Censo revela envelhecimento do país, que começará a perder bônus demográfico
"Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, no meu coração" animava o país, em 1970, a famosa canção ufanista de Miguel Gustavo Martins, quando a seleção se consagraria campeã mundial de futebol, pela terceira vez, no México.
Naquele ano, em meio ao chamado "milagre econômico", o PIB cresceria 10,4%, sustentado pelo grande endividamento externo na ditadura militar (1964-1985) e a migração acelerada do campo para as cidades. O país era também consideravelmente mais jovem.
Dados do Censo de 2022 divulgados na semana passada, contudo, revelam, meio século depois, um Brasil que envelhece rápido, impondo desafios cada vez maiores para o aumento do bem estar em um contexto de crescimento econômico persistentemente baixo.
Se, entre 1970 e 2022, a população aumentou pouco mais de 2,2 vezes, de 90 milhões para 203,1 milhões, os brasileiros com 65 anos ou mais saltaram 7,5 vezes, de 2,95 milhões para 22,2 milhões. Os acima de 80 anos decuplicaram, passando de 451 mil para 4,6 milhões.
Na contramão, o total de crianças e pré-adolescentes (0 a 14 anos) despencou de 42% para 19,8%. E aqueles no miolo da estratificação, onde concentram-se os que têm idade para trabalhar (15 a 64 anos), são agora 69,3%, ante 54,7% em 1970 —e 68,5% no Censo de 2010.
Para o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, professor por duas décadas na Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, os últimos 50 anos têm sido o "período dourado" do bônus demográfico. Mas 2022 parece marcar o auge das condições favoráveis ao Brasil.
Tudo indica que, a partir de agora, essa janela de oportunidade comece a se fechar, com o aumento da chamada razão de dependência.
O termo refere-se à quantidade de menores de 14 anos e maiores de 65 que existem para cada pessoa em idade ativa, entre 15 e 64 anos. A regra serve para analisar a carga para sustentar indivíduos que não estão trabalhando e que, portanto, dependem dos ativos.
Com a perspectiva de diminuição do total de trabalhadores como proporção de idosos, o desafio que se coloca é aumentar a produtividade dos que estão no mercado, para que gerem mais riqueza.
Neste quesito, infelizmente, o Brasil apresenta resultados decepcionantes, sobretudo pelo fato de quase 40% da força de trabalho ser informal, setor em que os empregos são bem menos produtivos.
Na raiz do problema está, mais uma vez, a persistente crise fiscal brasileira e os juros elevados pagos pelo setor público, que inibem investimentos produtivos e a criação de mais vagas formais. A janela do bônus demográfico que se fecha é mais um alerta para que o problema seja resolvido o quanto antes.
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