Cerimônia destaca símbolos do novo governo, mas ainda não dá pistas sobre a solução dos dilemas
A posse de um presidente é o cartão de visitas do governo que se inicia – e nesse quesito, não existe imagem mais emblemática do que Lula subindo a rampa com representantes da diversidade do povo brasileiro.
A imagem é potente, mas representa um ideal. Para os resultados do dia-a-dia, as pistas que interessam estão nos discursos de Lula no Congresso Nacional e no parlatório. E aí é importante observar tanto o que que foi dito quanto o que não foi.
A primeira mensagem desses discursos, à qual Lula deu tintas fortes, foi a reedição da antiga ideia da "herança maldita" – as "terríveis ruínas" que o petista afirma ter recebido de Jair Bolsonaro, e sobre as quais ele terá de reconstruir o país.
Lula afirma que não o fará à base de revanchismo, mas bateu pesado no "genocídio" promovido por Bolsonaro na epidemia de Covid, no mercado financeiro - em nome de quem, segundo ele, as estatais foram "rapinadas"-, e nos mecanismos de difusão de fake news que caracterizaram o governo Bolsonaro.
E disse que "quem errou responderá por seus erros, com direito amplo de defesa, dentro do devido processo legal".
Ao elencar suas prioridades de governo, reforçou o que já se sabia – desde a promessa de dar aumento real ao salário mínimo até retomar programas sociais, incluindo a reinauguração de uma política ambiental moderna e inserida na nova lógica global.
Até aí, não havia dúvidas.
O que faltava responder, porém, permanece indefinido. Como, por exemplo, como Lula vai lidar a dicotomia entre a defesa de uma reindustrialização para o Brasil, com a revitalização da indústria naval e o aumento da produção nacional de combustíveis fósseis, e o que ele mesmo diz que fará, incentivando a inovação com tecnologia e sustentabilidade, a cooperação público-privada, e os "financiamentos com custos adequados".
Persiste, também, a dúvida sobre como o presidente pretende conciliar a professada responsabilidade fiscal com a licença para gastar conseguida no Congresso.
Sobre isso, Lula não falou, muito possivelmente porque não tem a resposta. Tanto que, nos dias antes de subir a rampa, seu entorno se digladiou entre a proposta de Fernando Haddad de acabar com o desconto de impostos para os combustíveis e a ideia de prorrogá-los, defendida pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
Desta vez, Gleisi e a realpolitik venceram a parada. Mas não dá para apostar, desde já, quem ganhará as próximas. A única certeza é que esses embates serão frequentes num governo tão diverso e com desafios tão complexos. E seu resultado fará a diferença entre o sucesso e o fracasso do terceiro mandato de Lula.
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