Do UOL
Mesmo após os EUA endurecerem as regras para receber
viajantes brasileiros, o Ministério do Turismo tenta convencer o Palácio do
Planalto a aprovar uma proposta que facilitaria a entrada de visitantes
americanos e de outras três nacionalidades no Brasil.
A medida, que enfrenta a oposição do Ministério das Relações
Exteriores, liberaria por dois anos cidadãos dos EUA, Japão, Austrália e Canadá
da obrigatoriedade de tirar vistos para fazer turismo no Brasil. As quatro
nações exigem vistos de viajantes brasileiros.
Em entrevista à BBC Brasil, o ministro do Turismo, Marx
Beltrão, diz acreditar que o presidente Michel Temer assinará nos próximos dias
uma Medida Provisória autorizando a isenção, que vigorou por quase quatro meses
em 2016 e buscava estimular a vinda de turistas dos quatro países na época da
Olimpíada.
O ministro estima que a isenção --antiga demanda de
associações de hotéis e agências de turismo brasileiras-- aumentaria em 25% o
fluxo de visitantes de cada uma das quatro nações e injetaria R$ 1,4 bilhão na
economia nacional em dois anos.
O Ministério do Turismo afirma que, no período em que se
liberou a exigência de vistos dos quatro países, entre 1º de junho e 18 de
setembro de 2016, o Brasil recebeu 163 mil visitantes americanos, canadenses,
japoneses e australianos, que gastaram US$ 167 milhões no país.
Se avançar, a proposta será aprovada num momento em que a
principal nação visada pela medida, os EUA, endurece a concessão de vistos a
viajantes brasileiros e de outras nacionalidades.
A partir desta semana, consulados americanos no Brasil
passaram a exigir que maiores de 14 anos e menores de 79 sejam entrevistados
para conseguir um visto para os EUA. Antes, pessoas com até 16 ou mais de 65
eram dispensadas do procedimento.
A exigência de entrevista também foi estendida a pessoas que
queiram renovar o visto mais de um ano após seu vencimento (antes a dispensa
valia por quatro anos).
As mudanças seguem as novas diretrizes migratórias definidas
pelo presidente Donald Trump e buscam ampliar o controle sobre a entrada de
estrangeiros nos EUA, uma de suas principais promessas de campanha.
As alterações ocorrem ainda num momento em que os EUA
ampliam as rejeições a pedidos de vistos por brasileiros. Em 2016, foram
recusados 16,7% dos pedidos, três vezes mais do que o índice de 2015 (5,4%).
Vistos costumam ser rejeitados quando se suspeita que os solicitantes planejam
migrar para os EUA.
'Hora de abrir o mercado'
O ministro do Turismo afirma que as novas regras de vistos
para os EUA não alteram sua postura sobre a proposta de isenção.
"Pelo contrário: se os EUA estão fazendo mudanças em
relação a suas políticas de vistos, nós temos que aproveitar o momento e abrir
nosso mercado para eles", afirma.
"O americano é um dos públicos que mais gastam mundo
afora, e ao mesmo tempo é um público muito perto do Brasil."
Em 2015, último ano sobre o qual há estatísticas
disponíveis, os EUA foram o segundo país que mais enviou turistas ao Brasil
(575 mil), atrás da Argentina (2 milhões). O Japão foi o décimo sétimo da lista
(70 mil), e o Canadá, o vigésimo (68 mil). A Austrália não figurou no ranking
dos principais emissores.
Beltrão diz que os atritos entre os EUA e o México após a
posse de Trump são outro estímulo à aprovação da proposta.
Na semana passada, Trump ordenou a construção de um muro na
fronteira com o México e disse que os mexicanos terão de pagar pela obra, ideia
rejeitada pelos vizinhos. Após o anúncio, o presidente mexicano, Enrique Peña
Nieto, cancelou uma visita aos EUA.
"O México é quem mais recebe turistas americanos. Com a
confusão entre os dois governos, o Brasil pode se beneficiar com a vinda de
turistas americanos para o país", diz o ministro.
Beltrão minimiza a alteração nas regras de vistos para os
EUA. "São apenas mudanças de procedimento. Não há dificuldade, não há
nenhum tipo de impedimento para o brasileiro ir para os Estados Unidos."
Ele afirma ainda que a proposta de isenção tem o apoio dos
ministérios da Casa Civil, Fazenda e Planejamento.
"Não encontrei até agora nenhum outro setor do governo
que seja contra essa medida, a não ser o Ministério das Relações Exteriores, que
tem lá sua política conservadora, que não quero entrar em detalhes."
Reciprocidade
Para o Itamaraty, a medida enfraqueceria a posição do Brasil
diante das quatro nações e violaria o princípio diplomático da reciprocidade.
Um diplomata que acompanha o tema e pediu para não ser
identificado disse que nenhum país grande e relevante - entre os quais citou
China, Índia, Rússia, Turquia e Arábia Saudita - libera unilateralmente a
entrada de viajantes de países que exijam vistos de seus cidadãos.
Em todos os acordos de isenção de vistos que o Brasil mantém
com outros países, a aplicação da medida é recíproca. Segundo o Ministério do
Turismo, o país mantém mais de 90 acordos do tipo.
Para o diplomata, se liberar a exigência, o Brasil perderá
para sempre "um mínimo poder de barganha" que tem para negociar a
isenção de vistos para brasileiros nesses países.
O Itamaraty questiona ainda as vantagens econômicas da
proposta com base em dados da Polícia Federal sobre a entrada de estrangeiros
nos quase quatro meses em que vigorou a isenção.
Os dados mostram que, ainda que o número de visitantes
australianos e canadenses tenha aumentado em relação ao mesmo período do ano
anterior, o número de turistas americanos e japoneses caiu.
Houve 208 mil visitas de americanos durante a isenção e
213,3 mil no mesmo período de 2015.
Questionado sobre o tema, o ministro do Turismo disse
discordar do argumento e citou dados de outra pesquisa, feita por sua pasta
durante a isenção.
Segundo o levantamento, 74% dos viajantes dos quatro países
que entraram no Brasil naquele período se valeram da isenção, e 85% disseram
que a extensão da dispensa facilitaria sua volta ao Brasil.
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