sábado, 29 de fevereiro de 2020

FAKE DIÁLOGO

Danielle Brant, Folha de S.Paulo
Fica cada vez mais claro, como tem sido praxe no atual governo, que a busca por conciliação com os outros Poderes é fake. Constatar isso é simples: toda vez que há um atrito com Legislativo e Judiciário —o que se tornou regra, não exceção—, os “patriotas” e “conservadores” convocam uma manifestação.
A próxima está marcada para daqui a três domingos e atende a apelo do ministro do GSI, general Augusto Heleno, o “radical ideológico”, como o apelidou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para Heleno, o que o Congresso faz com o governo é chantagem, e não exercício da democracia e aplicação da Constituição.
Nada mais providencial para o governo do que atiçar sua base contra o Legislativo, uma das pedras no sapato de Bolsonaro —a segunda, o STF, também deve ganhar menção honrosa no ato. A tentativa do Executivo de estender pontes aos dois Poderes costuma durar pouco.
Bolsonaro até fingiu se importar com a falta de articulação política no Congresso e mudou algumas peças. Saiu o fiel escudeiro Onyx Lorenzoni (ex-Casa Civil, atual Cidadania) e entrou um amigo, general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Na liderança do governo, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) perdeu o posto para o senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
Não funcionou, como dá para notar pela quantidade de projetos do governo que são alterados ou travados pelo Legislativo. Fica a reflexão: até que ponto Bolsonaro se importa em ter articulação fluida com os congressistas? Muito pouco, parece.
Nesse contexto, as manifestações do dia 15, se não forem um novo fiasco, podem reforçar a decisão do presidente de rejeitar o diálogo com aqueles que não concordam com suas principais bandeiras fora do universo econômico —as pessoas com bom senso, resumindo.
Vale lembrar que um dos panfletos do ato traz a sugestiva frase “os generais aguardam as ordens do povo”. Falta pouco para o anacrônico bloco do AI-5 ser colocado de novo nas ruas.
Danielle Brant
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