Copom tem assumido o compromisso de que fará o que for
necessário para cumprir a meta de inflação, mas carece de credibilidade perante
o mercado
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deu
um choque de juros em dezembro, que levará a taxa Selic a um patamar “bastante
restritivo”. Mas, ainda assim, participantes do mercado financeiro não estão
seguros sobre quando a meta de inflação deve ser cumprida.
As contas do Banco Central não fecham. O Copom vai subir os
juros dos atuais 13,25% ao ano para 14,25% na próxima reunião, em março. Os
analistas econômicos consultados na pesquisa Focus antecipam que a autoridade
monetária vai seguir em frente nos encontros seguintes, levando a Selic a 15%
ao ano. Mesmo considerando todo esse aperto monetário, os modelos de projeção
do BC estimam a inflação em 4% no período de 12 meses até setembro de 2026.
Ou seja, se o BC não subir a Selic acima do
que os economistas privados preveem, a inflação ficará acima da meta contínua,
definida em 3%, no chamado horizonte relevante de política monetária.
Dito de outra forma, os cálculos do próprio Banco Central
mostram que, se os juros não subirem além de 15% ao ano, a meta de inflação
teria que ser cumprida mais tarde.
O problema é que o horizonte relevante de política monetária
é considerado, na maior parte das vezes, o prazo ideal para cumprir a meta.
Está longe o suficiente para que os efeitos diretos de choques de curto prazo,
como secas e alta do dólar, tenham se dissipado. Também dá tempo suficiente
para que a alta de juros se transmita pela economia, atingindo o seu efeito
máximo para desacelerar a inflação.
Quanto o juro precisaria subir para fazer a inflação, que
ficou em 4,83% em 2024, cair para a meta de 3% em setembro de 2026? Na visão
mais otimista, as estimativas de participantes de mercado apontam percentuais
superiores a 16% ao ano. Nas mais pessimistas, superam 18% ao ano. O Banco
Central está disposto a fazer tudo isso?
A promessa do Banco Central é fazer o necessário, mas sem se
comprometer com percentuais. O Banco Central tem deixado o mercado no escuro
sobre o que pretende fazer depois de março, quando colocará os juros em 14,25%
ao ano. Não sinaliza seus passos mais imediatos nem a taxa Selic que pretende
alcançar ao fim do ciclo de aperto monetário.
A falta de sinalização é compreensível, já que a incerteza
no cenário inflacionário é muito grande. O balanço de riscos do Copom mostra
que há chances consideráveis de a inflação tanto superar o valor projetado de
4% em setembro de 2026 quanto ficar abaixo dele. As chances do lado negativo
são maiores, mas, do lado positivo, também são consideráveis.
Do lado negativo, há o risco de a economia, que está
sobreaquecida, não desacelerar o quanto precisa, principalmente se o governo
entrar em pânico e pisar no acelerador fiscal. Há também o risco de o dólar
subir mais, dependendo, de novo, da política fiscal e da agenda protecionista
do presidente americano, Donald Trump. Do lado baixista para a inflação, pode
haver uma recessão, se os juros altos e o aperto nas condições financeiras
baterem mais firme. Trump também pode ser mais suave do que o previsto, ajudando
a cotação do dólar a cair em relação ao real.
Alguns especialistas argumentam que, mesmo com toda essa
incerteza, o BC poderia fazer sinalizações suaves de suas intenções, que seriam
dependentes da confirmação do cenário econômico. O problema, nesse caso, é que
o mercado costuma tomar sinalizações, mesmo as mais leves, como promessa - e
haveria impactos negativos no caso de não serem confirmadas. Ainda assim,
parece seguro o Copom indicar, pelo menos, que seguirá subindo o juro depois da
reunião de março.
Em vez disso, o que o Copom tem feito é assumir o
compromisso de que fará o que for necessário para cumprir a meta de inflação.
Em mais de uma ocasião, seus membros disseram que, ao longo do tempo, vão
firmar a credibilidade de independência e de quem faz o que é preciso para
controlar a inflação. O problema dessa estratégia é que, depois de o BC furar o
teto da meta três vezes nos últimos quatro anos, participantes do mercado têm
menos confiança nele.
São grandes as suspeitas, em setores do mercado, de que o
Banco Central esteja adiando o cumprimento da meta de inflação para depois de
setembro de 2026. O BC já fez isso no passado, quando o esforço monetário era
muito grande. Mas também há quem desconfie que o Banco Central não vá cumprir a
meta em nenhum horizonte de tempo.
De certa forma, essa desconfiança está expressa pelo mercado
financeiro nas suas projeções para a inflação no boletim Focus, que estão acima
da meta até 2029, último ano em que há previsões disponíveis.
Uma forma de o BC lidar com o problema seria adotar uma meta
ajustada, acima de 3%, ao longo de 2026, com firme compromisso de atingir 3%
mais adiante. Isso já foi feito no passado, nos primórdios do regime de metas
de inflação. Mas poucos acreditariam na estratégia se não houver um apoio mais
firme da política fiscal. Sem isso, o mercado entenderá que a meta será
permanentemente maior.
Em 2016, o Banco Central viveu um dilema semelhante e
decidiu bancar a meta então vigente, mantendo os juros altos e aceitando o
prolongamento da recessão. Só que, na época, a política fiscal ajudou, com a
aprovação do teto de gastos.


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