Na semana passada, fui surpreendido pela divulgação de um
áudio com uma voz supostamente minha que defendia ideias com as quais não
compactuo. Há anos, alerto para o risco da volta do regime militar e tenho sido
ferrenho adversário dessa alternativa, mas o áudio passa a ideia de que não
apenas alerto como também sugiro essa insanidade. Fui vítima de uma violência e
incômodo a que se somaram surpresa e preocupação com o fato de receber
cumprimentos de apoio por parte daqueles que imaginavam ser minha voz e meu
discurso. Decepcionei pessoas, em diversos lugares, quando neguei a autoria da
mensagem.
A crise que atravessamos deve ser resolvida pelas urnas, não
pelas armas; pelos políticos, não pelos militares. Quem tem conhecimento
histórico sabe que uma ditadura não permite corrigir seus erros. Os políticos
atuais, com todos os seus defeitos, têm apenas 52 semanas para voltarem para
casa, se o povo assim votar. Um regime militar não tem prazo de permanência, o
último demorou 21 anos e foi muito difícil de ser derrubado.
Os atuais políticos estão sob o fogo da imprensa, da Justiça,
da polícia e do Ministério Público. Diversos deles presos, muitos transformados
em réus à espera da sentença. Em um regime autoritário, a Justiça será
controlada, a imprensa censurada, a polícia desviada de função para servir à
repressão política. E nada indica que as fardas não têm bolsos para alguns
militares que desejarem se locupletar ou que não fecharão os olhos para os
políticos que vão servi-los, corruptamente, muitos dos quais escolhidos dentre
os atuais.
Uma intervenção militar não é a saída para a crise
brasileira e para a desmoralização da classe política, mas é preciso reconhecer
a expectativa dos brasileiros frustrados com a corrupção, a incompetência e a
falta de patriotismo de nós políticos. Raríssimos militares desejariam intervir
na política. Eles são formados com o sentimento de patriotismo, de interesse
nacional, com espírito público e são hoje, em sua maioria, comprometidos com a
democracia. Se há um desejo de intervenção, parte de políticos ex-militares e
da população descontente.
A culpa desse sentimento, comprovado pela reação de pessoas
diante do áudio que eu repudiei, é do nosso fracasso na condução do Brasil, das
imagens de políticos com malas de dinheiro, das gravações e delações expondo o
submundo da política. Isso não seria um risco se o militar não fosse um cidadão
que vê a tragédia de seu país, a falta de coesão no presente e a falta de rumo
para o futuro.
Aliada a isso está a indignação crescente de cada militar,
obrigado a prestar continência e reverência a um poder civil cada vez menos
respeitado. É tão óbvio esse risco que
parece surpreendente continuarmos cometendo erros a cada dia nas decisões que
tomamos no Congresso: um fundo para financiar eleições com dinheiro público, enquanto
os hospitais, as universidades e os quartéis não têm o necessário para
funcionar; uma reforma política feita para reduzir a chance de renovação; a
instabilidade jurídica, a violência; além, obviamente, da tolerância com a
corrupção estão levando o povo contra o poder civil.
Faltam apenas 362 dias para as urnas falarem. Nas atuais
condições, de notícias vergonhosas e decisões precipitadas e inconsequentes, é
um longo tempo a ser administrado com cuidado e seriedade, tanto por políticos
quanto por líderes militares. Se isso não ocorrer, o suicídio da democracia
será por nossa culpa.
Artigo publicado pelo Jornal Correio Braziliense –
10/10/2017
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