As pesquisas mostraram que há muitos candidatos à
Presidência, mas ainda poucos votos. Conheço quase todos os candidatos
pessoalmente, incluído Levy Fidelix, cuja campanha documentei em 2015, assim
como outros considerados nanicos na época. Discutir suas qualidade e seus
defeitos é um esforço válido, mas não é isso que farei em 2018. O que posso
fazer apenas é ajudá-los a ganhar ou perder votos, lembrando grandes temas para
a sociedade, nos quais nem sempre eles se fizeram presentes.
Poucos dos mais votados falaram, por exemplo, de duas
questões muito discutidas no momento: a prisão em segunda instância e a revisão
do foro privilegiado. É compreensível que mantenham uma certa distância.
Abraçar esses temas e ampliá-los com uma perspectiva de combate à corrupção não
é bem visto entre os políticos. Muitos candidatos são discretos nesse ponto
porque não querem perder o apoio dos seus pares, muito menos arriscar-se a um
confronto com o Congresso, em caso de vitória.
Como em todas as eleições, assumir uma linha política nem
sempre representa apenas mais votos. É sempre um jogo de ganha e perde.
A própria esquerda será chamada a se definir, mas hoje, por
uma questão de coerência, ela associa a prisão após segunda instância à
presença de Lula na cadeia. E certamente terá de adotar a posição mais
leniente, que prevê prisão após o trânsito em julgado.
É uma posição defensável, em nome da liberdade individual,
sobretudo se omitir suas terríveis consequências, como a sobrevivência do
sistema de impunidade, que tanto contribuiu para arruinar o País. Seria assim
uma posição ultraliberal, defensável apenas num regime burguês, já que os
regimes de esquerda não conhecem essa história de trânsito em julgado: muitos
deles prendem sem contemplação, até inocentes.
Mas é importante prever um espaço para a esquerda, sobretudo
para o candidato indicado por Lula. Mais da metade dos eleitores de Lula
votariam nele.
Se existe um problema de ganha e perde votos, hoje, esse
problema é o medo nas cidades brasileiras. Bolsonaro adiantou-se alguns meses,
propondo armamento, defendendo a tese de que bom policial é o que mata, e mais
alguns componentes que o aproximam de uma política de tolerância zero com o
crime.
É isso mesmo, ou existe alguma alternativa? Nesse caso, não
vale apenas dizer apenas que é preciso haver empregos, educação e tudo mais. É
necessário mostrar que existem escolhas mais eficazes, apresentar uma política
específica de segurança pública.
O crime organizado é uma realidade nacional. Ele domina as
cadeias e todas as redes de tráfico de drogas no País. Numa cidade como o Rio
de Janeiro, as milícias, por exemplo, controlam territórios onde moram 2
milhões de pessoas.
Tudo isso é um desafio para os candidatos. Eles têm de
mergulhar no tema e dizer alguma coisa – ganhar ou perder votos, isso é do
jogo.
Esse perde e ganha se transporta também para a base. Todos
prometem crescimento econômico. Mas que tipo de crescimento? Vão entulhar as
ruas de carros individuais? Lembrem-se de 2013.
Os candidatos hoje em dia são aconselhados a evitar alguns
temas, escolher apenas o que as pesquisas recomendam. Mas quando alguns temas
dominam a cena e os candidatos são protagonistas distantes, sempre vai haver
pouco voto.
Mesmo sem esquecer que há um segundo turno, o ideal seria
que os candidatos já expressassem grandes correntes. No passado, isso era
canalizado pelos dois grandes partidos. Mas PT e PSDB vivem cada um o seu
inferno com a Lava Jato.
O PT perdeu seu candidato e o PSDB, embora se afaste de
Aécio, não conseguiu dar o passo fora do círculo. Geraldo Alckmin sentiu um
alívio porque o inquérito sobre as doações da Odebrecht foi para a Justiça
Eleitoral. Sua grande vitória: ter-se livrado da Lava Jato.
É um equivoco. Em primeiro lugar, porque fortalece o
discurso de que a Justiça persegue uns e protege outros. Em segundo lugar, se é
inocente e está tudo bem, nada melhor do que ser investigado pela Lava Jato,
que acumula grande capacidade técnica, até para inocentar. Para um candidato à
Presidência, fugir da Lava Jato não é bom esporte neste outono.
Numa corrida em que tudo pode acontecer, a sociedade, que já
se desapontou com os grandes partidos, precisa de salvaguardas. Uma delas é
trazê-los para o debate dos temas que lhe interessam de fato. É sempre possível
argumentar que os políticos têm uma linguagem escorregadia e, além disso, nunca
cumprem exatamente o que prometem.
Mas não se pode pensar em eleições como se fossem as mesmas
sempre. Ainda não é o ideal, mas nunca se teve tanta transparência, nunca se
esteve tão atento aos caminhos da política.
Dizem que os 11 ministros do STF são tão conhecidos como a
seleção nacional de futebol. Não tenho elementos para contestar ou validar. Sei
apenas que muita gente se esforça para escalar aquela muralha de palavras
difíceis, citações, para se aproximar do que realmente interessa: saber qual o
placar do jogo, se há esperanças no combate à corrupção.
Ainda é muito cedo para prever, mas tudo indica que a
indignação não é o único elemento. As pessoas sabem mais do que no passado.
Sabem porque conheceram o declínio do sistema político-partidário e sabem
porque se dotaram de meios técnicos superiores.
Não vai adiantar muito ficar meio escondido no debate, nem
se proteger com um exército de robôs multiplicando fake news. Esta é uma
eleição singular no Brasil, depois de tudo o que vivemos. A grande personagem é
a sociedade que emergiu de todos esses traumas. Sua atuação é imprevisível.
Conheceu a fragilidade humana dos seus líderes e, no mínimo, vai buscar os
melhores mecanismos de controle.
Levado a sério, um programa de governo é um deles.
Artigo publicado no Estadão em 20 de abril de 2018
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