Programas de espionagem só deveriam operar sob supervisão de órgãos de controle
Se há um trabalho que a tecnologia facilitou, é o de araponga. Vivemos numa era em que a privacidade, se não morreu, anda mal das pernas. E não dá para culpar só a multiplicação das câmeras de vigilância e a compulsiva coleta de dados pelas big techs. Grande parte das informações pessoais disponíveis "in silica" são postadas voluntariamente por seus próprios titulares em redes sociais.
Bisbilhotar a vida dos outros se tornou uma atividade tão trivial que a maior parte das informações que serviços de inteligência costumam reunir já aparece em fontes abertas ou semiabertas. Num exemplo concreto, não era necessário quebrar sigilos nem tomar outras medidas invasivas para saber o que os vândalos/golpistas de 8 de janeiro tramavam. Eles próprios escancararam seus planos nas redes sociais —e vários serviços de inteligência captaram a encrenca. Um pouco por sabotagem dos militares, um pouco por falhas na interpretação das informações, as autoridades não se preparam adequadamente.
Haverá, é claro, situações em que os serviços de segurança precisarão de medidas mais invasivas. É igualmente claro, porém, que, pela legislação brasileira, elas só podem ser tomadas com a autorização de um juiz. E isso nos leva aos softwares. Hoje, Abin, Exército, polícias, praticamente todo mundo vai a Israel adquirir um programa espião. Não vejo problemas maiores na compra, mas muitos na utilização.
Meu ponto é que, dado que as medidas invasivas não podem ser tomadas sem autorização judicial, esses softwares deveriam estar sob controle compartilhado da Justiça ou dos Ministérios Públicos. Nenhuma agência ou polícia deveria poder acioná-los sem gerar um registro que possa a qualquer instante ser acessado por um órgão de controle, que saberia sempre qual agente monitora qual suspeito e se a operação está dentro da lei.
Não é garantia de que não haveria mais abusos, mas violar a lei seria mais trabalhoso. Já é um começo.
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