Devastado pela baderna fiscal promovida pelo presidente Jair Bolsonaro e por seus aliados, o Tesouro Nacional ainda tem de pagar ao mercado o custo da insegurança causada pela gastança eleitoreira e por aberrações como o orçamento secreto. Financiar as contas públicas ficou tão caro quanto no fim do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, quando sinais de enorme desarranjo financeiro já eram visíveis. Para vender papéis de 40 anos atrelados ao IPCA, o Ministério da Economia teve de se comprometer, nesta semana, com uma taxa real de 6,17% ao ano. O custo estava em 4,76% no início do mandato, em janeiro de 2019, e chegou perto de 3% quando foi aprovada a reforma da Previdência. Ruim para o Tesouro, a desconfiança do mercado é desastrosa para a economia e para a maior parte dos brasileiros, principalmente para os mais pobres.
Fora dos padrões internacionais, a dívida pública brasileira, incluídos os três níveis de governo, é próxima de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados de Brasília, e tende a crescer, em termos proporcionais, nos próximos anos. Na maior parte das economias de renda média, o endividamento do governo geral é bem menor e raramente equivale a 60% do PIB. Além de muito endividado, principalmente em nível federal, o setor público do Brasil paga juros elevados e seus padrões de gestão têm sido, com frequência, alarmantes para o mercado.
Sinais de alerta se repetem, agora, com a manobra do presidente Jair Bolsonaro, apoiado pelo Centrão, para distribuir bondades eleitorais e novamente pôr em risco o teto de gastos. O risco foi percebido dentro e fora do País e o alarme já disparou em todo o mercado.
O Brasil afrouxa a política fiscal com a aproximação das eleições de outubro, registrou na terça-feira o boletim do Instituto de Finanças Internacionais editado em Washington e divulgado para todo o mundo. Depois de cortar impostos sobre energia, como se fez em muitos países, o governo brasileiro passou a pressionar por um pacote de gastos emergenciais, assinalou o boletim, apontando o risco de mais uma violação do teto de gastos. Os cortes de impostos e as novas despesas podem equivaler a 1,2% do PIB, “uma cifra nada desprezível para um país em posição fiscal frágil”, segundo o informe.
O aumento da receita pública pode atenuar o efeito dessas medidas em 2022, mas o próximo governo, acrescenta o boletim, poderá ter dificuldade, em 2023, para corrigir o afrouxamento e retomar a observância do teto de gastos. No cenário mais provável, continua a análise, o presidente, seja Bolsonaro ou Lula, mudará de novo o teto como parte da política orçamentária e isso mais uma vez incomodará o mercado.
O presidente Bolsonaro e seus aliados podem pensar e agir como se os efeitos de seus atos ficassem circunscritos a um joguinho político. Muitos podem até conceber esse joguinho como limitado a uma dimensão paroquial, suficiente para garantir a reeleição e os dividendos da participação no esquema brasiliense.
O chefe de governo deve pensar, por necessidade, num eleitorado maior. Sua percepção do papel e das obrigações presidenciais, no entanto, deve ser, como indica o balanço de seu mandato, pouco mais ampla do que foi durante sua longa carreira como deputado irrelevante. Mas o Brasil, apesar de tudo, ainda é uma grande economia, um mercado respeitável e com enorme potencial. As ações de suas autoridades ainda valem a atenção de quem acompanha as condições econômicas e políticas nos mercados com alguma importância.
O presidente pode ter dificuldade para perceber o alcance de suas palavras e manobras. Mas as consequências aparecem nos custos do Tesouro, na redução do dinheiro disponível para funções de governo, na degradação das condições sociais, na inflação acelerada, no dólar supervalorizado e nos juros sufocantes para os negócios e para a gestão pública. Talvez um pouco menos sufocantes, é preciso admitir, para uma gestão ineficiente, sem plano e desvalorizada por quem negligencia ou simplesmente ignora o sentido de governar.
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