São significativas as condicionantes para que o apresentador Luciano Huck entre na disputa de 2022. Huck já acumulou forças no sentido de ter equipe, conhecimento de questões de Estado, estudou o mapa das armadilhas que uma campanha presidencial em si encerra. Sabe que vai apanhar, sabe que precisa aprender a bater.
A decisão de concorrer, contudo, está travada porque coube a Huck a bênção de enfrentar o raro dilema de ter possibilidades interessantes de crescimento abertas nas duas vertentes de sua vida: tanto no mundo do entretenimento quanto no da política. O que quer que aconteça, precisa ocorrer este ano.
Uma das condicionantes para entrar na guerra sucessória é o cenário político. Huck não quer entrar na disputa para dividir o que se convenciona chamar de centro. Se o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), mantiver a disposição de se candidatar e consolidar seu nome na nominata dos candidatos, será calculado o risco de se fragmentar o campo que rechaça simultaneamente o bolsonarismo e o petismo. É bem verdade que o apresentador de TV chega a 11% em algumas pesquisas de intenção de voto e Doria não passa de 4% ou 5%, mas, como disse um velho político baiano em conversa com esta coluna, “pesquisa a dois anos de eleição é como apresentar teste de covid-19 do mês passado para viajar”.
No panorama atual, ainda que Doria seja visto como uma pessoa que acerta na ação, mas erra na forma de apresentá-la, como ficou evidente na questão da vacinação, o diagnóstico é que o governador paulista tem muitos trunfos na mão. Só não será candidato se não quiser. E se a razão para ele não querer ser candidato for a perspectiva de uma reeleição inexorável de Bolsonaro, a Huck também não interessa muito concorrer nessa perspectiva. O empresário é pragmático. Analisa uma candidatura competitiva, não um apostolado.
O que mantém acesa a possibilidade de uma candidatura Huck é o vácuo de representatividade que se abriu no país depois do vendaval da Lava-Jato. A queda das empreiteiras e das campeãs nacionais mudou a relação entre o empresariado e a política. Os políticos de hoje, em geral, clausuraram-se na exploração do Estado para sobreviver. Há os que sofisticam esquemas de rachadinhas, há os que drenam fundos eleitorais, há os que se cacifam com as emendas parlamentares, com o Orçamento loteado.
No meio empresarial, a implosão da interlocução privilegiada entre empresas e meio político gerou uma dispersão. Há um núcleo de dirigentes da velha estrutura empresarial, as confederações e federações, vocacionadas desde sempre para o lobby, que talvez não tenha no mundo real a importância que aparenta ter. O que se chamava no passado de “classes conservadoras”.
Há um meio mais novo, muito ligado ao comércio e à área de serviços, cavador de oportunidades, ativo nas redes sociais para defender o atual governo. Tanto o primeiro grupo como o segundo são pilares do bolsonarismo.
Há um terceiro grupo, que sempre antagonizou com o primeiro, nucleado em centros de estudos, uns vinculados à indústria, outros, que predominam, dos setores de serviço e financeiro, que não estão, nunca estiveram e não estarão com Bolsonaro. É grande a preocupação nesta vertente com a falta de compromisso governamental com educação e meio ambiente. Persiste o temor com as veleidades autoritárias do presidente.
E por fim existe um quarto grupo, ligado a novas tecnologias, inovação, startups, unicórnios, muito ocupado para pensar em política, Huck poderá, quem sabe, representar o terceiro e o quarto grupo.
ACM Neto
2022 não é apenas ano de eleição presidencial. Há o 2022 de cada um, e não é possível entender os movimentos recentes do ex-prefeito de Salvador Antonio Carlos Magalhães Neto sem pensar no quadro baiano e nas idiossincrasias de “Neto”, como é usualmente chamado no Estado.
Segundo um dos mais próximos operadores políticos do avô do ex-prefeito, o velho ACM, Neto sabe que a eleição baiana é muito dependente do quadro nacional. O alinhamento do PP ao bolsonarismo, cada vez mais nítido, afeta o cenário baiano. É um complicador não só para a manutenção da aliança local entre PT e PP, como para a desincompatibilização do governador petista Rui Costa.
O PT exerce na Bahia uma hegemonia de 16 anos com vitórias sempre no primeiro turno. Para 2002 o candidato está posto, é o senador Jaques Wagner. Mas os petistas se ancoram no Estado em estruturas alheias: a do PP do vice-governador João Leão e a do PSD do senador Otto Alencar. A dependência da Bahia do quadro nacional joga contra o PT.
O PSD está com ambições altas em 2022. O presidente da sigla, Gilberto Kassab, estimulou Otto Alencar, cacique baiano do partido, a se posicionar como uma opção para compor chapa presidencial. No que depender da influência de Alencar, distante do bolsonarismo. “Em 2022 provavelmente não estarei na aliança em que estiver o presidente Bolsonaro. Espero que o PSD não faça isso”, afirmou. O peso baiano no PSD não é pouco: um senador, seis deputados federais, nove estaduais e 110 prefeitos.
Se o PSD pode se afastar do PT, o PP certamente o fará, e é desse partido que Neto precisa se aproximar para sua própria viabilização.
Uma vitória de Baleia Rossi na Câmara, representando a antecipação de uma aliança PSDB/MDB/DEM para 2022 não traria dividendos para Neto, porque não abriria oportunidades de se obter vantagens com as contradições da aliança petista no Estado.
Bolsonaro é impopular em Salvador. O ex-prefeito da capital precisa manter próximo de si o bolsonarismo, já que sem o PP ele não tem capilaridade para a campanha, mas não tão próximo a ponto de se comprometer com um político com rejeição tão alta em seu reduto político.
A eventual ida do deputado federal João Roma (Republicanos-BA) para a pasta da Cidadania seria providencial. Embora de outra sigla, Roma é ligadíssimo a Neto. O ex-prefeito teria o bônus de ter um aliado no Planalto sem o ônus de amarrar-se. De quebra fortalece sua união com o partido da Universal.
Até aí é cálculo. A idiossincrasia entra no hábito de Neto surpreender aliados. Ele não gosta de ir para o sacrifício. Em 2018, chocou seus apoiadores quando desistiu na última hora de disputar o governo estadual. Seu abandono a Rodrigo Maia, na semana passada, despertou a lembrança do episódio de dois anos atrás em muitos de seus interlocutores na Bahia.
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