O tema do meio ambiente entrou definitivamente na agenda
global. E mais cedo ou mais tarde voltará a ser uma prioridade para o governo
brasileiro, por realismo político e por razões pragmáticas.
Diante das atitudes do atual governo, são crescentes as
ameaças de prejuízo para o setor do agronegócio pela possibilidade de boicote
de consumidores e pela crescente influência da política ambiental sobre as
negociações comerciais. A atuação na defesa dos legítimos interesses do setor
está levando as associações das diferentes áreas e a frente parlamentar da
agropecuária a defender mais atenção aos compromissos internacionais assumidos
pelo Brasil nos acordos assinados desde 1992 e, sobretudo, uma atenuação da
retórica governamental e uma correção de rumo de algumas políticas anunciadas
pelo governo.
As percepções críticas no exterior têm como foco a Amazônia.
Recentemente, as queimadas e o desmatamento foram alvo de manifestações no
mundo todo. Informações distorcidas e meias verdades se misturaram a fatos,
ampliando as consequências negativas para nossos interesses comerciais e
políticos. As diferenças quanto à gestão do Fundo Amazônico puseram em risco a
cooperação internacional com Alemanha e Noruega.
Não estão em questão a soberania e a capacidade do governo
de determinar as políticas para a região. As recentes manifestações no mundo
inteiro, sobretudo de jovens, para sensibilizar os governos a tomar medidas que
evitem as grandes alterações no clima com o aumento da temperatura no planeta,
incluem a preocupação com a preservação da Floresta Amazônica.
No Brasil, nos últimos 50 anos, houve uma política declarada
dos governos para integrar a Amazônia e gerar emprego para a população que
habita a região. Uma das mais relevantes foi a criação da Zona Franca de Manaus
(ZFM), no final dos anos 60. Com subsídios anuais do governo federal que sobem
atualmente a cerca de R$ 25 bilhões, a ZFM nunca se voltou para o maior
potencial da Amazônia: a floresta e a biodiversidade.
Sujeita a muitos questionamentos quanto a seus resultados em
relação à preservação da floresta, ao custo/benefício das isenções e incentivos
fiscais, estão surgindo algumas ideias que merecem ser examinadas. Todas vão na
linha da defesa do interesse brasileiro ao defender a biodiversidade da região.
O Instituto Escolhas, sob a coordenação de Sergio Leitão
(www.escolhas.org), apresentou proposta de uma nova economia para o Amazonas: a
Zona Franca de Manaus e a bioeconomia. A proposta sugere um novo modelo de
desenvolvimento sustentável com estímulos aos investimentos, diversificação das
atividades econômicas e dinamização do parque industrial com o objetivo de
integrar a ZFM com a vocação natural da região à inovação tecnológica e ao uso
da biodiversidade amazônica – a bioeconomia.
Para a preservação da floresta e a interiorização do
desenvolvimento e do consumo, foram definidas algumas diretrizes:
desenvolvimento científico e tecnológico, com foco em inovação; uso do
potencial da biodiversidade de modo sustentável; descentralização econômica e
geração de ganhos sociais e ambientais; dinamização do polo industrial de
Manaus e de seu modelo atual.
Com investimentos públicos e privados de R$ 7,15 bilhões ao
longo de dez anos – oriundos de concessões, parcerias público-privadas e outras
-, a geração de empregos diretos e indiretos no Amazonas poderia chegar a 218
mil vagas. Só durante as obras de infraestrutura seriam gerados 12 mil
empregos.
Não podem mais ser adiadas a discussão sobre uma mudança de
foco nas atuais políticas públicas da ZFM e em todo o Amazonas e a definição de
uma política de estímulos aos investimentos na região com o objetivo de alavancar
o desenvolvimento tecnológico, produtivo, industrial e social com foco em
pesquisa e desenvolvimento tripartite – governo, empresas e academia.
A geração de inovação partiria do uso de matérias-primas
existentes nas diversas regiões do Estado, com ênfase nos insumos de
biodiversidade. Para suscitar exportações e internacionalizar os negócios, as
empresas deveriam estar capacitadas a ser competitivas para garantir a
integração às cadeias globais produtivas de valor.
A análise desses elementos resultou na identificação de
quatro eixos de oportunidades: bioeconomia, polo de economia da transformação
digital, ecoturismo e piscicultura.
Na bioeconomia, o estudo sugere a dinamização do Centro de
Biotecnologia da Amazônia para se transformar num foco de excelência da
floresta. Manaus poderia ser o primeiro hub de pesquisa em bioeconomia,
integrado com os principais centros de pesquisa do mundo, com conhecimento
específico sobre os ecossistemas de florestas tropicais. Poderiam ser
desenvolvidas pesquisas para emprego de madeira tropical em escala industrial
nos sistemas estruturais da construção civil, para emprego dos produtos da
floresta nas indústrias da moda e têxteis, das fibras amazônicas na indústria
automobilística e de plásticos verdes, dos produtos da biodiversidade na
indústria de cosméticos, das plantas e insetos para food tech.
O polo de economia da transformação digital seria
viabilizado pela criação de governança tripartite para estruturar ecossistemas
de inovação em tecnologia, informação e comunicação.
O ecoturismo seria desenvolvido pela identificação de nichos
de interesse para realização de ecoturismo científico.
Na piscicultura, sugere-se a dinamização do Centro de
Biotecnologia da Amazônia com linhas de pesquisa sobre os peixes para seu
emprego em escala industrial em food service e food premium, além do couro do
peixe na indústria da moda.
O Ministério da Economia está estudando um plano para o
desenvolvimento econômico da região com o objetivo de discutir o regime de
incentivos fiscais da União, inclusive no contexto da reforma tributária. A
proposta de associar a ZFM com a biodiversidade da Floresta Amazônica poderia
inicialmente complementar as atividades industriais hoje existentes.
* Presidente do Instituto de Relações Internacionais e
Comércio exterior (IRICE)
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