Jair Bolsonaro é o terceiro chefe de governo mais popular do
mundo nas redes sociais, atrás do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, e
do presidente Donald Trump, segundo levantamento da consultoria Quaest. Se
Bolsonaro se impôs como “influencer”, com dezenas de milhões de seguidores – embora
adversários questionem uso de robôs – a pergunta é: quem influencia Bolsonaro?
Em 2019, na primeira semana do governo, o chefe do Gabinete
de Segurança Institucional (GSI), ministro Augusto Heleno, disse em uma
coletiva de imprensa que o instinto de Bolsonaro havia falhado no trágico dia
do atentado à faca na campanha eleitoral.
“Ele tem um sentimento muito grande de quando pode e quando
não pode, mas um dia esse sentimento falhou”, comentou Heleno. “Com o tempo
passando, talvez podemos ter algum trabalho para contê-lo, porque é da
personalidade dele”, completou o ministro, até então considerado o “guru”
presidencial.
Apesar do sentimento de “quando pode e quando não pode” que
Heleno atribuiu a Bolsonaro, esse instinto de sobrevivência vinha dando sinais
de nova pane nos últimos meses, guiando o presidente rumo ao cadafalso. Se a primeira
falha quase lhe custou a vida, o novo defeito poderia lhe custar o mandato.
Foi o que o presidente ouviu do ampliado grupo de
conselheiros de seu entorno, que há pelo menos três meses insistiam que ele
governasse um tom abaixo. Como Heleno havia advertido, foi trabalhoso conter o
presidente. Uma das primeiras crises que o chefe do GSI teve de contornar foi o
episódio do “golden shower” no Carnaval do ano passado.
O esforço de tutela da ala militar ficou evidente quando
dois dias depois da desastrosa publicação do vídeo obsceno, Bolsonaro apareceu
na estreia das “lives” das quintas-feiras espremido entre dois generais: um
Heleno com o cenho franzido à esquerda, e o porta-voz, Otávio do Rêgo Barros, à
direita.
Naquela época, Heleno, Rêgo Barros e o ex-comandante do
Exército Eduardo Villas Bôas despontavam como conselheiros presidenciais no
campo moderado, em contraponto aos filhos Eduardo e Carlos Bolsonaro, de perfil
combativo.
Um ano depois, em meados de março, Bolsonaro fez os
primeiros movimentos de aproximação do Centrão e inaugurou as conversas ao pé
do ouvido com caciques como Gilberto Kassab (PSD) e Ciro Nogueira (PP). Em
paralelo, a ala militar ganhou o reforço dos generais Walter Braga Netto (Casa
Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo).
Todos tentavam convencer Bolsonaro a suspender as
declarações incendiárias na saída do Alvorada, e a não comparecer às
manifestações antidemocráticas, a fim de arejar a cena política. Mas como
Heleno havia alertado, esse comportamento é da “personalidade dele”.
O discurso da caçamba de uma caminhonete em abril, diante do
Forte-Apache, no Dia do Soldado, selou o início do agravamento da crise. “Nós
não queremos negociar nada (…) é o povo no poder”, bradou a apoiadores, que
portavam faixas pela intervenção militar, AI-5 e fechamento do Congresso e do
Supremo Tribunal Federal (STF).
Desde então, sucederam-se reveses ao governo – o impedimento
da nomeação de Alexandre Ramagem para a direção da Polícia Federal, a
divulgação do vídeo da reunião ministerial, a ação policial no inquérito das
“fake news” -, até que um apelo eloquente de conciliação veio do discurso de
posse do ministro das Comunicações, Fábio Faria, que conclamou um “armistício
patriótico”. Ironicamente, era a véspera da prisão de Fabrício Queiroz.
Vários conselheiros presidenciais reconhecem que a detenção
de Queiroz foi o fator decisivo para que Bolsonaro aceitasse renunciar ao
estilo bélico. Desde a prisão, o Bolsonaro das declarações inflamadas emudeceu.
Sobre o revés, apenas lamentou na “live”: “parecia que prenderam o maior
bandido da face da terra”.
Uma fonte que acompanhou de perto esses desdobramentos diz
que Bolsonaro finalmente assimilou os conselhos porque percebeu que não tinha
força para continuar com todo aquele radicalismo. Foram decisivos para a
mudança de postura o receio de interrupção do mandato e a necessidade de
blindar os filhos. “A preocupação com o futuro dos filhos é maior do que tudo
que você possa imaginar”, ressaltou.
A escalada da crise nos últimos meses fez surgir no entorno
presidencial grupos de conselheiros. Na ala jurídica – certamente a mais
sensível – despontam como os mais ouvidos: o ministro da Secretaria-Geral,
Jorge Oliveira, o presidente do STF, Dias Toffoli, e o ministro do STF Gilmar
Mendes.
Embora o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, tenha
assessorado Toffoli, fontes ligadas a “Jorginho” (como é chamado pelo
presidente) atribuem a ele a aproximação entre Bolsonaro e o presidente do STF.
Durante a transição, o então Subsecretário de Assuntos Jurídicos
(SAJ) do governo Michel Temer, Gustavo do Vale Rocha, e Jorge Oliveira, que ia
assumir o mesmo posto, se aproximaram. Estreitados os laços, Rocha aproximou
Oliveira e Toffoli.
Na esfera política, o grupo mais influente é formado pelo
ministro Fábio Faria, e pelos presidentes de partidos: Kassab, Ciro Nogueira, e
Marcos Pereira, presidente do Republicanos. O presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (DEM-AP), reforça esse núcleo.
O Republicanos de Marcos Pereira abriu as portas para Flávio
e Carlos Bolsonaro, que estavam desconfortáveis em suas legendas, onde não
poderiam esperar pela criação do Aliança pelo Brasil. Flávio deixou o PSL, e
Carlos saiu do PSC do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, desafeto de
Bolsonaro. Na última semana, Pereira ofereceu um jantar de afago a Flávio, que
contou com a presença de Maia e Alcolumbre.
Fontes privilegiadas do meio jurídico afirmam que a relação de Bolsonaro com o futuro presidente do STF, Luiz Fux, não será a mesma construída com Toffoli, que tem estilo conciliador. Fux deverá frequentar menos o Planalto. O passado também vai pesar: Fux era amigo do ex-ministro Gustavo Bebbiano, morto em março de ataque cardíaco, e com quem Bolsonaro rompeu no começo do governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário