País tem baixíssima mobilidade social, com uma população
convencida de que quem luta vence
Construir argumento frouxo para manter no poder as figuras
de sempre é o novo preto. Melhor dizendo: o velho branco. É tática que, no
momento, aproxima a escolha do sucessor de Luís
Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF)
do concurso para lecionar literatura africana na Universidade de São Paulo
(USP). Uma mesma cartada, a (suposta) proximidade ou amizade, serve para
repelir umas — no caso, mulheres negras — quanto para acolher outro — um homem
branco, por óbvio. Ao fim do primeiro quarto do século XXI, racismo e sexismo à
brasileira seguem positivos e operantes. E contando.
Ironia em altas doses é forma de confrontar os caminhos que
a sociedade brasileira ainda encontra para mostrar que, sob véu de mudança,
tudo segue como dantes. O Brasil é um país de baixíssima mobilidade social, com
uma população convencida de que quem luta vence. Se não venceu, é porque não
lutou o suficiente. Segue o bonde.
Em meados deste ano, o Atlas da Mobilidade
Social tornou pública uma série de dados sobre a chance de uma criança oriunda
da metade mais pobre da pirâmide social chegar ao décimo mais rico. De cada
cem, nem duas (1,81%) alcançam os 10% mais ricos. É muito mais provável descer
que subir: 17 em cem vão parar entre os 10% mais pobres. Dois terços, segundo o
Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), permanecem onde estavam
ao nascer, quase sempre com acesso entre o mediano e o precário a educação, saúde,
saneamento e toda sorte de direitos inscritos no papel, mas sonegados na real.
O ministro Barroso antecipou aposentadoria do STF; desde
ontem já não faz mais parte da Corte. Organizações da sociedade civil, de
imediato, iniciaram, outra vez, campanhas e apelos para que o presidente da
República, numa sociedade heterogênea como a brasileira, tome a diversidade por
critério e indique para a vaga uma mulher, preferencialmente uma negra.
Pronunciaram-se, entre outros, Mulheres Negras Decidem, Coalizão Negra por
Direitos, Instituto de Defesa da População Negra, Themis Justiça e Gênero, Fórum
Justiça, Plataforma Justa. O próprio ex-presidente do Supremo manifestou
publicamente o desejo de uma sucessora.


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