O desânimo bolsonarista, o voto dos homens e um recado de 2018
SÃO PAULO Na eleição de 2018, Jair Bolsonaro, ora no PL, venceu Fernando Haddad (PT) por 55,1% a 44,9% dos votos válidos do segundo turno. A pesquisa Datafolha da véspera da votação daquele ano dava 55,7% dos votos para Bolsonaro e 44,3% para Haddad.
"Se a eleição fosse hoje", quais seriam as diferenças importantes entre o Datafolha desta semana e o da véspera da votação de 2018? A divergência de voto de maior relevo e até agora menos notada é a dos homens. A mudança das escolhas de quem fez até o ensino médio, dos moradores do Sudeste e, claro, dos mais pobres importa também.
Antes de continuar: não, a pesquisa divulgada nesta sexta-feira NÃO É UM PROGNÓSTICO do que vai acontecer na véspera do segundo turno deste ano ou na urna. Trata-se aqui apenas de indicar diferenças notáveis entre a pesquisa do voto à beira do segundo turno de 2018 e as intenções de voto desta semana.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem agora 9 pontos a mais do que a votação de Haddad na véspera do segundo turno de 2018.
Claro que as maiores diferenças de voto a favor do petista tendem a acontecer entre as maiores categorias de eleitores da amostra do Datafolha: católicos, famílias com renda declarada inferior a dois salários mínimos, aqueles que fizeram o ensino médio, os do Sudeste e, óbvio, mulheres e homens.
Mas o aumento proporcional de votos do PT (Lula ante Haddad) também foi dos maiores entre homens, eleitores com ensino médio e no Sudeste (tomados os cuidados com margens de erro etc.). A votação entre os evangélicos não se alterou. Entre os católicos, sim, pró-Lula, com peso relevante.
Lula por ora empata jogos importantes em que o PT perdia feio em 2018, entre homens e eleitores com ensino médio, ou quase empata, como no Sudeste. Aumenta muito a vantagem entre os mais pobres. Isso quer dizer que boa parte dos "arrependidos" está nesses conjuntos de eleitores. O voto feminino e nordestino tem peso decisivo, mas não veio daí o grosso da virada petista.
Esses dados enfraquecem um pouco a tese de que o bolsonarismo avança também por causa da revolta de homens contra mulheres que tomam cada vez mais conta da própria vida, mas não a invalidam. Também não indicam uma nova onda antipetista de votos evangélicos. Entre esses eleitores, Bolsonaro de fato vence por larga margem, 68% a 32%, no entanto quase a mesma diferença do resultado da pesquisa de véspera de 2018 (69% a 31% de Haddad).
Deixando 2018 de lado, a pesquisa dá um outro sinal de desânimo entre bolsonaristas. O Datafolha perguntou se os eleitores acreditam que sua vida vai melhorar, piorar ou ficar na mesma em caso de vitória de Lula ou de Bolsonaro.
No eleitorado em geral, 41% acreditam que sua vida vai melhorar sob Lula; sob Bolsonaro, 27%. Entre os eleitores de Lula, 79% acham que sua vida vai melhorar caso seu candidato vença; entre os eleitores de Bolsonaro, 58%. Parece que os bolsonaristas estão menos animados.
Mas há uma armadilha óbvia na leitura desses números. O eleitor de oposição quer mudança, desculpe-se o comentário acaciano. O eleitor do incumbente, do atual governante, acredita que, em certa medida, a situação já está boa. No país inteiro, 38% consideram o governo Bolsonaro "ótimo/bom". Entre o eleitorado bolsonarista, o governo é "ótimo/bom" para 80%.
Ainda assim, mesmo com tanta nota "ótimo/bom", a impressão de desânimo permanece. Por que apenas 58% dos bolsonaristas acreditam em melhora de vida adicional? Estão assim tão satisfeitos? Por que 39% acham que sua vida vai ficar na mesma?
A maioria do eleitorado por ora diz que quer mudança; quem não quer tem expectativas um tanto reduzidas.
Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).
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