“Quais são as propostas concretas que a oposição tem
apresentado?” Esta pergunta feita por vários analistas e operadores políticos
convoca a cidadania a cumprir o seu papel fundamental. Em período de populismo
autoritário a melhor oposição é a luta e o voto pela democracia. Representativa
e consequentemente participativa é a vacina contra o vírus totalitário. E a
Constituição Cidadã de 1988 reforçou o exercício da cidadania quando reconheceu
em seu Artigo 1º o Município um ente federativo da União como os Estados e o
Distrito Federal. Já a Constituição de 1946 da vitória dos Aliados contra o
totalitarismo nos legou o entendimento de que ao município cabia tudo que fosse
do seu peculiar interesse. Como a democracia representativa.
Mas a Constituição Cidadã de 1988 foi mais conclusiva com a
cidadania ao incluir o município como um ente federativo e o seu direito à
auto-organização através de suas Cartas Próprias, a Lei Orgânica Municipal. Se
a Constituição Federal garante o Estado Democrático de Direito a todos os
viventes do País e a Constituição estadual dos federados, a Constituição
Municipal leva os seus princípios passíveis de serem exercidos pela cidadania
em seu habitat natural: o município. Dizia Franco Montoro que as pessoas vivem
no município e é aí que devem exercitar os seus deveres e direitos consagrados
pelas Constituições da União e dos Estados.
As eleições municipais de 15 de novembro e o princípio
republicano de todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido, oferece-nos
uma oportunidade ímpar para trazer a democracia mais próxima do cidadão, o que
é tudo o que o populismo autoritário não quer. Aliás, já chamava a atenção no
artigo “O segundo inverno do governo Bolsonaro”, Pedro S. Malan, ministro da Fazenda
no Governo FHC, no “Estadão” em 14/6/20, “que o Brasil elegerá nada menos que
5.570 prefeitos e cerca de 57.800 vereadores”: “Daí a importância das eleições
municipais desse ano. Seus resultados terão forçosamente influência nas
eleições de 2020.”
E não apenas pelo exercício do direito fundamental de ser
governado numa república democrática por representantes eleitos pelo povo e de
respirar-se agora também no município o ar da democracia em todos os seus
sentidos. É que, como ente federativo, o município deixou de ser uma
circunscrição administrativa e passou a ser um ente político com direito à sua
auto-organização através da Lei Orgânica, a sua Constituição Municipal. É bom
lembrar que o município precedeu a criação do próprio Estado. A Coroa portuguesa
reconheceu a sua importância até na defesa do território colonizado contra as
invasões holandesas e francesas recrutando os soldados. E a Declaração da
Independência e a Proclamação da República foram também legitimadas pelas
Câmaras Municipais.
Assim, a Lei Orgânica do Município é elaborada e promulgada
pelas próprias Câmaras Municipais. Embora já existissem nos municípios do Rio
Grande do Sul e após no Ceará, foi a Constituição Cidadã de 1988 que,
consagrando o direto dos municípios à auto-organização, deu maior abrangência
às Leis Orgânicas, como verdadeiras Constituições Municipais.
No Estado de São Paulo, a Câmara Municipal de São José dos
Campos saiu à frente apresentando, em 1984, a sua Carta Própria com o apoio de
renomados juristas e constitucionalistas como Dalmo de Abreu Dallari, Celso
Antônio Bandeira de Melo, Michel Temer, Geraldo Ataliba, José Guedes, Bernardo
Gomes de Melo, Luís César Amad Costa, baseada no princípio do peculiar
interesse do município. E a Assembleia Legislativa com Proposta de Emenda
Constitucional, mobilizando assim a opinião pública para o final reconhecimento
do Direito à Auto-Organização Municipal pela Assembleia Nacional Constituinte
com a promulgação da Constituição Cidadã de 1988.
As eleições municipais de 2020 celebram também os 30 anos da
elaboração e promulgação das Leis Orgânicas pelas próprias Câmaras Municipais.
E como tal, os candidatos a vereador poderão discutir concretamente o seu
conteúdo com os eleitores e os eleitos promover a sua revisão atualizando este
estatuto constitucional municipal.
As Leis Orgânicas Municipais tratam desde a organização
administrativa do município como também da participação popular, saúde,
educação, meio ambiente, ciência e tecnologia, planejamento municipal (plano
diretor de desenvolvimento integrado), transporte público, desenvolvimento
social e rural, cultura, esporte e lazer. Enfim, de tudo o que diz respeito ao
seu peculiar interesse, fixando princípios, diretrizes e ações.
Portanto, as políticas públicas no âmbito municipal são de
responsabilidade de prefeitos e vereadores dentro de suas competências
legislativas e executivas. E promover o exercício pleno da democracia
representativa e participativa na Lei Orgânica do Município é um ato concreto
de oposição ao populismo autoritário.
*Jornalista, escritor e vereador de 1977 a 1996 em São José
dos Campos-SP
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