Conservadores e liberais, que fizeram a maioria dos novos eleitos, pretendem um governo democrático moderno. Nesta eleição, os extremos foram derrotados pelo centro
Eleições costumam resultar em surpresas às vezes dolorosas. Winston Churchill, primeiro-ministro inglês que comandou a Inglaterra e liderou o mundo ocidental na Segunda Guerra Mundial, foi derrotado nas eleições de seu país logo após a rendição alemã. Foi excepcional líder na guerra, mas o eleitor inglês entendeu que era hora de mudar e de reconstruir os países em momento de paz. Ele perdeu. Nessa última eleição brasileira, ocorreu algo semelhante. O povo quis mudar e fez surgir nova geração de políticos conectados ao século 21, os melhores exemplos são Tabata Amaral e João Campos, dois jovens de esquerda.
Aconteceu uma mudança geracional. No Congresso, não há mais parlamentares que tenham sido constituintes. O último que está em Brasília é o presidente Lula. Na época da Constituinte, nenhum político teria coragem de se declarar de direita. No máximo, centro-direita. Ser de direita significava, na época, apoiar o governo militar, que acabara de ser retirado do poder. Ninguém queria mostrar uma face velha República. Era um momento para ser esquecido. O tempo passou, a economia brasileira mudou, o agronegócio prosperou, a música sertaneja fez sucesso e apareceu uma onda de direita. O capitão Bolsonaro, rude, grosseiro, pouco instruído, que teve vida profissional conflitiva com o Exército, aproveitou a oportunidade. Ele é paraquedista e sabe se jogar no vazio. Deu certo.
A eleição de 2024 mostrou que o Partido dos Trabalhadores (PT) está encolhendo como entidade sindical. Está se transformando em partido parlamentar. Teve reduzido crescimento no seu número de prefeitos. Passou de 182 eleitos em 2020 para 248 no pleito deste ano. Não venceu em nenhuma capital em primeiro turno. Alguma coisa poderá mudar no segundo turno. Mas ocorreu queda de prestígio no berço político do partido: São Paulo. Petistas perderam em redutos tradicionais, como São Bernardo do Campo, domicílio eleitoral do presidente Lula. O candidato do partido, Luiz Fernando Teixeira, não alcançou o segundo turno apesar do empenho dos ministros Luiz Marinho (Trabalho) e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), que tiraram férias para atuar na campanha. Luiz Fernando ficou em terceiro lugar, com 23,1% dos votos. Ele é irmão do ministro do Desenvolvimento Agrário.
Outra surpresa ocorreu em Araraquara, onde a popularidade do prefeito, Edinho Silva, não foi suficiente para fazer de Eliana Honain sua sucessora. Na cidade, o bolsonarista Dr. Lapena (PL) derrotou a petista por 49,15% a 45,16%. Araraquara não tem segundo turno. A derrota pode abalar o favoritismo de Edinho Silva para ocupar o lugar de Gleisi Hoffmann na presidência do partido. Em Guarulhos, o deputado federal Alencar Santana, vice-líder do governo Lula na Câmara, não obteve 10% dos votos. O PT também teve derrotas em Osasco e em São Carlos. A Executiva do PT divulgou nota ressaltando a política de alianças, com as vitórias de João Campos (PSB), no Recife, e Eduardo Paes (PSD), no Rio, como prova de tática bem-sucedida. A chegada de Guilherme Boulos (PSOL) ao segundo turno em São Paulo também é mencionada. Antes, o PT jamais negociava o cabeça de chapa na eleição. Agora, aceita ser parceiro.
O PSD, de Gilberto Kassab, elegeu 887 prefeitos. O velho MDB conseguiu vencer em 856 prefeituras. E o PP, em 752. Esses são os nomes vencedores. A eleição de prefeitos não tem efeito direto na eleição presidencial. Demonstra, porém, os partidos mais influentes. Isso aponta, naturalmente, para Tarcísio Freitas, governador de São Paulo, em eventual candidatura à Presidência. Vários governadores de centro-direita com prazer comporiam a chapa na Vice-Presidência. Na esquerda, só há, para concorrer, o nome de Lula, que terá 81 anos no momento da eleição. A idade poderá pesar. Na ausência dele, o único nome viável é de Fernando Haddad, ministro da Fazenda, que teve o cuidado de visitar seu líder mais de 70 vezes na prisão de Curitiba.
Haverá a pressão para que Bolsonaro se candidate à Presidência da República. Ele está inelegível. Será necessário que o Supremo Tribunal Federal (STF) o transforme em elegível, o que poderá ocorrer, na esteira de eventual anistia para os condenados pelos atos de janeiro de 2023. Bolsonaro é o representante da extrema-direita, dos belicosos, dos militares linha-dura que tentaram impor uma ditadura ao país. Conservadores e liberais, que fizeram a maioria dos novos eleitos, pretendem um governo democrático moderno, contemporâneo, com redução do Estado e abertura econômica para o mundo. Nesta eleição, os extremos foram derrotados pelo centro. Essa é a novidade.
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