Escrevo logo após o encerramento do segundo turno das
eleições de 2024. Ainda que de forma esquemática, convém observar, desde já, no
tocante a essas eleições:
O grau considerável de abstenções, votos nulos e em branco
nas grandes capitais, sobretudo no primeiro turno, atingindo a ordem de 40%;
em cidades importantes - e podemos citar Rio de Janeiro,
Belo Horizonte, Belém, Recife, Porto Alegre e, também, São Paulo - onde a
polarização lulismo × bolsonarismo não aconteceu, houve vitórias do Campo
Democrático;
Inversamente, onde essa polarização lulismo × bolsonarismo
se deu, o lulismo foi derrotado, a exemplo de Cuiabá e Natal. A única exceção
foi Fortaleza.
Importante observar ainda que em Goiânia,
João Pessoa e Manaus o campo conservador se dividiu, e, nas três cidades, os
candidatos do bolsonarismo foram derrotados. Bolsonaro já não monopoliza esse
campo. Eis o que provavelmente tem que ver com a manutenção da inelegibilidade
do ex-presidente e/ou até mesmo com uma eventual prisão sua.
Finalmente,
O peso da máquina administrativa foi tão real quanto
as próprias alianças eleitorais e convém destacar que prefeitos se reelegeram
em cidades importantes como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
No geral, o cenário apresenta muitas incertezas. Bolsonaro
poderá se candidatar ou permanecerá inelegível? As urnas de 2024 parecem,
ademais, apontar para um novo fator, qual seja, o surgimento de candidaturas
potenciais no terreno do próprio bolsonarismo, ou da direita de corte mais
tradicional, conforme já sugerido acima. Do lado da atual situação, a realidade
tampouco é estimulante: o lulismo está em declínio, e isso tem tanto que ver
com a não-renovação das lideranças no campo do PT quanto com os magros
resultados desse terceiro governo Lula.
Naturalmente, as eleições de 2026 não terão as mesmas
características daquelas de 2024. Mas 2024 revela algumas tendências. A questão
das alianças corretas é uma delas. Outra, a necessidade de o país se armar, em
2026, de um projeto de nação, consubstanciado no Plano de Metas de JK, nas
Reformas de Base no período Jango, na Frente Ampla que elegeu Tancredo, no
Plano Real de Itamar.
O Campo Democrático está perplexo, senão desorientado, e o
caminho pode ser novamente a união de forças formada em torno de uma
candidatura como a de Eduardo Campos em 2014. "Este é um país que escolhe
entre o pior e o menos mau", li em um livro do grande educador Cristovam
Buarque, intitulado Jogados ao mar". Um personagem da obra - um belo
romance - se expressava assim. Até quando? É exatamente com isso que precisamos
romper.
Na pauta, questões como as mutações que se verificam no
mundo do trabalho, com o alastramento do trabalho por conta própria e o
surgimento de inovações tecnológicas como as materializadas na robótica e no
recurso à inteligência artificial. Isso, sem aludir à necessária extensão da
Democracia a todos os setores da vida, à defesa intransigente da Ética, da
Justiça Social e ao estabelecimento de um programa voltado para a preservação
do meio ambiente, com a consequente redefinição da questão agrária. No mesmo plano,
precisamos colocar os problemas relativos à Educação e à Cultura, tão ligados à
identidade brasileira. O baixíssimo investimento de recursos públicos tem
estrangulado a infraestrutura do país, cada vez mais ultrapassada.
São esses os nós que precisamos desatar. Não existe luta à
parte, tudo é parte da luta, uma vez que as demandas todas se cruzam. Há,
portanto, um imenso espaço político para ser trabalhado até 2026, a meu juízo.
O primeiro passo nesse sentido pode ser dado pela criação de
uma Federação integrada por partidos progressistas do Campo Democrático.
É preciso refundar a nação
* Ivan Alves Filho, historiador.
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