Ataque a universidades, instituições científicas e
imprensa ameaça inaugurar era de trevas e ignorância
Os alvos de Donald Trump em
seu segundo mandato eram todos conhecidos, mencionados à exaustão em comícios e
redes sociais. São — entre tantos outros, da desregulamentação ambiental ao
combate a políticas de diversidade — universidades, instituições científicas,
veículos de imprensa, juízes independentes. Ele tem investido com ímpeto
inaudito sobre quem identifica como adversário.
Cortou US$ 250 milhões em bolsas e verbas dos Institutos
Nacionais de Saúde (NIH), responsáveis por pesquisas contra câncer, Alzheimer,
diabetes e outras doenças. Cortou US$ 400 milhões da verba destinada à
Universidade Columbia, sob a acusação de leniência com o antissemitismo no
campus — outras 59 universidades foram postas sob investigação pelo mesmo
motivo. Cortou US$ 175 milhões da Universidade da Pensilvânia, por ela ter
permitido a uma atleta transgênero competir em provas de natação femininas.
Cortou metade da força de trabalho do Departamento de Educação,
responsável por bolsas para universitários e alunos da educação básica de baixa
renda, e determinou por decreto sua extinção, quando isso exige aval do
Congresso. Pesquisadores estrangeiros, inclusive brasileiros, têm sido barrados
no país. Trump vetou a presença no Salão Oval e no avião presidencial de
veículos que se recusam a chamar o Golfo do México de Golfo da América, como
determinara em decreto. Abriu as portas a publicações sem relevância, mas
ideologicamente afins.
A guerra de Trump é contra as instituições
que, nas democracias, se encarregam de investigar e revelar fatos,
produzir ciência e
conhecimento original. São as instituições de que os Estados Unidos dependeram
historicamente para alcançar a liderança científica e tecnológica de que deriva
seu poderio econômico e militar. A guerra de Trump é, no fundo, contra a
verdade.
Até o momento, a reação da sociedade tem sido tímida.
Processos judiciais têm questionado as medidas, mas com pouco efeito.
Magistrados têm sido alvos de ameaças. No meio acadêmico, o diretor da
Faculdade de Direito da Universidade Georgetown foi um dos poucos a não
aceitarem intervenção no currículo. O silêncio decorre do medo.
Trump não parece disposto a obedecer às ordens judiciais que
o contrariem. Deportou venezuelanos que alega, sem apresentar provas cabais,
integrarem uma gangue e, contrariado por decisão de um juiz, defendeu o
impeachment dele. Em rara manifestação pública, o presidente da Suprema Corte,
John Roberts, afirmou: “Impeachment não é a resposta apropriada quando se
discorda de uma decisão judicial”.
É razoável a preocupação com o antissemitismo nas
universidades, com protestos violentos e com a adesão à agenda identitária
extremista. Nada disso, porém, é motivo para a truculência. “O governo pode
responder às preocupações sem violar a liberdade acadêmica. Deveria usar os
processos exigidos por lei”, escreveu de forma corajosa na revista The Atlantic
o presidente da Universidade de Princeton, Christopher Eisgruber, enquanto
líderes de outras universidades, como Columbia, dão sinal de capitulação. De um
mentiroso contumaz como Trump, não se poderia esperar reverência à verdade. Mas
o custo será alto. “A liberdade atraiu os melhores acadêmicos do mundo e
facilitou a busca pelo conhecimento”, diz Eisgruber. O fim da colaboração entre
governo e academia dará início a uma era de trevas e ignorância.
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