Hoje Marçal
assusta o eleitor moderado como Bolsonaro também o fazia antes de se eleger,
mas é ofensiva estratégia para herdar seu eleitorado
O bolsonarismo
arrumou uma encrenca com o ato de 7 de Setembro. A ideia era se valer da força
da direita na eleição paulistana e da última grande efeméride antes da disputa
pelas mesas diretoras para bombar duas pautas que passam pelo Congresso: a
anistia pelo golpismo do 8/1 e o impeachment do ministro Alexandre de Moraes.
Findou passando
recibo para a concorrência de Pablo Marçal. O candidato do PRTB não se limitou
a transformar a Avenida Paulista no laboratório de sua preferência no
eleitorado bolsonarista. Saiu ovacionado ao se evidenciar como herdeiro de Jair
Bolsonaro num ato convocado para pressionar pela devolução dos direitos
políticos do ex-presidente. Não foi por 2024, mas por 2026 que se puseram em
conflito.
Marçal
joga - e confunde - em todas as posições. Quando foi barrado no palanque e
subiu na grade para pedir pela volta de Bolsonaro, já havia uma bandeira
estendida na avenida, onde se lia: “Bolsonaro parou. Marçal começou. Pablo
Marçal presidente do Brasil”. Ao mesmo tempo se valia de uma passagem bíblica
para dizer a um seguidor no Instagram que torce pela volta de Bolsonaro, como
Davi espera o reinado de Saul chegar ao fim.
A história, moldada
para o público evangélico - Marçal tem 29% deste eleitor x 27% de Nunes
(Datafolha) - fala de um líder de origem militar, Saul, que perdeu a humildade
e levou Deus a preferir o jovem temente e obediente Davi. Com sua capacidade de
contar lorotas, Marçal ainda há de encaixar nessa história sua recusa em
criticar Moraes.
Quando se recusa a
embarcar no “fora Xandão”, Marçal mostra que Bolsonaro tem uma pauta que
arrisca envelhecer da mesma maneira que a do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva contra a Lava-Jato. Lula teve que escanteá-la para falar de futuro e
voltar ao poder. Bolsonaro está impedido de fazê-lo pela inelegibilidade e, ao
contrário de Lula, se vê acossado por um herdeiro que já virou a página.
Não importa que hoje
Marçal assuste o eleitor moderado. O importante é roubar a bandeira do
bolsonarismo e depois se consolidar como líder de seu campo político. O eleitor
moderado que aderiu a Bolsonaro em 2018 o fez a despeito das ameaças de morte
ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do histórico de indisciplina militar
e das exibições de misoginia, homofobia e preconceito racial. A metade do
eleitorado nacional que confirmou a opção por Bolsonaro em 2022 o fez
acrescentando a ficha corrida de sua passagem pela Presidência.
A rota de Marçal
para se transformar na liderança deste campo passa por assumir o papel de
malvado favorito da extrema-direita, ante um Bolsonaro com sobrepeso e
adoentado cuja agenda de liderança partidária mais o aproxima do Centrão do que
de um nome antissistema.
Bolsonaro esperava
manter os pés nas duas canoas, de Marçal e Nunes, na esperança de um segundo
turno de direita puro-sangue sem o candidato do Psol, Guilherme Boulos. Por
isso, convidou Marçal ao ato.
Foi quando viu a
Paulista lotada de bonés e bandeiras com a letra “M”, o delírio provocado na
multidão pela passagem do candidato do PRTB e a bandeira anunciando-o como
sucessor que resolveu partir pra cima chamando-o de “traidor”.
Marçal empoçou nas
pesquisas mas divide um triplo empate na liderança da disputa paulistana. Não
tem tempo de TV e vê a estratégia que montou para os debates se esgotar. Como
não colou bem a recusa em discutir plano de governo, armou uma viagem a El
Salvador de onde promete um “documentário” sobre a solução para a segurança
pública que passa pela prisão sem mandado judicial.
O candidato do PRTB
foi capaz de levar um hesitante Tarcísio de Freitas a mergulhar de vez na
campanha de Nunes. Em qualquer corrida de táxi de 15 minutos o paulistano se
deparará pelo menos uma vez com o comercial de Nunes que convida o ouvinte a
buscar no Google o “áudio Marçal Polícia Federal”.
Bolsonaro hoje
depende desta dupla para barrar Marçal e da bancada do PL para pressionar por
anistia e impeachment. Os deputados presentes ao ato da Paulista bradaram pela
anistia, a começar pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o mais colérico
deles, mas a bancada de senadores foi tímida. Apenas cinco, dos 31 que se dizem
pelo impeachment de Moraes, compareceram.
Se os parlamentares
gozam da simpatia do ecossistema bolsonarista o mesmo não pode ser dito sobre o
prefeito e o governador. Nunes chegou e saiu do ato sem ser percebido e Freitas
fez um discurso institucional, de defesa do governo Bolsonaro, sem uma única
menção a Moraes ou ao STF. Caiu em desgraça com os órgãos de comunicação mais
simpáticos à causa. “Ele não é de direita, devia se filiar ao PSDB”, disse um
comentarista.
Esses canais exibem
o dilema do bolsonarismo. Aderem à anistia porque têm colaboradores foragidos
mas não escondem o entusiasmo com Marçal e o cansaço com Bolsonaro. Um jornalista
da “Gazeta do Povo”, um dos organizadores do ato, foi chamado por Bolsonaro de
“picareta” porque o volume do seu carro de som estaria atrapalhando os
discursos. Seus colegas se revoltaram quando o ex-presidente, em vez de pedir
que baixassem o som, mandou o governador acionar a Polícia Militar. Um
comentarista resumiu: “Se a manifestação é contra o autoritarismo de Alexandre
de Moraes como é que ele faz uma coisa autoritária dessas? Bolsonaro quer o
monopólio da perseguição”.
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