Bolsonaro manda cada vez menos no Planalto: nem café quente lhe é servido
Com derrota para Lula, Bolsonaro enfrenta esvaziamento do Planalto e riscos judiciais, da prisão à inelegibilidade, e reconstrói planos para futuro político. Crítico à “mamata”, usará dinheiro do fundo público do PL para permanecer em Brasília
Novo governo
Setenta e duas horas após a eleição de Lula, Jair Bolsonaro expressou a seus apoiadores, pela primeira vez, como se sente sobre a derrota. “Estou tão chateado e triste quanto vocês”, disse, ao pedir a extremistas o desbloqueio de rodovias, sem condenar o perfil antidemocrático dos protestos. Antes da gravação, o presidente havia demonstrado a consternação apenas a aliados, enquanto resistia, entre conversas no Planalto e no Alvorada, a reconhecer o resultado das urnas. Tamanha indignação, o capitão chegou a criticar o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o vice-presidente Hamilton Mourão, por abrirem ao PT as portas para a transição. Colocou-se de pé apenas depois de ouvir que o bolsonarismo não morreu e ao receber apoio para traçar o próprio futuro político.
Bolsonaro planeja aceitar um cargo na Executiva Nacional do PL e permanecer em Brasília, perto dos filhos, Flávio e Eduardo, que liderarão a oposição a Lula no Congresso. Sob as asas do partido, contará com um poderoso staff de advogados, custeado por dinheiro público. O time será um alívio, porque, sem foro privilegiado, o capitão enfrentará na Justiça comum uma série de processos, que vão da suspeita de interferência na Polícia Federal à negligência na pandemia. Um dos mais sensíveis elenca transações financeiras suspeitas feitas no gabinete do presidente, como depósitos fracionados e saques em dinheiro, para o pagamento, por um ajudante de ordens, de contas do clã Bolsonaro e também de pessoas próximas da primeira-dama.
O medo de ser preso
Além disso, Bolsonaro deve permanecer na mira de Alexandre de Moraes, que manterá abertos os inquéritos que visam ataques a ministros do STF e a atuação de uma milícia digital contra a democracia. Na Justiça Eleitoral, o presidente vai responder a ações por abuso de poder pelo uso da máquina pública para financiar seu projeto de reeleição, com a liberação de parcelas extras de benefícios para taxistas e caminhoneiros e a transformação do Alvorada em palco para a contestação do sistema eleitoral diante de embaixadores, por exemplo. Entre a seara criminal e a eleitoral, Bolsonaro enfrenta um mar de possibilidades, que vão da prisão à inelegibilidade por oito anos.
São preocupações para o fim do mandato. Até 31 de dezembro, Bolsonaro, como conta a mitologia de Brasília, será servido com café frio diante da redução de seu cacife político. Enquanto vê Lula aplaudido por lideranças mundiais e alçado a estrela em eventos internacionais, o presidente, que conteve a própria sanha golpista de olho em 2026, lidará com uma agenda esvaziada. Não terá paz nem para transitar no Planalto — na quinta-feira, enquanto Ciro Nogueira recebia Geraldo Alckmin, Aloizio Mercadante e Gleisi Hoffmann, por exemplo, Bolsonaro, sem compromissos oficiais, tratou de não pisar o pé em seu gabinete. Direita, volver, capitão.
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