O centrão mal entrou no ônibus e já quer sentar na janelinha, assumir o volante e se apossar do bagageiro. Recém-instalado no comando da Câmara, o bloco não está disposto a aceitar migalhas. Vai cobrar caro pelo apoio que prometeu ao governo.
Ontem a turma começou a mostrar a que veio. O deputado Ricardo Barros, um dos principais escudeiros de Arthur Lira, ameaçou “enquadrar” o almirante Antonio Barra Torres, presidente da Anvisa. Esbravejou contra as exigências para o registro da vacina Sputnik V, de origem russa. “Estão achando que eu sou trouxa?”, desafiou, em entrevista ao “Estadão”.
A pressa de Barros não parece ser motivada pelo avanço do vírus. A Sputnik V será produzida no Brasil pelo laboratório União Química, ligado a políticos do centrão. Um dos diretores da empresa é o ex-deputado Rogério Rosso, que disputou a presidência da Câmara em 2016. Ele era o candidato de Eduardo Cunha, que festejou a vitória de Lira na segunda-feira.
Em outra frente, o centrão jogou na fritura a deputada Bia Kicis, porta-voz da ala mais radical do bolsonarismo. O novo chefão da Câmara havia prometido a Bolsonaro que ela assumiria a Comissão de Constituição e Justiça. Ontem seus aliados começaram a sabotar o acordo.
Investigada no inquérito das fake news, Kicis poderia usar o cargo para ajudar o Planalto a conspirar contra a democracia. No entanto, Lira tem preocupações mais urgentes. Quer evitar conflito com os ministros do Supremo, onde é réu por corrupção e organização criminosa.
As cotoveladas em Torres e Kicis anunciam uma fase mais agressiva na disputa por poder em Brasília. Na semana passada, Bolsonaro declarou que poderia recriar três ministérios para acomodar os novos parceiros. Ontem Barros debochou da oferta. “Quem está correndo atrás de ministério da Cultura, do Esporte e da Pesca?”, questionou.
O centrão não vai se contentar com cargos decorativos. Exigirá pastas de alto orçamento e com potencial para turbinar candidatos em 2022, como Saúde, Cidadania e Desenvolvimento Regional.
Na primeira metade do governo, Bolsonaro suou para mediar crises entre militares e olavistas. Em pouco tempo, essas disputas deverão ser lembradas com saudade no Planalto. Agora o capitão terá que lidar com profissionais.
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