Na extensa crônica dos escândalos nacionais, as recorrentes
extravagâncias de autoridades no usufruto de viagens aéreas oficiais
constituem, decerto, episódios menores. Nem por isso, contudo, deixam de ser
sinais eloquentes da mentalidade patrimonialista arraigada entre ocupantes do
poder.
Essa deplorável tradição se viu acrescida, recentemente, de
alguns novos exemplos. No final de janeiro, após participar do Fórum Econômico
Mundial em Davos, na Suíça, o então secretário-executivo da Casa Civil Vicente
Santini viajou à Índia, na ocasião visitada pelo presidente Jair Bolsonaro.
Representando o titular da pasta, Onyx Lorenzoni, que se
encontrava em férias, Santini não titubeou diante das regalias do cargo e
solicitou um avião da Força Aérea Brasileira para levá-lo, ao lado de duas
assessoras, ao país asiático.
Quem
aparentemente não aprovou a mordomia foi Bolsonaro.
Após o caso vir à tona, o chefe do Executivo foi a público anunciar a
destituição do subordinado pelo gesto “inadmissível” e “completamente imoral”,
em suas palavras.
No dia seguinte, porém, diante do apelo dos filhos do
mandatário, Santini
foi readmitido como assessor na mesma Casa Civil de onde havia sido
defenestrado.
Comportando-se como uma biruta de aeroporto insuflada pelo
vento das redes sociais, Bolsonaro logo recuou do recuo. Pressionado, o
presidente em poucas horas dispensou Santini novamente.
Se o presidente se pautasse pela mesma régua para avaliar
todos os seus subalternos, talvez tivesse de levar a cabo uma ampla reforma
ministerial. Conforme mostrou levantamento da Folha, seis ministros se valeram
dos serviços da FAB, em 2019, para viagens no exterior em circunstâncias muito
similares às de Santini.
Bolsonaro, em sua proverbial indignação seletiva, encerrou o
caso dizendo que havia conversado com a sua equipe e que, doravante, o uso dos
aviões diminuiria.
A festa nos céus não ficou restrita aos membros do
Executivo, porém. No início da semana, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre
(DEM-AP), fez
rápida viagem a Macapá, seu reduto eleitoral, também a bordo de avião da
Aeronáutica, levando a mulher, policiais legislativos e a assessora de
imprensa.
Confrontadas, as autoridades escudam-se na lei, que teria sido
observada em tais casos. Esquecem-se, entretanto, de que a legalidade formal
apenas não basta no trato com a coisa pública.
Abusos de privilégios desse tipo afrontam princípios da
administração, como o da moralidade e o da economicidade, e compõem, acima de
tudo, um retrato pouco honroso de descaso com o dinheiro do contribuinte.
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