Comparo o momento com a pior circunstancia para um cronista esportivo: escrever na véspera de um jogo decisivo de Copa do Mundo. Todos os colegas do esporte já passaram por isso. No dia seguinte ninguém quer saber de nada além do jogo, a resenha é obrigatória, é a crônica da morte anunciada de uma crônica.
Agora a hora é parecida, mas mais preocupante. Na quarta feira à noite o cronista, e ninguém, sabe o que estará acontecendo no Brasil na sexta de manhã. Sob os olhos do mundo vivemos a bizarra contestação das eleições nas estradas com bandos que se insurgem contra a vontade da maioria da população brasileira, numa espécie de simulacro tosco de “resistencia civil” estimulada pelo perdedor, como um Trump de araque. A barbárie quer se impor à civilização no grito, com uma minoria organizada de caminhoneiros certamente financiados pelos interessados na desordem.
Na segunda feira comecei a escrever uma crônica sobre a celebração da vitória e a pacificação do país. Começava assim:
“No fim do pesadelo e inicio da concórdia, é grande a tentação de tripudiar sobre quem vilipendiou nossos sonhos e ameaçou nossas instituições com a força bruta da ignorância e da ambição, com quem desrespeitou nossas mulheres, nossos mortos, tentou destruir nossa cultura e nossa liberdade. O grito preso e o desabafo viraram milhões de memes e piadas que fizeram o Brasil gargalhar com a derrota de Bolsonaro. O ridículo fere mais do que ofensas e xingamentos.”
Mas o pesadelo continua nas ruas e nas estradas, usurpando os símbolos nacionais e clamando por golpe de Estado e ditadura militar, enquanto se comemora a volta da ciência, da arte e da cultura, da linguagem civilizada, do respeito às minorias, ao meio ambiente, às instituições democráticas e ao Estado de Direito, da Terra voltar a ser redonda. A Alvorada nasce no Palácio das Trevas.
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