Quem acredita que a opinião de Haddad tem importância, quando Lula diz que deficit zero não é necessário?
A tentativa de aparentar entrosamento entre o que disse o presidente Lula sobre a desnecessidade de zerar o déficit fiscal e a meta que persegue o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, só piorou a situação, com consequências óbvias no mercado financeiro. Muita ingenuidade do ministro ao tentar desviar do assunto na apresentação de novos diretores do Banco Central. Era evidente que o interesse geral seria saber como andava a relação dele com o presidente.
O máximo que Haddad conseguiu dizer é que sua meta estava mantida: déficit zero. Mas, se Lula acha desnecessário, quem acredita que a opinião de Haddad tem importância? Lula diz que é a “ganância do mercado” que fixa a necessidade de zerar o déficit, mas demonstra ignorância ao dizer isso. O mercado financeiro é essencialmente, acreditam os economistas liberais, um instrumento democrático como transmissor das expectativas da opinião pública. Nem mesmo o capitalismo de Estado da China, que não se pode classificar de país democrático como entendemos aqui no Ocidente, prescinde do mercado financeiro. Por pragmatismo.
Lula começou seu governo disposto a restaurar a imagem do Brasil no exterior e a recriar programas sociais de antigos governos petistas. Obteve sucesso na empreitada, embora a maioria dos brasileiros, segundo pesquisas de opinião, considere que ele dá demasiada importância ao resto do mundo e deveria se dedicar mais ao país que preside.
Concordo apenas em parte, porque considero que o Brasil precisava voltar ao convívio global civilizado e mostrar-se um país relevante no cenário internacional. Mesmo que essa relevância seja relativa, e não absoluta, como quer Lula. Para que o Brasil seja relevante internacionalmente, não basta apenas a presença de Lula, que já foi considerado “o cara” por Obama, mas isso quando a imagem do operário que virou presidente da República ainda deslumbrava o mundo.
É preciso que o Brasil demonstre responsabilidade fiscal, que tenha um governo que combata a corrupção, que tenha uma visão holística do desenvolvimento social, que englobe também economia e meio ambiente. Se abrir mão do equilíbrio para tentar acelerar o desenvolvimento, acabará produzindo inflação, não bem-estar.
Vinte anos depois, Lula já não é o mesmo, nem sua imagem a mesma. Continua um animal político nato, mas já sem a agilidade na fala e nos gestos. No currículo leva controvérsias e pendências que somente os fanáticos não querem ver. Livrou-se das acusações de corrupção por manobras jurídicas, não por provas, e mesmo os desvios de conduta apontados contra seus acusadores de Curitiba não apagam as denúncias e as confissões obtidas pela Operação Lava-Jato. Nem os bilhões devolvidos deixam dúvidas sobre o que aconteceu.
Sua relação com o Congresso, que anteriormente manobrava apenas com o verbo e a verba, hoje lhe custa mais caro, porque os parlamentares ganharam poderes nos últimos anos, e o relacionamento entre Executivo e Legislativo mudou de patamar. Da mesma maneira que mudaram as relações de poder entre Supremo e Congresso. A democracia brasileira hoje é outra, também o Supremo subiu de patamar, enquanto o Executivo vai tendo de se adaptar a um jogo mais equilibrado.
O Brasil já foi um hiperpresidencialismo, hoje é um simulacro de parlamentarismo, e essas distorções dificultam a governabilidade. Lula já não tem os instrumentos necessários para enfrentar um presidente da Câmara como Arthur Lira, que não tem limites nem pudores exagerados, não teme enfrentar os demais Poderes para colocar o Congresso como peça fundamental no jogo de disputa de espaço no tabuleiro político. “Verba é poder” parece ser seu lema. Como todos os Poderes da nossa combalida República têm interesses próprios, que se colocam, não raramente, acima do interesse coletivo, fica impossível saber o rumo que o país tomará.
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