Um riso mal
contido, pode ser, talvez envergonhado. Como na extravagância de alguns tombos,
sobretudo os vistos. E é disso mesmo que se trata: cenas patéticas de um tombo,
o deste país.
O Brasil a ameaçar
de represália os grandes países que sustem importações de produtos brasileiros,
em reação à sanha destruidora na Amazônia. Cada grão de soja e grama de carne
que deixem de importar é um rombo na economia bolsonara. E logo quem a propalar
a ameaça, o general Heleno, não propriamente do alto de sua lucidez.
Fiel ao sentimento
de que o cinismo não tem limite, nem para traição à memória de seus ídolos
torturadores e matadores, Bolsonaro a dizer à ONU que “a liberdade é o bem
maior da humanidade”. Depois de atribuir a interesses internacionais na riqueza
da Amazônia uma campanha para “prejudicar o governo e o próprio Brasil”. No que
foi corrigido pelo general Heleno, que, a partir do nível um tanto prejudicado
da sua visão do mundo, identificou outra motivação etérea do mundo: é uma
“campanha internacional para derrubar Bolsonaro”.
Tamanho nonsense
sufoca todo resquício de gravidade que se queira atribuir-lhe, consideradas as
responsabilidades funcionais dos emitentes. O possível é apenas sondar os
traços anedóticos que lhe dão forma e grotesco. E rir.
Acima e abaixo dos
delírios, o problema é que os militares influentes do Exército não
compreenderam que a Amazônia é um amálgama de características de flora e de
fauna, geológicas, climáticas, fluviais e pluviais, todas em mútua dependência.
E que a entrega desse mundo de peculiaridades interligadas à exploração humana
resultará, é inevitável, em que não será mais a Amazônia.
Da mata atlântica,
por exemplo, restam no máximo 16%, em estimativa otimista. Do Nordeste ao Sul,
por toda a costa e por entradas até o interior profundo, o que há são terras
descascadas, depauperadas, ocupadas do modo mais desordenado. Cidades em que
tudo se amontoa com vastidões vazias em torno. Poluição, agravamentos climáticos
—é a realidade que tomou o lugar da mata atlântica. Assim seria com a entrega
da Amazônia à exploração humana: não mais Amazônia.
A “exploração
racional e planejada” é balela. Iniciado o processo, será o mesmo de sempre. Os
aldeamentos logo se transformam em vilas, daí em cidades, a necessidade de
infraestrutura e mais exploração transformam mais áreas, e assim em sucessivas
destruições ambientais. A entrega da Amazônia à exploração industrial terá,
porém, consequências climáticas muito maiores no Brasil todo, e por extensão no
mundo, do que o miserável fim da mata atlântica.
Apesar disso, a
ocupação da Amazônia é uma tese dita estratégica dos militares do Exército.
Ricardo Galvão, cientista e ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais, desmontou o argumento do vice Hamilton Mourão para criação de uma
agência para concentrar todos os monitoramentos da Amazônia. Uma agência sob
controle militar. “Como o norte-americano NRO” é um argumento aqui muito forte.
Mas errado, se de boa ou má-fé, fica por clarear. A verdade é que o NRO está
proibido de atuar no território dos EUA. E o monitoramento por lá é civil.
Mas a agência
militarizada seria apenas a porta-estandarte do Exército. Atrás viria o que
consiste no projeto real: não só o monitoramento, mas o controle absoluto da
Amazônia pelo Exército. Um grande território militar, sonhado como o meio
eficaz de neutralizar a presumida ganância de uma ou de outra potência sobre a
posse da Amazônia. Até décadas recentes, e por muito tempo, o delírio era a guerra
inevitável com a Argentina —motivo até de promoção a general por mérito de
planejamentos, como foi o caso do último algoz de João Goulart, o seu amigo
Amaury Kruel. No mapa, da Argentina para a Amazônia são centímetros possíveis.
Enquanto o nonsense
comanda, o fogo está autorizado a antecipar o serviço.
Paraíso
O Conselho Nacional do
Ministério Público vai decidir se suspende por 90 dias o procurador Diogo
Castor de Mattos, como proposto pelo corregedor Rinaldo Reis Lima.
Ex-integrante do grupo de Deltan Dallagnol em Curitiba, Castor patrocinou
enorme outdoor na cidade com fotos do seu chefe e de Sergio Moro. Falta
disciplinar e, entre nós outros, ética.
Mas não só. Castor o fez com identidade falsa, usando nome de pessoa que nem ao
menos foi informada. No paraíso corporativista, mesmo para tal fraude bastam 90
dias de suspensão. Para os de fora da patota, processo criminal e possibilidade
até de cadeia.
Mais que ironia
A Bolívia tem na América
Latina, como constatado pela ONU, a segunda melhor condição para as mulheres em
direitos políticos e em paridade política com os homens (só o México a supera,
sendo o Brasil o 3º pior). As bolivianas vieram das últimas colocações para o
topo com as conquistas introduzidas, muitas, e outras incentivadas, por Evo Morales
como presidente eleito e legítimo, caso raro na história boliviana.
As mulheres
congressistas foram uma força decisiva no golpe que derrubou Morales. E uma
delas usurpou-lhe a Presidência, que exerce até hoje ilegalmente, com apoio da
OEA e de muitos países latino-americanos. Entre os quais, é claro, o Brasil.
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