quarta-feira, 28 de agosto de 2019

QUANDO OUÇO CERTAS MÚSICAS

Marco Lacerda, DomTotal
O que acontece com esta cidade, com o Brasil, com o mundo? Olho pela janela num fim de tarde e o que vejo é uma selva de arranha-céus iguais a todos os arranha-céus de qualquer parte do planeta. Um emaranhado de carros congestiona as ruas e avenidas, dirigidos por uma gente que parece não saber de onde veio nem pra onde vai. Uma multidão de zumbis que tenta escapar dessa cacofonia urbana. Trombam uns nos outros, às vezes atropelam e matam pessoas com a atenção sequestrada por pequenos aparelhos em forma de mini-TVs. Falam sozinhos nas calçadas, nos lares, nos bares, nas camas.
Paira no ar a sensação de que vivo no lugar errado. O mundo tornou-se lugar de quem não sente. A condição essencial para tocar a vida em frente é a perda completa da sensibilidade. Já não buscamos o prazer, mas escapar da dor. Tudo vai mal, tudo. Tudo é igual quando eu canto e sou mudo. Vivemos à mercê de homens e mulheres que elegemos para nos representar, mas traem descaradamente o seu compromisso. Ganham os maiores salários do país, benefícios principescos, e mesmo assim atropelam diariamente os sonhos e carências de quem não tem nada.
Basta!  Coragem é a resistência ao medo, é o domínio do medo. Não faz muito tempo, a maior potência militar do mundo deflagrou uma guerra inclemente contra os camponeses de um pequeno país asiático. A juventude da grande potência saiu às ruas e disse Não! à barbárie. Os meninos e meninas da megapotência ganharam como aliados, nos anos 1970, um homem e uma mulher, um casal. John e Yoko trocaram sua mansão por um quarto de hotel em Nova York, de onde passaram a gritar, para quem quisesse ouvir: “A guerra acabou, se você quiser”. O grito foi instantaneamente traduzido para todos os idiomas de um planeta farto da brutalidade daquele blefe que chamavam de guerra contra...contra o que mesmo, meu Deus?
Ficou claro que, de fato, o poder emana das pessoas, do povo. E a guerra acabou. A grande potência militar foi derrotada e humilhada pelos camponeses do Vietnã. Essa história é recente e pode se repetir a qualquer momento, em qualquer parte. O povo está inebriado pelo mundo virtual, mas sonha, deseja e, se preciso for, irá à guerra por um mundo real. Ouço ecos vindos de um futuro próximo. Fora egocêntricos, esquizofrênicos, primas-donas auto-inventadas em redes sociais que acabarão por enredá-las, deixando-as mudas e paralisadas!
Já não sou mais um homem, sou um campo de batalha. Quando ouço certas canções, sinto saudade de coisas que já tive, mas, talvez, nunca mais terei. A saudade faz as coisas pararem no tempo e nos dá tempo de olhar devagar para elas. Esses homens e mulheres que elegemos estão protegidos por uma Constituição, também conhecida como Carta Magna, destinada a organizar a sociedade de forma a impedir que a vida não se transforme em selvageria, desordem, baderna Pois bem, a selvageria, a desordem e a baderna estão instauradas diante dos nossos olhos, orquestradas justamente por esses homens e mulheres que escolhemos para nos defender e representar.
O medo não é capaz de matar o amor nem quando o amor já se tornou um doente terminal e com data para partir. Portanto, basta! Chegou a hora de mudar. A democracia brasileira, assim como a de tantos países, decretou falência. Nossas instituições foram corrompidas, tudo gira em torno do dinheiro, da ambição, do Poder, do egocentrismo, da corrupção.
Um vírus instalou-se em Brasília, onde pulsa o sangue que alimenta as células vitais do Estado e a doença estendeu-se pelo resto do corpo, comprometendo toda a sua estrutura. O Estado sequer quis ir ao “médico” para verificar as pequenas feridas, de tratamento fácil, que surgiram ao longo do tempo. Com essa omissão, as lesões se alastraram e foram impregnando o corpo do Estado em progressão geométrica. Qualquer leigo com meio neurônio em funcionamento consegue perceber que se não fosse feito o tratamento a tempo, essa moléstia poderia comprometer de modo irreversível a vida do Estado.
Foi o que aconteceu e agora, como sempre, está nas nossas mão ditar as regras do jogo que queremos jogar, lembrando, de antemão, que somos um país dividido e sem perspectiva de conciliação em nome do bem comum. A grandeza do ser humano está em sua opção de ser mais forte que a condição humana. Enquanto não conhecemos o inferno, o paraíso não será bom o suficiente. Mais que nunca, vale lembrar o papel de John Lennon e Yoko Ono e aquele grito que ainda ecoa no ar: “A guerra acabou, se você quiser”.
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