Se os militares fossem tão argutos como se julgam, já teriam
percebido que Freud explica. Jair Bolsonaro está tendo a oportunidade de
descontar as humilhações que sofreu em sua medíocre carreira no Exército e se
vingar dos oficiais que um dia bramiram na sua cara por alguma corneta que
tocou errado ou cavalo que deixou de lavar. Na condição de presidente da
República, donde chefe supremo das Forças Armadas, é a sua vez de bramir contra
militares de alta patente, vários na ativa.
A própria militarização que está promovendo no governo
—quase 7.000 milicos infiltrados em entranhas influentes da administração—
serve a esse fim. Com ela, Bolsonaro mostra que pode ser generoso, dando-lhes
confortáveis sinecuras, nomeando-os para funções incompatíveis e
concedendo-lhes benefícios que nega aos servidores civis, mas que também pode
tirar-lhes tudo isso quando quiser. E, para provar, dedica-se a devolver o dedo
na cara apontando-o para os generais “de sua confiança”.
É a tática de Bolsonaro para reduzir seus generais a
recrutas. Insulta-os ou induz seus jagunços a insultá-los. Daí obriga-os a
engolir as ofensas ou arranca-lhes os botões. O primeiro a aprender com quem
estava falando foi o general Santos Cruz, rapidamente expelido. O general
Eduardo Pazuello, ministro da Saúde que não sabia o que era o SUS, é outro que
acaba de cair em si. Na única medida autônoma e sensata que tomou, de apoiar a
compra de vacinas para a imunização dos brasileiros, foi quase fuzilado por
Bolsonaro, que lhe impôs desdizer-se e se acoelhar para não ser demitido.
Há dias, o general Luiz Eduardo Ramos foi dormir com as
orelhas ardendo e ainda se desculpou por ter sido grosseiramente ofendido. E
haverá outros. Os bragas, helenos e mourões que se cuidem.
É o cabeça de papel dando ordens de marcha-soldado a homens
que trocaram o mandar por obedecer —e logo a quem.
*Ruy Castro, jornalista e escritor, autor das biografias de
Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.
Nenhum comentário:
Postar um comentário