Diante do imenso tsunami que atingiu as últimas eleições,
com um efeito arrastão sem precedentes em favor do presidente eleito, a
diminuição do tamanho dos partidos no Congresso e o aumento da fragmentação
partidária, o diagnóstico dominante era de que o sistema partidário, que já era
frágil, estaria com os dias contados.
Acreditava-se que o sistema partidário, que havia se
vertebrado nas últimas seis eleições gerais (desde 1994) em torno da competição
entre os dois protagonistas, PSDB e PT, estaria institucionalizado. A despeito
do grande número de partidos, o sistema produzia condições de governabilidade
para o presidente de plantão, pois os demais partidos funcionariam como
coadjuvantes ao orbitarem em torno de um desses polos partidários.
A surpreendente vitória de Bolsonaro, pelo até então
inexpressivo PSL, foi interpretada como “disruptiva” desse equilíbrio.
Acreditava-se que sua vitória refletiria uma grave crise de legitimidade do
sistema partidário, com potenciais riscos inclusive para a estabilidade da
democracia. Tão surpreendente quanto foi o resultado eleitoral é a constatação
que o sistema partidário brasileiro não ruiu. Uma análise de todas as votações
que ocorreram na Câmara dos Deputados na nova legislatura deixa claro que os
partidos políticos continuam a apresentar um alto índice de disciplina dentro
do legislativo, seguindo a orientação de seus respectivos líderes.
Dois blocos continuam se polarizando: governo e oposição.
Além de disciplinados, esses blocos são bastante coesos. Os partidos que formam
o Centrão e mais o PSDB apresentam um pouco mais de dispersão, mas também
exibem alta disciplina partidária e um evidente governismo.
Ou seja, embora os partidos já algum tempo se mostrem
ideologicamente amorfos e fracos para os eleitores, o comportamento
disciplinado dos parlamentares revela que os partidos no Congresso não estão
enfraquecidos.
Esse comportamento altamente disciplinado, maior inclusive
do que em governos anteriores, é consistente com as instituições do
presidencialismo multipartidário brasileiro, que não sofreram alterações
substantivas. As regras internas do Congresso e os poderes presidenciais
continuam a tornar o comportamento dos parlamentares extremamente dependente da
lealdade aos seus respectivos partidos, fortalecendo assim estes últimos dentro
do Congresso.
Mas, como as regras eleitorais continuam a proporcionar
incentivos para os políticos se comportarem individualmente, isso fragiliza os
partidos perante o eleitor. Portanto, a chave para o entendimento da
simultaneidade de partidos fracos na arena eleitoral e partidos fortes no
espaço congressual é a combinação aparentemente contraditória de incentivos
para o comportamento individual e partidário ao mesmo tempo.
Após as eleições de 2018, a única mudança substancial foi a
entrada de forma viável e competitiva de um partido de direita no jogo
eleitoral, como acontece em qualquer democracia madura do mundo. A direita no
Brasil sempre foi envergonhada por ter se associado diretamente ao regime
militar. Mas a sucessão de crises econômica e política e a exposição quase que
visceral de escândalos de corrupção comprometeram moralmente a maioria das
legendas tradicionais, criando assim as condições para o surgimento competitivo
de Bolsonaro e do PSL.
Tomando emprestado um conceito do economista austríaco
Joseph Schumpeter, o que estamos testemunhando no Brasil é uma espécie de
destruição criativa de alguns de seus partidos, mas não do seu modus operandi.
Da mesma forma que inovações seriam a força motriz do crescimento econômico
dentro do capitalismo, mesmo quando acarretasse destruição de empresas
tradicionais e/ou bem estabelecidas, partidos políticos podem morrer e outros
podem emergir sem que isso traga maiores consequências para o funcionamento dos
próprios partidos e da democracia.
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