Gastos das capitais cresceram como proporção das receitas
— e logo será inviável fechar as contas
No mandato iniciado em 2020, os prefeitos das 26 capitais
tiveram uma oportunidade ímpar de melhorar a saúde fiscal de seus municípios.
Com a pandemia, o caixa foi reforçado por transferências extraordinárias da
União, e foram impostas restrições a gastos com pessoal. Passada a emergência,
a recuperação do setor de serviços — principal fonte de arrecadação municipal —
superou as expectativas. Só entre janeiro e outubro de 2024, a arrecadação
cresceu 7,2% descontada a inflação, na comparação com o período no ano
anterior, segundo dados da Aequus Consultoria. O fôlego maior era um momento
propício para melhorar a gestão financeira e evitar instabilidade no futuro.
Infelizmente não foi o que aconteceu. Houve uma profusão de gastos
eleitoreiros. Agora, os prefeitos que assumem seus mandatos nesta semana — 16
deles reeleitos — terão pela frente um desafio fiscal bem mais complicado que o
sugerido nas promessas de campanha.
Desde 2023, a despesa municipal tem
crescido em ritmo mais alto que as receitas. Nos primeiros dez meses do ano
passado, ela aumentou 12,5%. Nesse período, o comprometimento da receita com
gastos correntes e amortização de dívidas alcançou 89,1%, 4,1 pontos
percentuais acima de 2023 e 6,9 pontos percentuais acima de 2020, pelas contas
da Aequus. A previsão é que esse total tenha chegado a 96% até o fim de 2024,
engessando o caixa dos municípios e desenhando um quadro não muito diferente do
que amarra o governo federal.
É verdade que parte do dinheiro foi destinada a
investimentos. Nos primeiros dez meses do ano passado, eles chegaram a R$ 22,3
bilhões, bem acima dos R$ 9,4 bilhões registrados no mesmo período de 2020. Mas
tudo indica que o fôlego será curto. Isso porque, entre 2021 e 2024, os
prefeitos aumentaram os gastos obrigatórios com reajustes salariais e inchaço
da máquina pública. A piora nas contas é estrutural e duradoura.
A incúria fiscal nas capitais garantiu a reeleição da
maioria. Mas a conta um dia chega. A deterioração na situação fiscal, aliada à
provável desaceleração da economia, deverá forçar os prefeitos a adotar
comportamento mais responsável. Em escala menor, as capitais repetem a situação
do Brasil como um todo. O governo federal também pisou no acelerador quando o
mais prudente era moderar os gastos. A economia cresceu mais que o previsto,
mas ninguém em sã consciência acredita que o salto seja sustentável. As repetidas
juras de fidelidade à boa governança das contas
públicas teimam em ser desmentidas pelos fatos.
Apesar das diferenças, as capitais reúnem nas suas regiões
as principais instituições de ensino, centros médicos e profissionais. Juntas,
são residência de um entre cinco brasileiros. Mais dinâmicas, também enfrentam
problemas em doses maiores, da mobilidade urbana ao saneamento. Quando a
perspectiva dos orçamentos municipais é negativa, duas consequências são
previsíveis. A primeira é a queda na qualidade dos serviços públicos, que
decerto afetará os planos eleitorais futuros de boa parte dos prefeitos — em
particular aqueles que pretendem se lançar aos governos estaduais. A segunda é
a romaria a Brasília, de pires na mão, com o invariável pedido de ajuda à União
quando as contas não fecharem. Com o próprio governo federal em apuros, não
poderia haver pior momento.
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