sábado, 15 de outubro de 2022

CONSEQUÊNCIAS FUNESTAS

Hélio Schwartsman, Folha de S.Paulo

Postura anticientífica de Bolsonaro vai do risível ao trágico

Ir contra a ciência ajuda a impulsionar posts nas redes sociais. Quando um autor se permite ignorar os ditames do mundo real, ele pode propor soluções simples (e erradas) para problemas complexos, o que é garantia de sucesso entre os pouco familiarizados com as questões. Jair Bolsonaro e seus asseclas gostam de ir contra a ciência ou, pelo menos, de ignorá-la.

O resultado é às vezes apenas risível. Diverti-me a valer com a ideia da campanha de Bolsonaro de criar um "seguro antifraude" estimulando microdoações de R$ 1 de eleitores. Se o presidente recebesse menos votos que o valor das doações, estaria comprovada a manipulação nas urnas. A tese tem mais furos que um queijo suíço, mas o legal é que o pessoal da campanha não considerou que, ao menos inicialmente, o custo de contabilizar cada pagamento superava o valor arrecadado.

Outras vezes, fica difícil determinar os limites entre má-fé e ignorância. É o caso do projeto de lei que criminaliza pesquisas eleitorais. A peça é tão inepta que não consegue esconder os absurdos que encerra. Para ser aplicável, a norma exigiria do eleitor que não mudasse mais seu voto nos 15 dias anteriores ao pleito.

Há ainda situações bem mais trágicas, em que o anticientificismo cobra seu preço em vidas. Vemos isso quando Bolsonaro reformula as prioridades da Polícia Rodoviária Federal, que reduz a vigilância sobre as estradas para perseguir bandidos. O resultado foram mais mortes nas rodovias e mais abusos policiais.

Nada, porém, supera o desempenho criminoso do governo na pandemia. Aqui, o negacionismo foi de A a Z. Bolsonaro boicotou as vacinas, sabotou o distanciamento social, promoveu drogas ineficazes e atacou até as máscaras. Ironicamente, a mortífera pregação presidencial provocou mais vítimas entre seus apoiadores que entre opositores. Se a Covid tivesse a letalidade de uma varíola, ele teria assegurado sua derrota eleitoral.

Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Bookmark and Share

Nenhum comentário:

Postar um comentário