segunda-feira, 11 de novembro de 2024

A FAVELA NO MAPA

Preto Zezé, O Globo

Comunidades serão referenciadas por dados oficiais, que servirão para subsidiar governos e empresas no planejamento

O significado do Censo das Favelas, lançado na sexta-feira passada, traz vários desdobramentos importantes para reflexão. Neste artigo, trago alguns e deixo para um segundo texto a análise de dados, que exige uma abordagem à parte.

O primeiro e mais expressivo desdobramento tem a ver com a adoção do termo “favela” e “comunidades urbanas” pelo IBGE, que anteriormente as chamava de “aglomerados subnormais”.

Nomear um lugar como “aglomerado subnormal” não apenas o identifica negativamente, como reforça e reproduz preconceitos e estigmas aos mais de 16 milhões que vivem em favelas no Brasil. Além disso, a mudança da nomenclatura atende à reivindicação histórica dos movimentos e organizações de favelas pela valorização da identidade desses espaços.

O Censo só foi possível graças à parceria do IBGE com a sociedade civil, por meio da colaboração com o DataFavela e a Cufa, que lançaram em 2023 — com o Ministério do Planejamento e Orçamento e a presença da ministra Simone Tebet — o movimento Favela no Mapa, em Heliópolis. A iniciativa possibilitou a realização da pesquisa e o acesso aos territórios.

No evento de lançamento, Marcio Pochmann, presidente do IBGE, ressaltou a relevância do Censo para construir um diagnóstico mais preciso sobre as condições de vida nas favelas. Destacou também que, ao tornar essas comunidades visíveis nos dados oficiais, o IBGE não apenas produz estatísticas, mas contribui para a formulação de políticas públicas mais assertivas, baseadas em evidências.

O IBGE agora classifica como favelas e comunidades urbanas as regiões onde os domicílios apresentam graus diferenciados de insegurança jurídica da posse; que manifestem precariedade na oferta de serviços públicos; que tenham predominância de edificações, arruamento e infraestrutura feitos pela própria comunidade, com parâmetros diferentes dos definidos pelos órgãos públicos; ou que estejam localizados em espaços com restrição à ocupação, como áreas de risco ou rodovias e ferrovias, linhas de transmissão de energia e áreas protegidas, entre outras.

Outra questão importante — para quem defende políticas públicas consistentes, que sejam de Estado, e não de governos ou conveniências eleitorais — é que, a partir de agora, as favelas serão referenciadas por dados oficiais, que servirão para subsidiar governos e empresas no planejamento de ofertas, serviços e intervenções. Ao poder público, cabe orientar e a balizar projetos e políticas públicas por meio de dados estatísticos e geográficos para a implementar ações de toda ordem.

O próximo passo será restaurar a imagem do IBGE nas favelas, fortalecendo sua atuação junto ao poder público e defendendo sua expansão. Esses dados não são apenas números; expressam as condições de vida e moradia, bem como as necessidades sociais dessas populações.

Os dados do IBGE funcionam como faróis, iluminando possíveis caminhos para novos repertórios que visem a reduzir desigualdades e a gerar impacto real na vida das pessoas. Mais que de números, estamos falando de vidas, já que as pesquisas e os dados resultam em ações diretas no cotidiano de milhões.

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