No momento em que Lula e Bolsonaro voltam a polarizar a
política nacional, com a mesma tática de radicalizar para marcar territórios e,
a partir deles, avançar sobre o centro como única alternativa viável para
impedir o outro de ocupar a presidência da República, o cientista político
Octávio Amorim Neto, da Fundação Getulio Vargas no Rio aposta, em artigo no
boletim do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), que as táticas políticas de
Lula não têm mais eficácia nos dias de hoje, deixando poucas probabilidades de
êxito.
O motivo mais imediato é o que ele chama de “o fim da
direita envergonhada”. Com a volta dos civis e da democracia a partir de 1985,
analisa Octavio Amorim Neto, a direita continuou a ocupar importantes posições
de poder no Executivo Federal, no Congresso Nacional, no Judiciário, nos governos
e legislaturas estaduais e municipais e no seio da Forças Armadas.
Mas esse poder foi caindo ao longo do tempo, sobretudo a
partir da chegada do PT à Presidência da República em 2003. “Na verdade, entre
1985 e o início da década de 2010, o Brasil teve uma “direita envergonhada”,
que recusava dizer seu nome às claras. Foi nesse ambiente que as táticas de
Lula vicejaram”.
De fato, a direita política nacional, que durante os anos de
predomínio petista se escondeu, envergonhada, com o disfarce de centro, no
máximo centro-direita, revive no Brasil desde a eleição de Jair Bolsonaro, e
também na América do Sul.
Dos 12 países mais importantes da região, seis elegeram
governos de direita, e um, a Bolívia, viu um dos ícones da fase esquerdista da
região, Evo Morales, ser destituído. Outros estão às voltas com graves crises
sociais, como o Chile, o Peru. Bolsonaro perdeu o apoio do governo da
Argentina, que substituiu Macri pela volta de Cristina Kirchner, mas ganhou o
do Uruguai, que foi para a centro-direita depois de anos de governos de
esquerda.
O Brasil, que era talvez o único país do mundo em que não
existiam políticos “de direita”, que defendessem o conservadorismo, agora tem
até mesmo racha entre o PSL, de direita, que serviu de incubadora da
candidatura de Bolsonaro, e o Aliança pelo Brasil, de extrema-direita,
comandado pelo mesmo Bolsonaro.
Voltando a Octavio Amorim Neto, as consequências da soltura
do ex-presidente Lula, graças à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF)
dependerão de como agirá. “Logrará fazer o PT ressurgir nas grandes cidades do
Centro-Oeste, Sudeste e Sul em 2020? Conseguirá levar seu partido novamente ao
segundo turno em 2022?”.
Para o cientista politico, a tática de Lula, de radicalizar
para depois conciliar, tem “baixa probabilidade de sucesso”. Em primeiro lugar,
diz Octavio Amorim Neto, é fundamental registrar que as táticas lulistas deram
certo num contexto de enfraquecimento estrutural da direita. “Quando Lula
emerge como líder sindical no ABC, o regime militar já estava batendo em
retirada”.
Ele vê “o catastrófico segundo mandato de Dilma Rousseff,”
como o início do movimento que levou a direita a ascender politicamente, “a
ponto de um candidato de extrema direita, autoritário e reacionário, Jair
Bolsonaro, vencer o pleito presidencial de 2018”.
Mesmo admitindo que “por conta do caótico governo liderado
pelo ex-capitão do Exército, pode ser que a direita não repita esse feito em
2022”, Octávio Amorim Neto diz que a direita jamais voltará a ser a direita
envergonhada que, “dócil e oportunisticamente, aceitou os acenos de conciliação
de Lula até 2014”.
Ou seja, para ele, “se Lula tentar soprar um novo incêndio
para, depois, oferecer-se como líder dos bombeiros que tentarão apagá-lo”,
citando uma frase de Elio Gaspari que considera definição perfeita da atuação
de Lula, é muito provável que “o fogo se espalhe e faça a vida política
nacional arder em chamas nunca dantes vistas desde 1985”.
Octavio Amorim Neto diz que “se Lula e o PT quiserem ter não
apenas sucesso eleitoral, mas também contribuir para a manutenção do regime
democrático e o renascimento da política, é imperativo que compreendam a nova
quadra histórica em que vive o país e mudem suas táticas”.
Isso significa, necessariamente, “fazer uma autocrítica e
entabular – publicamente – conversas e acordos com o centro político, sobretudo
com o PSDB, o MDB, e o DEM de Rodrigo Maia. Octávio Amorim Neto admite que,
hoje, “tal conselho pode soar como insulto a Lula e à ala radical do PT
comandada por Gleisi Hoffmann. Assim, somente quando os custos das velhas
táticas se tornarem muito claros, as mentes começarão a se concentrar”.
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