A ascensão de Jair Bolsonaro trouxe consigo o inevitável
debate a respeito da identificação dos militares com sua administração.
Cercado por generais da reserva já na campanha e depois
dela, o capitão reformado do Exército sempre se esforçou para sequestrar a
credibilidade das Forças Armadas, construída na redemocratização. A retórica belicosa
e o discurso salvacionista ganham campo à medida que menos insígnias existam no
ombro do militar.
Esses militares da reserva viram sua imagem ser associada à
do governo, e o agravamento da crise política —impulsionado pela reação
negacionista do governo à pandemia e seus efeitos sanitários devastadores—
acentuou preocupações. É necessário, contudo, desmistificar a ideia de adesão e
demarcar diferenças importantes.
De fato, quase todo domingo o presidente brinda o país com a
presença em atos antidemocráticos que pedem atrocidades como o fechamento do
Supremo Tribunal Federal ou do Congresso.
Os três generais com assento no Palácio do Planalto, todos
com quatro estrelas e apenas um deles ainda no serviço ativo, passaram ao
centro do debate político. Todos, por exemplo, tiveram de depor ao Supremo no
inquérito acerca das múltiplas evidências de interferência de Bolsonaro na
Polícia Federal.
Dois deles, Augusto Heleno e Luiz Eduardo Ramos, externaram
publicamente irritação com as recentes decisões da corte, apontando um
imaginário cerco a Bolsonaro.
Outro general da reserva, o ministro Fernando Azevedo, da
Defesa, deixou o comedimento e passou a apoiar queixumes de colegas. Cometeu
ainda o desatino de dividir um helicóptero com Bolsonaro e sobrevoar um ato
golpista.
Nada disso ajuda o país num momento em que manifestações de
rua acabam em conflitos, animando vivandeiras a pedir a intervenção das Forças
Armadas a partir de leituras delirantes do artigo 142 da Constituição, que
regula a manutenção da lei e da ordem.
O antídoto foi identificado pelo presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), em entrevista ao UOL: a permanência da adesão inequívoca
da ativa armada à Carta. Isso é imperativo.
Como ele disse, o fato de haver generais no governo não
implica apoio político dos fardados a qualquer projeto, quanto mais um de cunho
autoritário. Que os reservistas instalados na administração façam proselitismo,
vá lá. Os que estão no exercício da função militar são servidores do Estado, da
ordem e da Constituição.
A população brasileira é majoritária e inequivocamente a favor da democracia, como mostram pesquisas do Datafolha nas duas últimas décadas. As Forças Armadas demonstraram honradez e disciplina nestes 35 anos de democratização e garantiram ao país a travessia por inúmeras crises políticas, sempre com respeito à Carta e à normalidade democrática.
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