Em um julgamento que cindiu o Supremo Tribunal Federal ao
meio e provocou polêmicas e bate-bocas diversos antes de o resultado final ser
proferido ontem, a maioria dos ministros da Suprema Corte definiu, por 6 votos
a 5, que medidas cautelares que envolvam mandatos parlamentares terão de ser
analisadas pelo Congresso para ser convalidadas.
Na prática, isso significa que, na próxima terça-feira, os
senadores vão avaliar, em plenário, a manutenção das sanções impostas pela
Primeira Turma do STF ao senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). A polêmica não
acabou após o voto de desempate proferido pela presidente Cármen Lúcia. Ao
contrário, só aumentou.
A presidente do STF afirmou que concordava com a aplicação
de medidas cautelares, mas que, no caso de ações que atrapalhem diretamente o
exercício parlamentar, elas deveriam ser analisadas pelo Congresso, pois o
mandato é concedido pelo eleitor.
Instalou-se, então, uma grande confusão. Os ministros que
defenderam a análise das medidas pelo Congresso questionaram os limites das
mesmas. O mais enfático era Alexandre de Moraes. “Você proibir um parlamentar
de estar no Congresso após as 18h, período em que se iniciam as votações,
significa, na prática, a cassação do mandato parlamentar”, defendeu. Os
ministros passaram quase duas horas debatendo o caso até que Celso de Mello
definiu, como linhas gerais do voto final que ainda será redigido, que serão
analisadas as medidas que, “direta ou indiretamente”, afetem o mandato
parlamentar.
A tensão da sessão refletia o clima de embate travado entre
os dois poderes desde que, por 3 votos a 2, os titulares da primeira turma
definiram o afastamento de Aécio do mandato e o obrigaram a permanecer em casa
à noite. Na semana passada, parte dos senadores defendeu que a decisão fosse
descumprida pela Casa. “Há notícias de que o Senado poderia descumprir a
decisão a depender do resultado deste julgamento. Isso seria um desrespeito,
porque o STF exerce a atividade prevista pela Casa Legisladora”, atacou Celso
de Mello.
Voto vencido desde a primeira turma, Marco Aurélio era um
dos mais indignados com a situação.
Quando chegou a vez de ele votar, o ministro foi irônico ao dizer que o
tribunal estava dividido. “Esta história de que o STF pode tudo não vinga, não
pode vingar. Porque ele também está submetido à Constituição Federal”, criticou.
Nitidamente, os ministros trouxeram para o plenário
divergências anteriores que vêm se agravando nos últimos debates. Luís Roberto
Barroso, que votou contra Aécio na primeira turma, lembrou que, manter
restrições aos demais investigados, e não impor as mesmas sanções ao senador
mineiro, seria perpetuar a tese de que “só peixes pequenos no Brasil são
punidos”.
“O Brasil é um país que se perdeu na história e está em
busca de reencontrar o próprio mundo. É possível um país fundado no
progressismo, no liberalismo, no conservadorismo. Não se pode um país fundado
na desonestidade”, declarou Barroso.
Trégua
Mais cedo, na abertura da sessão, o relator do processo,
ministro Edson Fachin, afirmou que a imunidade material poderia representar um
privilégio injustificado. “Cabe ao Congresso relaxar a prisão, e não revisar as
decisões do Judiciário.” Foi enfaticamente rebatido por Moraes. “As ações do
STF, em medidas cautelares, devem ser interpretadas nos estritos ditames da
lei. Não estamos tratando de privilégios a parlamentares, nem tampouco de algo
que só existe no Brasil. É algo a favor da lei, a favor da Constituição. A
imunidade legislativa não pode ser colocada na mesma altura das demais
imunidades”, disse Moraes.
O resultado também é fruto de uma costura feita pela
presidente Cármen Lúcia e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
Os senadores se insurgiram contra a decisão da primeira turma e queriam
derrubá-la havia duas semanas. Cármen apressou-se e marcou para ontem a sessão
do plenário para debater a questão, obtendo uma trégua dos parlamentares. Era
tão tênue a linha entre a crise e o fim dela que Cármen abandonou uma das suas
práticas mais corriqueiras: a de encerrar a sessão por volta das 18h. Os
trabalhos ontem só terminaram às 22h.
Almirante solto
A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região revogou
a prisão preventiva decretada pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Criminal
Federal, e concedeu habeas corpus ao almirante Othon Luiz Pinheiro,
ex-presidente da Eletronuclear condenado a 43 anos de prisão. Preso em julho de
2015, foi para o regime aberto em dezembro, mas voltou a ser preso em julho de
2016 pela PF durante a Operação Pripyat acusado de continuar a exercer
influência na Eletronuclear.
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