quarta-feira, 31 de maio de 2023

DESCALABROS PERDOADOS PELA PEC DA ANISTIA ENVERGONHAM CLASSE POLÍTICA

Editorial O Globo

Deputados e senadores insistem em levar adiante proposta que anula as sanções impostas pela Justiça Eleitoral

Descalabros dos partidos políticos nos últimos anos estão mais perto de ser chancelados pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que perdoa todo tipo de farra das legendas com o dinheiro do contribuinte. A PEC da Anistia avança no Congresso depois de ter sido aprovada por ampla maioria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Uma análise do GLOBO em processos de prestação de contas à Justiça Eleitoral mostra que tipo de inconsistência será perdoada se o texto passar em plenário.

A extravagância mais bizarra foi o reembolso de R$ 61 mil do então PSL (hoje parte do União Brasil) a um político que abasteceu o mesmo carro com gasolina e diesel. O caso aconteceu em 2018, mas faz parte das análises mais recentes (o TSE leva em média cinco anos para julgar as contas dos partidos). Também em 2018, o Democracia Cristã (DC) declarou ter gastado R$ 64 mil com combustível, sem comprovar que a despesa tinha ligação com a atividade partidária, como determina a lei. O abastecimento foi feito no posto que tem como sócio o presidente do partido, José Maria Eymael. O DC disse ao GLOBO que o posto pratica preços de mercado e negou vantagem escusa. Não havia outro posto para abastecer que não o do democrata-cristão Eymael?

Noutro caso sob investigação do Ministério Público Eleitoral, o DEM declarou ter gastado quase R$ 1 milhão fretando aviões. Alegou que foram despesas da campanha de Rodrigo Maia à presidência da Câmara. O valor chamou a atenção por ser maior que o pago em 2022 pelos presidenciáveis Soraya Thronicke (R$ 875 mil) e Ciro Gomes (R$ 822 mil) com aluguel de aeronaves.

Situação também comum é usar o dinheiro público em despesas que nada têm a ver com a atividade partidária. O PROS (incorporado posteriormente ao Solidariedade) foi condenado a devolver R$ 134 mil usados na compra de 3,7 toneladas de carne para churrasco. De tão escandaloso o episódio, os parlamentares cogitam vetar a anistia para casos assim. Outras irregularidades graves acaso seriam toleráveis?

A miríade de incongruências revela a urgência de moralizar os gastos dos partidos com dinheiro do contribuinte. Lamentavelmente os parlamentares — de quase todas as legendas e correntes ideológicas — seguem apoiando a maior anistia da História recente aos malfeitos partidários. Além das fraudes e pedaladas nas prestações de contas, ela abrange descumprimento das cotas para mulheres e negros nas eleições. As multas, nos casos comprovados de mau uso das verbas dos fundos eleitoral e partidário, têm efeito pedagógico para coibir práticas nefastas. O “liberou geral” promovido pela oportunista PEC da Anistia é, ao contrário, um incentivo para que os recursos públicos destinados com fartura aos partidos escorram pelo ralo.

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