Zeina Latif, O Globo
Haveria má vontade
da Faria Lima com o governo Lula?
O dólar está
novamente na casa de R$ 5,70 e os juros de mercado estão acima de 12,5% aa,
mesmo nos vencimentos de longo prazo. Ambos os movimentos têm sido mais
intensos no Brasil do que em países emergentes parecidos, e na contramão da
elevação da nota de crédito do país pela Moody´s. Diferentemente da agência de
classificação de risco, a percepção dos agentes ou players de mercado é de
aumento do risco fiscal.
Será essa
deterioração dos preços de ativos excessiva? Haveria má vontade da Faria Lima
com o governo Lula?
A melhora da nota
de crédito está, em grande medida, associada aos bons números da economia,
sendo o comportamento do PIB uma variável-chave para a avaliação de risco
fiscal. Isso porque países mais prósperos têm maior capacidade de honrar seus
compromissos com credores.
E,
mais concretamente, as métricas fiscais (resultado primário e dívida pública)
calculadas como proporção do PIB são favorecidas pelas revisões para cima das
estimativas de crescimento – agora em 3%, ante 1,5% no final de 2023.
Talvez tenha
havido, porém, alguma precipitação da agência de risco. Para começar, o
desempenho do PIB tem algum artificialismo, refletindo os próprios estímulos
governamentais.
Mais importante,
tem havido retrocessos no regime fiscal, no sentido de as regras que ditam o
orçamento não serem compatíveis com o objetivo de estabilização da dívida
pública.
Enquanto isso, os
muitos ruídos produzidos pelo governo alimentam a desconfiança de que não há
intenção e tampouco capacidade política para conter o crescimento dos gastos,
dentro e fora do Orçamento. Cresce o medo de repetição do governo Dilma, com
excessos fiscais e truques contábeis para camuflá-los.
Há ainda temores de
baixo compromisso do próximo presidente do BC com a meta de inflação de 3%. A
volta do aperto monetário não convenceu o mercado, e as expectativas de
inflação continuam a piorar, estando acima da meta, mesmo para o longo prazo.
Apesar da defesa da política monetária feita por Gabriel Galípolo, a gestão
ainda é de Campos Neto.
Para responder a
pergunta sobre haver ou não pessimismo exagerado no mercado, meu colega
Cristiano Souza e eu estimamos alguns modelos para explicar a inclinação da
curva de juros (diferença entre a taxa de 1 ano e a taxa Selic), utilizando
como variáveis explicativas: a expectativa de inflação (12 meses à frente), o
risco-país (Credit Default Swap), a taxa de juros nos EUA (nível ou diferença
entre a taxa de 3 anos e a fed fund rate) e o desempenho da política fiscal (projeções
do mercado para a evolução do estoque da dívida pública).
A conclusão é que
há sim exagero, medido pela diferença entre a precificação atual de alta de
juros e as previsões dos modelos. A taxa de juros futura de 1 ano deveria estar
entre 10,4% e 11,1% (significa que o ciclo de alta da Selic seria revertido em
1 ano), e não nos 12,5% atuais.
Esse fenômeno,
porém, é menos atípico do que se imagina.
Antes de avançar,
vale lembrar que a elevada volatilidade dos preços de ativos, com exageros na
alta e na baixa, é inerente ao funcionamento dos mercados. Há imperfeições de
mercado que alimentam mudanças bruscas de posição dos players diante de uma
nova informação.
Com elevadas
incertezas, ir contra expectativas ou posições majoritárias (ir contra a manada)
pode ser muito arriscado. Perder dinheiro sozinho por uma oposta que se revela
equivocada no futuro é pior do que perder dinheiro junto com a maioria.
A pressão na curva
de juros se manifestou mais recentemente, nos últimos meses. Fosse simplesmente
má vontade com o governo, não teríamos observado seu comportamento benigno ou
dentro do esperado antes do estresse recente.
Além disso, a
magnitude do atual desvio é comparável a outras situações, como em 2021, em
resposta aos excessos fiscais da pandemia, os furos no teto de gastos e o
represamento do pagamento de precatórios.
Quanto à taxa de
câmbio, o descolamento em relação ao estimado pelos modelos de previsão também
é relevante, sendo que a cotação do dólar deveria estar mais próxima de R$5,10.
Mais uma vez, não é novidade esse descompasso, sendo até menor do que o
observado em 2020/21.
O risco de um
período prolongado de tensão nos mercados está aí e precisa ser aplacado, para
não prejudicar o investimento e o dinamismo da economia.
Convém o governo estancar as fontes de incerteza.
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