A esquerda não encontra espaço para operar seu modelo
sindicalista e se transforma em agente conservador
O professor Cristovam Buarque vinha ensaiando a crítica
maior que apareceu, por completo, no seu artigo De
farol a retrovisor, publicado no Correio Braziliense no último
dia 23. O ilustre professor, ex-governador do DF, faz profunda crítica às
esquerdas de maneira geral e ao PT, em particular. Ele que foi ministro da
Educação do presidente Lula, duas vezes senador, era um petista raiz até votar
a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Jamais foi perdoado.
Independentemente de questões pessoais, a crítica à esquerda é uma realidade
que se impõe pela verdade dos fatos.
Os jornais descobriram, nos últimos dias,
que o Brasil tem mais de 100 empresas públicas. Todas penduradas no Orçamento
da República. O prejuízo que juntas vão apresentar neste ano é da ordem de R$
3,3 bilhões. Elas estão na área de informática, no agronegócio, na área
militar, entre outros setores. O maior prejuízo é da Empresa Gerencial de
Projetos Navais (Emgepron), comandada pelo pessoal da Marinha de Guerra. A
Empresa de Correios e Telégrafos já foi superavitária. Agora, opera no
prejuízo. Emgea, empresa de planejamento financeiro; Infraero, que foi
substituída pela NAV, que agora criou a Alada para administrar a base
aeroespacial de Alcântara, no Maranhão, que nunca lançou nem balão de São João.
Ainda há a Dataprev que cuida das pessoas que precisam da Previdência Social e
permanecem naquela fila de dois anos de espera.
Isso é o retrato da administração petista, que precisa de
empresas estatais para colocar seus filiados, tenham eles ou não competência
para dirigir as empresas. O resultado é desastroso. Deficits monumentais quando
o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, do PT, trabalha para aumentar a
arrecadação e reduzir os gastos de governo. Quem mais critica o ministro é a
alta direção do PT contrária a qualquer tipo de redução de gastos. A porção
mais desenvolvida no Brasil, que depende menos do governo, percebe essa situação.
O agronegócio, por exemplo, trabalha com padrões equivalentes às melhores
práticas internacionais. Da porteira para dentro, tudo corre muito bem e atende
às rigorosas exigências internacionais. O país é um dos maiores exportadores de
alimentos para o mundo. No entanto, as estradas são esburacadas, as ferrovias
não chegam e os portos funcionam devagar porque estão aprisionados por questões
políticas. São dois países que coabitam o mesmo espaço.
Um cálculo simples indica que a venda de boa parte das
empresas estatais significaria acabar com o prejuízo e fazer algum dinheiro com
a venda dos ativos. Um bom exemplo é a Embraer, criada pelos militares da
Aeronáutica para fazer um avião de integração nacional, o Bandeirante. Mas, a
partir desse estágio, o grupo não tinha a expertise necessária para entrar no
mercado internacional de produção e venda de aviões. A empresa foi privatizada
e, hoje, é a terceira maior do mundo. Perde para a Boeing, que está em
dificuldades, e para o consórcio europeu Airbus. Crescimento espetacular e uma
presença constante no mercado internacional em todo o planeta. É uma lição
óbvia do melhor caminho para as empresas públicas. Outro belo exemplo de
sucesso é o da antiga Vale do Rio Doce, hoje Vale, que foi privatizada e está
entre as maiores do mundo. O presidente Lula tentou colocar pessoa de sua
confiança na diretoria da empresa. Não conseguiu.
Isso ocorre no território da economia tradicional. Hoje, a
nova economia, que vai dominando o atual cenário, trabalha com outras
coordenadas. As pessoas trabalham em casa, embora estejam operando no exterior.
Recebem em moeda forte e não querem saber de sindicato regulando aquela
atividade. A inteligência artificial modifica as relações. Pessoas trabalham
aqui em empresas estrangeiras, e estrangeiros que trabalham fora do país em
empresas nacionais. Há estudantes fazendo pós-graduação em universidades europeias
sem sair do país. Assistem às aulas pelo computador. Cada vez mais, a vida
transcorre pelo computador e pelo telefone celular. O atendimento pessoal
passou a ser algo secundário. Nesse cenário, a esquerda perdeu sua
oportunidade. Ela não encontra espaço para operar seu modelo sindicalista nesse
ambiente e se transforma em agente conservador.
Esse fenômeno se apresenta no resultado
das eleições municipais. O Partido dos Trabalhadores perdeu até mesmo nos
seus redutos tradicionais em torno da cidade de São Paulo. Uma derrota
significativa, que vai dificultar a possível candidatura de Lula a seu quarto
mandato, quando terá 81 anos. Antes disso, os últimos dois anos deste atual
mandato serão especialmente difíceis, porque seu partido é minoritário no
Congresso e os partidos de oposição vão dominar a maioria dos 5.500 municípios
brasileiros. A esquerda precisa abrir os olhos de ver. O mundo mudou muito desde
que a União Soviética deixou de existir. E o muro de Berlim caiu.
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