Comunidades serão referenciadas por dados oficiais, que
servirão para subsidiar governos e empresas no planejamento
O significado do Censo das Favelas, lançado na sexta-feira
passada, traz vários desdobramentos importantes para reflexão. Neste artigo,
trago alguns e deixo para um segundo texto a análise de dados, que exige uma
abordagem à parte.
O primeiro e mais expressivo desdobramento tem a ver com a
adoção do termo “favela” e “comunidades urbanas” pelo IBGE, que anteriormente
as chamava de “aglomerados subnormais”.
Nomear um lugar como “aglomerado subnormal” não apenas o
identifica negativamente, como reforça e reproduz preconceitos e estigmas aos
mais de 16 milhões que vivem em favelas no Brasil. Além disso, a mudança da
nomenclatura atende à reivindicação histórica dos movimentos e organizações de
favelas pela valorização da identidade desses espaços.
O Censo só foi possível graças à parceria do IBGE com a
sociedade civil, por meio da colaboração com o DataFavela e a Cufa, que
lançaram em 2023 — com o Ministério do Planejamento e Orçamento e a presença da
ministra Simone Tebet —
o movimento Favela no Mapa, em Heliópolis. A iniciativa possibilitou a
realização da pesquisa e o acesso aos territórios.
No evento de lançamento, Marcio Pochmann,
presidente do IBGE, ressaltou a relevância do Censo para construir um
diagnóstico mais preciso sobre as condições de vida nas favelas. Destacou
também que, ao tornar essas comunidades visíveis nos dados oficiais, o IBGE não
apenas produz estatísticas, mas contribui para a formulação de políticas
públicas mais assertivas, baseadas em evidências.
O IBGE agora classifica como favelas e comunidades urbanas
as regiões onde os domicílios apresentam graus diferenciados de insegurança
jurídica da posse; que manifestem precariedade na oferta de serviços públicos;
que tenham predominância de edificações, arruamento e infraestrutura feitos
pela própria comunidade, com parâmetros diferentes dos definidos pelos órgãos
públicos; ou que estejam localizados em espaços com restrição à ocupação, como
áreas de risco ou rodovias e ferrovias, linhas de transmissão de energia e
áreas protegidas, entre outras.
Outra questão importante — para quem defende políticas
públicas consistentes, que sejam de Estado, e não de governos ou conveniências
eleitorais — é que, a partir de agora, as favelas serão referenciadas por dados
oficiais, que servirão para subsidiar governos e empresas no planejamento de
ofertas, serviços e intervenções. Ao poder público, cabe orientar e a balizar
projetos e políticas públicas por meio de dados estatísticos e geográficos para
a implementar ações de toda ordem.
O próximo passo será restaurar a imagem do IBGE nas favelas,
fortalecendo sua atuação junto ao poder público e defendendo sua expansão.
Esses dados não são apenas números; expressam as condições de vida e moradia,
bem como as necessidades sociais dessas populações.
Os dados do IBGE funcionam como faróis, iluminando possíveis
caminhos para novos repertórios que visem a reduzir desigualdades e a gerar
impacto real na vida das pessoas. Mais que de números, estamos falando de
vidas, já que as pesquisas e os dados resultam em ações diretas no cotidiano de
milhões.
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