Por pressão de parlamentares ligados às bancada religiosas,
o plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (21) projeto que
reforça e amplia direitos de crianças e adolescentes, mas excluiu do texto a
vedação explícita à discriminação em decorrência da orientação sexual.
O projeto original estabelecia proteção a crianças e
adolescentes "contra qualquer tipo de discriminação, independentemente de
classe, sexo, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível
educacional, idade, religião, nacionalidade, procedência regional, regularidade
migratória, deficiência ou qualquer outra condição sua, de seus pais ou de
representantes legais."
Após pressão da bancada religiosa, foi riscado do texto a
expressão "orientação sexual".
A relatora do projeto, Laura Carneiro (PMDB-RJ), afirmou que
retirou a expressão a pedido do PRB, partido ligado à Igreja Universal do Reino
de Deus, e do deputado Flavinho (PSB-SP), que integra a Frente Parlamentar
Evangélica.
"Não apresentaram argumento. A gente sabe, é uma
questão religiosa. Precisávamos construir maioria para aprovar o projeto, que é
muito importante para crianças e adolescentes. E de jeito nenhum a
discriminação por orientação sexual é autorizada. Permaneceu no texto a
proteção à criança e adolescente, independentemente de qualquer condição sua.
As vezes é muito difícil construir maioria", disse Laura Carneiro.
O líder do PRB, Cleber Verde (MA), que é católico, confirmou
o pedido para a retirada da expressão.
"O partido tem um contingente muito grande de deputados
ligados à bancada evangélica, e chegamos à conclusão de que havia um termo no
projeto original que levava a uma dúbia interpretação da questão de
gênero", afirmou.
Questionado, o deputado disse que, em sua visão, não houve a
intenção de discriminar, no projeto, adolescentes gays. "Não é essa nossa
intenção, a intenção é proteger e preservar a família, a identidade de sexo,
havia dúvida sobre isso no projeto."
A reportagem tentou falar com o deputado Flavinho, mas não
conseguiu até a publicação desta reportagem.
ESTUPRO NO RIO
O projeto foi aprovado pelo plenário da Câmara, sem registro
nominal dos votos, e segue agora para análise do Senado.
Ele cria uma sistemática com garantias a crianças e adolescentes
vítimas ou testemunha de violência, reforçando regras já presentes na
legislação e trazendo algumas novidades.
Uma delas é evitar o ocorrido na apuração do caso da
adolescente estuprada em maio de 2016 no complexo de favelas São José Operário,
zona oeste do Rio, após ir a um baile funk.
Em gravação feita pelos criminosos, um grupo de homens, em
meio a risadas, toca nas partes íntimas da garota e diz que ela foi violentada
por "mais de 30".
A menina prestou vários depoimentos à polícia em situações que
levaram à defesa da vítima a pedir o afastamento do delegado responsável pela
investigação sob o argumento de que ele agia com "machismo e a
misoginia". "O atendimento prestado à vítima da violência, à época,
se notabilizou pelo desrespeito aos direitos e garantias da adolescente",
escreveu Laura Carneiro em seu relatório.
O caso foi transferido depois para a Delegacia da Criança e
do Adolescente Vítima.
O projeto aprovado pela Câmara disciplina a "escuta
especializada" e o "depoimento especial" de crianças e
adolescentes vítimas ou testemunhas de violência. Entre outras coisas, o
projeto estabelece que o depoimento da criança ou do adolescente será realizado
em "local apropriado e acolhedor, com infraestrutura e espaços físicos que
garantam a privacidade."
A determinação é a de que o depoimento só seja realizado uma
vez, salvo quando "justificada a sua imprescindibilidade pela autoridade
competente".
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