Ele atribuiu 23 dessas ausências ao exercício de atividades parlamentares. Só uma foi justificada por problema de saúde, e outra ficou sem justificativa.
Este é o segundo ano consecutivo em que o senador aparece no ranking dos mais ausentes. Em 2015, Perrella faltou a 48 sessões deliberativas, mais de um terço do total das reuniões realizadas. Em quase todas as vezes, deu a desculpa genérica e teve as faltas abonadas, com exceção de dois dias em que ele alegou “motivos particulares”. Na época, a assessoria dele atribuiu parte de suas faltas à necessidade de visitar sua base eleitoral. Perrella assumiu o mandato em 2011 como suplente do então titular e ex-presidente Itamar Franco, morto naquele ano. Excluídos os casos de problemas de saúde, Perrella foi o terceiro senador que mais se ausentou das sessões reservadas a votação.
Entre ele e Collor, aparece Omar Aziz (PSD-AM), que acumulou 27 faltas (25%) entre o começo de fevereiro e o de dezembro. Depois disso, o Senado realizou mais duas sessões, mas os dados não foram contabilizados pelo levantamento porque não estavam disponíveis até a conclusão desta reportagem. O ex-governador do Amazonas pediu apenas uma licença-saúde e deixou de justificar cinco faltas. Ao todo, 13 de suas ausências foram atribuídas a atividade parlamentar.
As preocupações do ex-presidente
O elevado número de faltas está longe de ser a maior preocupação de Fernando Collor. Ele foi o primeiro senador a ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de receber R$ 30 milhões em propina do esquema de corrupção na Petrobras, entre 2010 e 2014.
Na denúncia, ainda não examinada pelos ministros, pesam 30 acusações de corrupção passiva, 376 de lavagem de dinheiro e 48 de peculato (apropriação indevida por parte de agente público) contra o senador. Além de pedir a condenação e o mandato de Collor, a PGR cobra a devolução de R$ 154,7 milhões do ex-presidente e de aliados dele acusados de participar de desvios na BR Distribuidora.
O senador é alvo de cinco inquéritos no âmbito da Lava Jato. As investigações foram abertas para apurar as relações dele com o doleiro Alberto Youssef. Policiais federais apreenderam no escritório de Youssef oito comprovantes de depósitos bancários, que somam R$ 50 mil, a Collor.
Em delação premiada, o empresário Ricardo Pessoa, da UTC, afirmou que repassou R$ 26 milhões a pessoas ligadas ao senador como comissão por um contrato fechado com a subsidiária da Petrobras. Collor nega envolvimento com as denúncias e atribui as investigações a perseguição do Ministério Público Federal. Os investigadores acusam o ex-presidente de lavar dinheiro com uma frota de carros de luxo, que inclui, entre outros, uma Lamborghini e uma Ferrari.
Na reportagem publicada na revista, você pode ver a íntegra do levantamento da assiduidade entre todos os senadores, em 2016, feito com exclusividade pela Revista Congresso em Foco.
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