Causou justificada apreensão a decisão do Superior Tribunal de Justiça que anulou provas apresentadas por promotores do Rio de Janeiro contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), anunciada na terça-feira (23).
A Quinta Turma do STJ considerou ilegal a quebra de sigilo bancário e fiscal do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, determinada numa investigação sobre desvios em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio.
A maioria do colegiado seguiu a opinião do ministro João Otávio de Noronha, deixando isolado o ministro Felix Fischer, relator do caso de Flávio e das ações da Operação Lava Jato no tribunal.
Na visão de Noronha e dos que o acompanharam, o juiz de primeiro grau que autorizou a devassa nas contas do filho do presidente não fundamentou a decisão adequadamente, limitando-se a endossar as razões dos promotores.
A menção pareceu suficiente a Fischer, combinada com o fato de que o juiz ratificara a medida em despacho mais detalhado depois, mas a maioria da turma concluiu que ele o fizera tarde demais.
Os efeitos da decisão do STJ tendem a ser devastadores para o trabalho dos promotores do Rio, que há dois anos investigam o envolvimento de Flávio com o chamado esquema da rachadinha.
O Ministério Público aponta o filho de Bolsonaro como chefe de uma organização que teria desviado R$ 6 milhões dos cofres da Assembleia Legislativa, apropriando-se de parte dos salários de servidores do seu gabinete.
Graças à quebra do sigilo, surgiram evidências de que o senador movimentou grandes quantias em espécie, usando parte dos recursos para custear despesas pessoais e fazer negócios com imóveis.
Em decorrência da decisão do STJ, podem vir a ser anuladas outras provas obtidas pelos promotores, o que levaria os investigadores de volta à estaca zero e tornaria inviável a reconstrução do caso.
Além do risco de impunidade, a medida preocupa por causa de outras motivações em jogo. Autor da tese que prevaleceu na turma, Noronha tem buscado aproximação com o Planalto e sonha com a vaga que em breve se abrirá no Supremo Tribunal Federal, com a aposentadoria de Marco Aurélio Mello.
Não há dúvida de que compete ao Judiciário zelar para que investigações criminais não incorram em abusos que, infelizmente, contam muitas vezes com o olhar complacente dos magistrados.
Mas o uso dessas garantias como escudo para que o filho de Bolsonaro escape ao rigor da Justiça aponta direção perigosa —e enfraquece barreiras que os tribunais têm erguido para conter os impulsos autoritários do chefe do Executivo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário