Presidente explicou aos jornalistas as regras do jogo, ao
confirmar que vetará o PL da dosimetria
No café com jornalistas, na quinta-feira (18), em uma fala
didática, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva explicou as regras do jogo, ao
confirmar que vetará o PL da dosimetria. “O Congresso tem o direito de fazer as
coisas. Eu tenho o meu direito de vetar. Depois, eles têm o direito de derrubar
o meu veto, ou não. É assim que é o jogo”.
Nos últimos dias, petistas reclamavam que, no mesmo dia em
que dezenas de milhares de brasileiros, militantes e cidadãos comprometidos com
a democracia, voltaram às ruas - atendendo convocação da esquerda - para
protestar contra a aprovação, pelos deputados, do PL da dosimetria, Lula
encontrou-se, fora da agenda oficial, com o presidente da Câmara, Hugo Motta
(Republicanos-PB).
Lula e Motta reuniram-se no domingo (14),
que marcou as novas manifestações contra o projeto que reduz a pena do
ex-presidente Jair Bolsonaro e demais condenados pela tentativa de golpe de
Estado. E segundo fontes credenciadas, vai se reunir com o presidente do
Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), antes do Natal.
O presidente do PT, Edinho Silva, tem afirmado que Lula está
melhor do que nunca aos 80 anos, porque está mais experiente e mais paciente.
“Quando ele aposta na paciência, ele ganha o debate”, desafiou, em entrevista
recente. Difícil discordar. E cabe acrescentar: está mais pragmático do que
nunca.
São encontros que sem traquejo político e paciência de Jó,
não se consumariam. Motta e Lula dialogaram no mesmo dia em que militantes
petistas despejaram insultos contra o chefe do Legislativo. Da mesma forma,
Lula e Alcolumbre se reunirão, depois que o presidente do Senado tornou pública
a irritação com a indicação do ministro da Advocacia-Geral da União (AGU),
Jorge Messias, para a vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Alcolumbre queria
no posto seu aliado, o ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Segundo poucas fontes a par do assunto, o presidente da
Câmara queixou-se da estratégia do PT e da esquerda de mirar a artilharia
contra o Parlamento, com palavras de ordem como “Congresso inimigo do povo”, e
ataques diretos a ele e ao presidente do Senado.
Mas o governo faturou. Num momento em que era torpedeado
pela esquerda e pela direita na Câmara, Motta realinhou-se com o Palácio do
Planalto. Da reunião com Lula, saiu o acordo para que a Câmara votasse, na
noite de terça-feira, o projeto de lei de corte dos incentivos fiscais, bem
como o aumento da taxação das bets e fintechs. A aprovação desse projeto era
fundamental para destravar R$ 22,45 bilhões no Orçamento e abrir caminho para a
votação da lei orçamentária.
Em paralelo, Lula reajustou as forças da base na Câmara.
Substituiu o ministro do Turismo, Celso Sabino, que havia comprado briga com
seu partido para permanecer do lado do presidente, pelo ex-secretário de
Turismo da Paraíba Gustavo Feliciano. Foi um movimento costurado com Motta,
segundo fontes a par do arranjo. Gustavo é filho do deputado Damião Feliciano
(União-PB), vice-líder do governo, e aliado de Motta.
“Lula não tem coração”, queixaram-se alguns petistas, face o
destino de Sabino, que acabou na chuva. “Foi o Lula pragmático de sempre”,
disse à coluna um aliado de Motta. Com a mudança, Lula recuperou cerca de um
terço da bancada do União que é governista, mas que ele havia perdido em razão
da desavença de Sabino com a legenda.
O episódio é uma aula de Centrão. Quando a federação União
Brasil-Progressistas deu um ultimato para que os ministros do bloco deixassem o
governo, as condutas foram distintas. Com chances reais de se eleger senador
pelo Maranhão, o ministro do Esporte, André Fufuca, fez gestões internas,
negociou com os caciques, e sustentou-se no cargo. Com o apoio de Lula no
Estado, poderá garantir uma cadeira no Senado para o PP em 2027. Sabino foi
menos hábil, e perdeu o posto e a legenda.
“É assim que é o jogo”, diria Lula. Um dos exemplos notórios
do pragmatismo lulista foi a foto que tirou ao lado do deputado federal Paulo
Maluf (PP) em 2012. Na imagem, Lula cumprimenta Maluf, observado pelo
pré-candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad, selando a
inusitada aliança naquele pleito. A fotografia alarmou os petistas, e levou
Luiza Erundina a recusar a vice de Haddad.
Um tempo depois, questionado se arrependia-se do gesto, Lula
negou, e provocou. “Logo estarei batendo falta e fazendo gol. Se for
necessário, morderei a canela dos adversários para que Fernando Haddad possa
ser o prefeito de São Paulo”.
No Senado, o acordo costurado pelo líder governista, Jaques
Wagner (PT-BA), que garantiu a aprovação do projeto de corte dos incentivos,
obrigou a votação, antes, do PL da dosimetria, gerando reação na esquerda. As
ruas pediram a não apreciação do projeto, mas o líder do governo agiu na
direção oposta.
Uma letra da banda “Secos e Molhados”, de forte crítica ao
sistema, diz que “é preciso ser assim, assado”. A multidão nas ruas pede um
jogo “assim”, os políticos entregam um “jogo assado”. Segundo Lula, se
esquecermos a importância da democracia, “a gente termina perdendo o jogo”. É
este o risco, mesmo se morder a canela dos adversários.


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