A escolha do professor Carlos Alberto Decotelli da Silva
para o estratégico e sofrido Ministério da Educação é mais um passo na
metamorfose do presidente Jair Bolsonaro em Jairzinho Paz e Amor. Decotelli é
conservador, sim, e não se poderia esperar algo diferente, mas carrega um belo
currículo, não tem nada a ver com o antecessor Abraham Weintraub e muito menos
é do grupo “olavista”. Logo, já é um avanço. Sua nomeação ocorre com Bolsonaro
acuado, se enfraquecendo na área militar, e esquece manifestações golpistas e
se aproxima de Judiciário e Legislativo, amenizando até a expressão facial e o
tom de voz. Não à toa. São duas investigações contra ele no Supremo, uma contra
Flávio Bolsonaro na Justiça Federal do Rio e outras contra parlamentares,
empresários e militantes bolsonaristas, por fake news e atos golpistas, que se
aproximam do “gabinete do ódio” e dos filhos do presidente.
O vice Hamilton Mourão entrou no radar, Bolsonaro finalmente
concluiu que estava afundando e era hora de nadar e parar de afogar todo o
resto. Essa pausa para reflexão, digamos assim, tem um papel fundamental da ala
militar do governo, que manifestou incômodo com a ignorância e beligerância de
Weintraub e não se dispõe a um abraço de afogados por problemas pessoais de
Bolsonaro e seus filhos.
Tanto a queda de Weintraub quanto a ascensão de Decotelli,
que teve uma fugaz passagem pela Marinha, têm a influência direta da ala
militar, que tem tido contatos com ministros do Supremo e as cúpulas da Câmara
e do Senado. Bolsonaro sempre bate no peito para demonstrar autoridade e já
perguntou: “vou ser um presidente banana?”. Bem, é melhor ser um presidente um
tanto “banana” do que um ex-presidente antes do tempo. De um lado, os militares
mostraram desconforto. Do outro, o tal Olavo de Carvalho extrapolou ao postar
um vídeo, aos palavrões, ameaçando o presidente. Somados, os dois movimentos
reequilibraram o jogo, com a vitória da ala militar sobre a ala ideológica não
só na questão pontual do MEC, mas na estratégia de sobrevivência.
Qualquer equilíbrio, porém, é precário. Bolsonaro atacou
governadores, prefeitos, STF, Câmara e Senado. E também universidades,
professores, alunos, médicos, enfermeiros, ambientalistas, indigenistas,
jornalistas, artistas, intelectuais, militantes dos direitos humanos,
movimentos negros… E a imagem do Brasil no exterior jamais esteve tão
tristemente esgarçada desde os tempos da tortura. Bolsonaro não é vítima e sim
réu nesse desgaste nas relações institucionais, federativas e internacionais. E
é nesse ambiente adverso que tem de enfrentar as ações no Supremo e as
revelações sobre a simbiose entre Flávio, Fabrício Queiroz, Márcia Aguiar,
Capitão Adriano, milícias e o imprevisível Frederick Wassef.
Aliás, por que o general Augusto Heleno, do GSI, implodiu de
vez a versão mal-ajambrada de Bolsonaro para a acusação de interferência na PF?
O presidente dizia que seu alvo não era a PF, mas sim a segurança dele e da
família do Rio, a cargo do GSI, quando, furioso, reclamou: “Eu não vou esperar
foder a minha família toda (…), porque eu não posso trocar alguém (..).” Em
oficio, Heleno responde que não houve “óbices ou obstáculos” para troca
nenhuma. Em um ano e meio de governo, foram três na segurança no Rio.
Assim, o presidente tirou Weintraub, nomeou um nome respeitável para o MEC, reabre o diálogo e faz a alegria do Centrão, mas a crise continua. As investigações se aprofundam e não se tem ideia de como Bolsonaro vai se virar no depoimento ao STF. Sobretudo depois de Heleno, é impossível manter a versão inverossímil. E que outra versão podem inventar? O depoimento de Bolsonaro não será mais mera formalidade. E é um problemão.
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