Argentina terá superávit pela primeira vez em 16 anos.
Inflação está em queda e popularidade dele se mantém
Quando completar o primeiro ano na Presidência da Argentina na
semana que vem, Javier Milei terá
muito o que comemorar. Apesar do perfil provocador, seu governo tem sido até o
momento uma força de estabilização. Ao assumir, a economia flertava com a
hiperinflação. De 25% em dezembro de 2023, o índice mensal caiu a 2,7% em
outubro. O ano de 2024 fechará em recessão, mas o PIB tem se recuperado e
deverá voltar a crescer em 2025. Apesar de o choque ter levado a pobreza ao
pior nível em 20 anos, Milei conta com a paciência dos argentinos. Tem
aprovação de 49% dos eleitores— acima dos dois antecessores a esta altura do
mandato.
Maldita talvez seja uma palavra branda
demais para descrever a herança com que ele teve de lidar. Sempre em nome da
alardeada “preocupação social”, governos anteriores — a maioria peronistas, mas
não apenas — mantiveram intacto um sistema insustentável de gastos públicos.
Incapazes de promover ajuste fiscal, enfrentavam dificuldades para acessar
fontes externas de financiamento depois de sucessivos calotes. Repetindo os
mesmos erros, dedicaram-se a imprimir dinheiro. Com uma mão, quem estava no
poder mantinha subsídios, concedia ajustes a aposentadorias e financiava
programas sociais. Com a outra, tirava o dinheiro do bolso de todos na forma da
inflação galopante e do caos econômico que afugentava investimentos.
Foi a exaustão dos eleitores com essa farsa que levou à
derrota dos peronistas. Em 12 meses, Milei não cansou de repetir o refrão: “no
hay plata” (não tem dinheiro). Promoveu contração real do gasto público de 28%.
Reduziu subsídios, investimentos e benefícios previdenciários. Até os mais
otimistas ficaram apreensivos. Mas a previsão é encerrar 2024 com superávit
fiscal pela primeira vez em 16 anos.
É verdade que os avanços não são garantia de sucesso futuro.
Como sentiram os torcedores de Botafogo e Atlético Mineiro em Buenos Aires, os
preços na Argentina estão altos. O câmbio está valorizado. Mas o governo tem
medo dos efeitos da transição para um sistema de flutuação livre. Um novo
acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), com a volta de Donald Trump à
Casa Branca, poderia ajudar.
O peso artificialmente forte gera apreensão. Está fresco na
memória o custo do colapso da convertibilidade da Era Menem. Entre 1999 e 2002,
o índice de Gini, que mede a desigualdade, aumentou 4 pontos. Pelo indicador
oficial, os pobres chegaram a 65,5% (hoje são 52,9%). Mas pobreza é sempre algo
difícil de medir. Pelos números do economista Marcelo Neri, da FGV Social, a
Argentina tinha 9,1% de pobres em 2011, ante 31,6% no Brasil, usando a linha da
pobreza equivalente à renda mensal de R$ 666 por pessoa (adotada no Brasil). Em
2022, os números eram respectivamente 10,9% e 23,5%. A realidade decerto piorou
sob Milei, mas não ao extremo do passado.
Para ter a chance de acabar o mandato em alta, ele precisa
que a economia volte a crescer a taxas robustas, com criação de emprego e
renda. No front político, tem mostrado capacidade de diálogo inimaginável para
quem tratava oponentes como inimigos na campanha. Se vencer as eleições
legislativas no ano que vem, seu poder de barganha aumentará. Milei ainda
continua a falar como “o louco” da campanha eleitoral, mas pelo menos no
aspecto fiscal tem mantido um nível de sanidade que faz falta no Brasil.
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